Parceiros esperam acordo sobre aumentos até ao verão
Os parceiros da Concertação Social poderão fechar "até junho" o acordo de competitividade e rendimentos cujas discussões o governo transportou para a nova legislatura, após a pandemia ter interrompido negociações na primavera de 2020.
A expetativa foi manifestada ontem pelo presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), António Saraiva, considerando que a atual conjuntura torna mais urgente a necessidade de um entendimento com o qual o executivo de António Costa fala em valorizar salários com recurso a medidas fiscais em sede de IRS e IRC.
"Há urgência, na minha perspetiva, de celebrar esse acordo", defendeu António Saraiva, considerando que será possível fechar o entendimento com os parceiros até ao verão."Acredito que até junho é possível", disse. "Temos já caminho feito que minora o tempo que precisaríamos de gastar se fôssemos agora iniciar um texto que parte do zero", referiu.
No programa do governo, prevê-se que o acordo de rendimentos traga "a redução progressiva das taxas de IRS para todos os que venham a beneficiar dos aumentos de rendimento, no quadro do referido acordo em sede de Concertação, a fim de assegurar a neutralidade orçamental da melhoria do rendimento dos portugueses". A ideia será a de que o Estado não irá recolher mais imposto por causa desses eventuais aumentos de salários negociados.
O programa do governo prevê igualmente "os ajustamentos necessários à estrutura" do IRS e "ajustamentos à estrutura do IRC que favoreçam as boas práticas salariais das empresas, em termos de valorização dos rendimentos e de redução das disparidades salariais".
O alcance destas mexidas nos impostos para trabalhadores e empresas não é conhecido. A CIP defende, para já, uma diferenciação que considere setores e regiões do país naquele que, originalmente, se previa que fosse um acordo de fixação de referenciais de aumentos salariais na contratação coletiva. A discussão fazia antever um acordo à semelhança daquele em que os parceiros sociais fixaram aumentos de 3,5% para o ano de 1997, à época da governação de António Guterres.
O regresso ao diálogo social sobre subidas de salários é antecipado num momento de forte aceleração da inflação, com a perda de poder de compra das famílias na ordem do dia e sem expetativa de que a proposta de Orçamento para 2022 se traduza em maiores atualizações nos salários da Administração Pública ou nas pensões do que aquelas que foram prometidas na versão inicial do Orçamento chumbada no final de 2021.
O governo argumenta que pretende atacar as raízes de subidas de preços - na energia e bens essenciais - e que subir salários em linha com os aumentos de preços poderia colocar o país numa espiral inflacionista.
Entre as confederações sindicais, a CGTP contraria a visão do governo e "rejeita a ideia de que são os salários que aumentam a inflação", segundo disse ontem a dirigente Andreia Araújo, exigindo entretanto uma reavaliação urgente do valor de 705 euros de salário mínimo em vigor neste ano.
A UGT manifestou-se igualmente preocupada com a perda de poder de compra dos trabalhadores. E, ainda que a proposta de Orçamento que o governo entregará no parlamento amanhã não haja novidades relativamente a medidas de atualização de salários ou pensões, manifestou-se "confortada" com a valorização pelo governo do "papel da Concertação Social", segundo disse Lucinda Dâmaso, presidente da estrutura.
De resto, a dirigente da UGT antecipou também para breve as discussões do chamado acordo de rendimentos, que terá efeitos para o próximo ano. "O Orçamento do Estado de 2023 deverá começar a ser trabalhado num futuro muito próximo", juntou.
Já relativamente à proposta de Orçamento para 2022, poucas novidades transpareceram da reunião com os parceiros, na qual não foram antecipados grandes números de défice, crescimento do PIB ou inflação prevista.
Mas, já durante a manhã, das reuniões com os partidos, saiu a convicção de que a meta do défice deverá manter-se em 1,9% do PIB, como prevê o Programa de Estabilidade, com as confederações patronais a lamentarem essa perspetiva.
"Estávamos à espera de um Orçamento talvez menos dedicado ao défice e mais um Orçamento para fazermos uma recuperação e um crescimento económico", concluiu Francisco Calheiros, presidente da Confederação do Turismo de Portugal (CTP), após a reunião com o ministro das Finanças, Fernando Medina.
"Não foi claro se o governo vai enfatizar a política económica em torno do défice", reagiu também à saída João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), pedindo um Orçamento mais "agressivo" do lado da fiscalidade.
Já a Confederação Empresarial de Portugal deixou o repto ao governo para que aja mais rapidamente e com medidas "corajosas", designadamente, na redução de IVA na energia mesmo sem a segurança de uma autorização por parte da Comissão Europeia.
Mas, ao mesmo tempo, a CIP defende uma rota de redução de despesa rumo às descidas de impostos. "Temos de reduzir as despesas da Administração Pública de um modo geral, em todos os gastos, e na nossa perspetiva percebe-se onde é que há margem para reduzir despesa. É reduzindo a despesa e não aumentando impostos que se deve trilhar para ter folgas orçamentais que estimulem uma política fiscal mais amiga do investimento", defendeu António Saraiva.