Parasitas
É claro que para a definição de um verdadeiro parasita é preciso juntar mais um dado – o parasita tem de causar prejuízo ao seu patrono para merecer o nome. Se não fosse este pormenor tínhamos de incluir aqui muitas das pessoas da nossa sociedade, começando, se calhar, por muitos dos deputados e funcionários públicos. Mas, enfim, não é isso que interessa agora.
Os parasitas que vão ocupar estas próximas linhas não são mais do que animais que descobriram que podiam viver com muito pouco esforço se usassem o corpo de outros seres vivos para a sua morada. Têm cama, mesa e roupa lavada sem sequer terem escolaridade obrigatória…
Eu sei que os exemplos que vamos dar são um bocado repugnantes, não só por causa do sítio que escolheram para viver (intestino, etc.), mas também por causa do seu modo de vida. Aliás, é interessante e digno de análise sociológica a razão por que as pessoas se zangam tanto com pequenos seres que apenas mostram esperteza ao ocupar nichos que mais ninguém quer. Serão princípios inatos de lealdade e honestidade que levam alguém a chamar nojentos aos vermes que vivem no intestino de nosso cão? A própria palavra «verme», aliás, adquiriu um significado tão depreciativo que, se eu fosse uma ténia, chegava a ofender-me.
Uma das razões para o êxito do parasitismo ao longo de milhões de anos de evolução é o cuidado que têm de não ser suficientemente agressivos para matar o hospedeiro. Como grande parte dos membros que escolheram esta profissão dependem do organismo que os recolhe, ou seja, se este morrer ficam sem abrigo e emprego, é do seu interesse espoliar o suficiente para viver com o mínimo de qualidade, mas sem exagerar, para garantir a perpetuação do contrato de arrendamento. Isto não quer dizer que seja saudável servir de albergue para uma série de parasitas, mas apenas relembra como este equilíbrio é importante para os oportunistas.
Só que este é um equilíbrio instável que as circunstâncias podem alterar a qualquer momento. Um animal parasitado, por exemplo, torna-se de certeza menos resistente a outras doenças porque tem de repartir os seus recursos com mais uma série de famílias de vermes famintas e pouco dadas a altruísmos. Apesar de todos os cuidados que os parasitas têm para não extorquir de mais, há uma altura em que o alimento já não chega para todos e o hospedeiro acaba por desistir da luta e morre. É verdade que os parasitas nessa altura também ficam desalojados, mas até hoje não conheci nenhum que preferisse chegar a um acordo de despejo com o organismo acolhedor antes de ser tarde de mais.
Parasitas há muitos, diria Vasco Santana, e, acrescento eu, das mais variadas espécies, formas e tamanhos. É claro que quase todos eles se encontram no grande grupo dos invertebrados, sendo os artrópodes [carraças, piolhos, pulgas e um montão de outros insectos] e os helmintes os mais badalados. Porque os membros deste último clube são menos conhecidos, vou aproveitar estas últimas linhas para apresentar algumas das suas particularidades.
De uma forma simples e generalista, podemos considerar os parasitas externos ao animal (ectoparasitas) e os que vivem no interior de outros organismos (endoparasitas. Os helmintes são quase exclusivamente endoparasitas). Quando se fala em helmintes estamos a falar do grupo em que se incluem os tais vermes, sendo a lombriga e a ténia os primeiros nomes que vêm à cabeça dos leigos nesta matéria. Também o órgão que os menos conhecedores associam a estas espécies é sempre o mesmo – o intestino. No entanto, há inúmeras espécies que resolveram dar o «grito do Ipiranga» e aventurar-se noutros meios. Existem vermes que vivem na corrente sanguínea enquanto crianças [larvas] e depois, quando adultas, assentam arraiais no coração; outros procuram o fígado para morar e outros ainda instalam-se debaixo da pele, no saco lacrimal ou na conjuntiva.
Existem também várias espécies que se especializaram num hospedeiro e se, por acaso, têm acesso a outros animais ficam confusos, perdem noção daquilo que deveriam fazer e migram para locais mais estranhos. É o caso do famoso quisto hidático, que não é mais do que um parasita que deveria passar do cão para a ovelha mas que, acidentalmente, acaba num humano. Não podendo completar o seu ciclo, forma estes quistos no fígado, pulmão ou no cérebro.
Mesmo entre aqueles que realmente têm o seu poiso no intestino dos animais, são raros os que aí permanecem a vida toda. Quase todas as espécies têm uma fase no interior de um hospedeiro definitivo [fase adulta] e uma no exterior [ovos e larvas]. Há ainda aquelas que precisam de dois ou mais hospedeiros para completar o seu ciclo. O chamado hospedeiro intermediário pode ser um outro animal, um mosquito, uma carraça ou mesmo um caracol.
Finalmente, uma palavra mais séria acerca dos parasitas – embora seja verdade que estes seres evitam matar os seus hospedeiros, também é verdade que os prejudicam sempre. Estes efeitos negativos são especialmente graves quando ocorrem em crianças, podendo conduzir a atrasos de crescimento, maior susceptibilidade a doenças, anemias e baixo rendimento intelectual, que pode repercutir-se, por exemplo, no insucesso escolar. É por isso crucial evitar a infestação com parasitas (desparasite frequentemente os seus animais domésticos!) e, quando necessário, combatê-los com medicamentos.