Paleolítico revela-se em Vila do Bispo
Investigação. Equipas constituídas por alunos da Universidade do Algarve e estudiosos de arqueologia estão a escavar em Vale do Boi, em plena serra algarvia, onde esperam vir a encontrar importantes vestígios pré-históricos
Os arqueólogos tentam desvendar hoje os segredos escondidos em Vale de Boi, Algarve, o maior sítio arqueológico do Paleolítico Superior em Portugal. Perdido na serra, entre Lagos e Vila do Bispo, paredes meias com uma pacata aldeia, o sítio arqueológico passa despercebido.
Descoberto há dez anos por uma equipa integrada por Nuno Bicho, da Universidade do Algarve, o local tem sido objecto de campanhas arqueológicas que visam reconstituir o sítio tal como era há 20 mil anos. Nessa altura, o arqueólogo não imaginava que dedicaria a década seguinte a estudar Vale de Boi.
Com ocupações regulares entre 25 mil e 6 mil anos atrás, o sítio era composto por um abrigo rochoso, perto do qual se supõe que existisse uma lagoa de ligação ao mar, onde os animais bebiam água. Do abrigo, num ponto mais alto, viam--se as manadas, facilitando a caça, o que, a par do acesso facilitado à água, pode explicar porque o local foi sendo sucessivamente ocupado por comunidades humanas.
As populações que ali habitavam alimentavam-se de marisco - lapa, berbigão, amêijoa e mexilhão -, dieta pouco frequente neste período e que está relacionada com a proximidade do mar, a apenas a dois quilómetros. Também caçavam animais, como o veado, cavalo, auroque (boi-gigante já extinto) e cabra- -montesa, tendo sido encontrados vestígios de lince, urso e lobo, que poderiam não ser para alimentação.
Foram encontrados em Vale de Boi milhares de vestígios, sobretudo material de pedra talhada, parte do qual seriam pontas de flecha, mas há uma descoberta que se destaca: trata-se de uma placa de xisto com três gravuras de animais - que se supõe serem auroques -, com mais de 20 mil anos, descoberta intacta, o que é invulgar, refere Nuno Bicho.
Foram igualmente encontradas peças de adorno feitas com pequenas conchas e o único vestígio "verdadeiramente" humano: um dente com sete mil anos. Mas a equipa sonha encontrar mais.|
Jornalista da agência Lusa