"Para um muçulmano Deus não é perdão, Deus é um juiz"

José Rodrigues dos Santos foi entrevistado este domingo no Palco do Diário de Notícias, na Praça do Município. Falou sobre o romance <em>Fúria Divina</em> que o fez mergulhar no Islão e revelou como <em>A Fórmula de Deus </em>curou um leitor francês de uma depressão
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José Rodrigues dos Santos já não será apenas lembrado como o jornalista da RTP1 que nos trouxe as notícias da Guerra do Golfo, há muito que se tornou o escritor que mais vende em Portugal. Esteve esta tarde na Praça do Município, em Lisboa, no evento Histórias de Natal DN/Kia, onde foi entrevistado pelo jornalista João Céu e Silva.

O palco encheu enquanto o autor contava como se lembrou de escrever um romance sobre os dias em que Macau esteve cercado pelos japoneses e a bandeira portuguesa foi a única bandeira ocidental hasteada no extremo oriental durante a Segunda Guerra Mundial. Para o contar, Rodrigues dos Santos usou uma história de amor. A Amante do Governador é, afinal, a história de como os portugueses não cederam ao Japão e da razão pela qual os japoneses deixaram que isso acontecesse.

"A história do cerco japonês a Macau durante a Segunda Guerra Mundial era uma história pouco conhecida. A minha base foi um livro muito pequeno de alguém que tinha vivido em Macau nessa época. A partir daí fui pesquisar mais", contou.

Rodrigues dos Santos começou por ficar intrigado com o motivo pelo qual os japoneses não invadiram Macau - que ficou apenas cercado - e descobriu a resposta em pessoas que transformaria, para este livro, em personagens.

Gabriel Teixeira (no romance é Artur Teixeira) era o Governador português e foi também "um pouco de sorte" - como o escritor haveria de confessar no final da entrevista, quando questionado como se consegue alcançar tanto sucesso no mundo literário, - ter-lhe dado uma tirada digna de herói.

"Disse aos japoneses que podiam invadir Macau mas que primeiro teriam de o matar". Para saber quem era este homem, José Rodrigues dos Santos fez o caminho inverso ao realizado em livros anteriores. O Governador português era "um homem do regime, eu tinha escrito sobre pessoas que eram opositores do Estado Novo - em a Vida Num Sopro e Anjo Branco - aqui precisei de mostrar a história do Estado Novo, mas do ponto de vista de alguém que estava do lado do regime"

"Os meus romances não expressam a minha opinião, mas a das personagens", tratou de avisar. Tal como aconteceu ao seu sétimo livro, Fúria Divina, sobre o extremismo islâmico. "Quem o lê percebe como funciona a cabeça de quem é a favor desse extremismo".

O escritor revelou que partir para a escrita deste romance foi enfrentar vários riscos, como "tocar no Islão", e confessou que antes de começar a pesquisa para o romance - publicado em 2009 - tinha a ideia de que "o Islão é uma religião pacifista e que só uma pequena parte é composta por um bando de loucos, o que não é verdade".

As ruturas com o propósito da Literatura e até com a nacionalidade de Colombo

Leu o Alcorão e os hadits do profeta Maomé que, recorda, era um general, pelo que nos hadits "ele mata e manda matar os infiéis. E é isso que os radicais seguem. Fiquei chocado quando descobri isto, porque a narrativa que existe não é verdadeira".

"A violência faz parte do Islão. Para um muçulmano Deus não é perdão, Deus é justiça, Deus é um juiz", disse.

Sobre esta e outras ruturas com a realidade dominante falou José Rodrigues dos Santos, como aquela que o escritor considera existir entre a literatura que existe e aquela que se ensina nas universidades portuguesas.

"Para mim as palavras não são um fim em si mesmo, mas um meio para apresentar uma cena. Eu quero que o leitor visualize a cena. O meu objetivo é construir uma cena visual, as palavras servem para o leitor construir o seu próprio filme", defendeu.

O jornalista explicou que parte do seu sucesso é a forma como conta a história e como até a expõe e desmascara, como aconteceu em O Codex 632 - que levou dois historiadores portugueses a mudarem de opinião sobre a nacionalidade de Cristóvão Colombo: só poderia ser português, escreveu Rodrigues dos Santos, aquiesceram os académicos. Sim, soube-lhe a sucesso, conformou, mas não tanto como aquele que lhe chegou via caixa de email.

"Um leitor francês leu o livro A Fórmula de Deus [2006] quando estava com uma depressão profunda e enviou-me um email onde dizia que tinha chegado ao final do livro curado. Que eu lhe tinha dado as respostas para as perguntas existenciais que tinha e que estavam na origem da sua depressão", contou, antes mesmo de começar a assinar o primeiro livro - foram várias as pessoas que chegaram à Praça do Município com obras antigas do autor para que este as autografasse.

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