Para o turista e não só... Elevador da Glória faz 130 anos

Foi o segundo ascensor de Lisboa a entrar em funcionamento - a 24 de outubro de 1885 -, o primeiro foi o da Bica.
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O guia-intérprete que acompanha o grupo de turistas que há pouco chegara num cruzeiro a Lisboa conversa com a guarda-freio do ascensor da Glória: o veículo é pequeno, mas ninguém pode ficar para trás e ainda há cerca de dez pessoas na rua. "Diga-lhes para se chegarem mais para trás", sugere a condutora. Ele traduz, eles cumprem e já ninguém fica de fora. É finalmente altura de subir até ao topo da Calçada da Glória. Ou ainda não. "Deixe-me ir aí para esse cantinho", pede uma lisboeta que chega apressada. Tem sorte. A grade da entrada volta a fechar-se, depois de entrar. Mas não definitivamente. Há ainda uma jovem cliente habitual que, intrépida, ocupa o último espaço vago.

Cento e trinta anos depois de ter sido inaugurado, o ascensor da Glória é um ponto de passagem indispensável para os turistas que visitam a capital e para quem, por incapacidade ou comodidade, prefere subir confortavelmente em menos de três minutos a íngreme calçada com um desnível de 17% que liga os Restauradores ao Miradouro de São Pedro de Alcântara. Amarelo, invariavelmente grafitado, o transporte a que quase todos chamam elevador mas em rigor é um ascensor (por não ter uma trajetória vertical), funciona desde 1914 a eletricidade. A 24 de outubro de 1885, quando a obra do engenheiro português Raoul Mesnier du Ponsard, começou a circular, o sistema de tração era de cremalheira - semelhante ao das correntes de bicicleta atuais - e o cabo equilibrado por contrapeso de água. Atualmente, transporta mais de um milhão de passageiros por ano, a maioria turistas.

"É uma maravilha que o mantenham a circular", afirma Nilda, visitante argentina, ao sair pela primeira vez no topo da Calçada da Glória. O passo é apressado e as palavras são poucas, mas não o suficiente para satisfação pela curta viagem que acabou de fazer transpareça na voz. Em seu redor, quase parece haver um concurso para ver quem consegue tirar a melhor fotografia ao ascensor, enquanto, em menor número do que nos Restauradores, lisboetas e turistas se vão sentando, de costas para a janela do seu lado, nos bancos corridos do veículo que, dali a minutos, voltará a partir, desta vez do Miradouro do São Pedro de Alcântara.

Embora seja usual falar-se no elevador da Glória, são não verdade dois os ascensores que, diária e sucessivamente, percorrem de manhã à noite os 265 metros que dão forma à Calçada da Glória. "Fico aqui a vê-los a subir e a descer", recorda Fernanda Gaspar, que há mais de 25 anos vende castanhas nos Restauradores, com vista privilegiada para o veículo histórico. No verão, época alta do turismo, muda-se para o Martim Moniz, mas sabe bem que, mesmo no outono, são longas as filas de turistas que não querem perder a oportunidade de experimentar andar no ascensor que, desde 2002 e tal como o da Bica, o do Lavra e o elevador de Santa Justa, é monumento nacional.

A classificação reflete-se na tarifa de bordo do elevador - 3,60 euros por duas viagens, mais do dobro do preço de uma para quem tem um cartão carregado (1,40 euros). A reação ao preço é diversa: enquanto, no topo, uma família alemã compra sem pestanejar três bilhetes para descer apenas para descer a Calçada da Glória (10,80 euros), nos Restauradores, um turista brasileiro pergunta a Fernanda Gaspar se há uma alternativa para, a pé, chegar ao Bairro Alto, vizinho do Miradouro de São Pedro de Alcântara.

O percurso sugerido, pelo Chiado, pode ser mais barato e, dada a longa fila, até mais rápido, mas não inclui a passagem pela Galeria de Arte Urbana, cuja exposição mais recente se inspira no poema Cântico Negro, de José Régio. "Vem por aqui", lê-se no primeiro painel, perto do topo, onde ainda é possível escolher entre descer a pé ou de ascensor. Os Rádio Macau fizeram a sua escolha em 1987. "Desde este lugar sem história/Até um lugar na história/Vão apenas dois minutos/No Elevador da Glória", metaforizam na canção que lançaram então em homenagem ao monumento que ontem celebrou o seu 130.º aniversário. Lorent, um turista suíço a visitar pela primeira vez Lisboa na companhia dos pais idosos, espera que festeje muitos mais.

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