Pais usam baixas ilegais para seguir filhos com cancro
Doença. Surgem 350 novos casos todos os anos em Portugal
Todos os anos surgem 350 novos casos de cancro pediátrico - até aos 14 anos - em Portugal. Uma doença que implica o acompanhamento directo por parte da família da criança. Em muitos casos, os pais deixam mesmo de trabalhar para permanecer ao lado do filho doente. Mas, em Portugal "o tempo de licença legal é mais baixo do que o necessário e muitos pais acabam por pôr baixa própria", revela Margarida Cruz, presidente executiva da Associação de Pais e Amigos de Crianças com Cancro, a Acreditar.
A responsável confessa que os pais da crianças com cancro se vêem "obrigados" a recorrer a este "método menos lícito" para conseguir estar junto dos filhos. Para tal, contam com a "conivência dos médicos", acrescenta Margarida Cruz.
No Dia Internacional da Criança com Cancro, que se assinala hoje, a presidente da Acreditar reforça a necessidade de se criar um regime de "apoio para todas as crianças até aos 18 anos e não até aos 12 como acontece actualmente". A associação está também a tentar fazer aprovar um regime que inclua "apoio monetário para todos os pais, garantido pela Segurança Social e um alargamento do tempo de licença para estarem com os filhos", explica a dirigente.
"O tempo médio de acompanhamento é de dois anos, que não são totalmente passados no hospital, mas em tratamentos", refere Margarida Cruz. O actual regime de apoio às crianças doentes com cancro é o mesmo das crianças e jovens com deficiência. Assim, o tempo médio de licença do trabalho é de seis meses, mas pode ser alargado até aos dois anos, se a doença surgir nos primeiros três anos de vida. Também o apoio financeiro é garantido por seis meses e corresponde a 65% do salário referência do progenitor que se candidata ao subsídio.
Por outro lado, a lei geral da protecção de maternidade e paternidade estabelece que "os trabalhadores têm direito a faltar ao trabalho, até 30 dias por ano, para prestar assistência inadiável e imprescindível em caso de doença ou acidente, a filhos menores de 10 anos". Depois desta idade, os pais apenas podem faltar 15 dias. Já em caso de hospitalização a lei diz que "o direito a faltar estende-se ao período em que aquela durar, se se tratar de menores de 10 anos". Mas este direito só pode ser usado por um dos pais. Ora, um estudo italiano concluiu que os pais dedicam 150 dias por ano na assistência aos filhos com doenças oncológicas.
Uma situação que dificulta a manutenção do emprego, conforme defende Margarida Cruz. "Se a pessoa mora em Lisboa, no Porto ou em Coimbra [onde existem os locais de tratamento] consegue ir ao tratamento com o filho, sem perder o contacto com o mundo do trabalho, mas se for de fora não consegue e tem de deixar de trabalhar", admite.
"Temos famílias, por exemplo da Madeira, que acabaram por ficar na casa da Acreditar dois anos e perderam ou desistiram dos empregos", lamenta a presidente da Acreditar.
Segundo a Acreditar, todos os anos surgem cerca de 350 novos casos de crianças com cancro em Portugal. O que faz desta doença a segunda causa de morte infantil, apenas ultrapassada pelos acidentes. Mas, uma investigação do Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto concluiu que a taxa de sobrevivência das crianças com cancro tem vindo a aumentar, estimando-se que chegue aos 85% em 2010.|