Pais demitem-se das suas funções e são maltratados pelos filhos

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Educação. Especialistas alertam para a falta de comunicação e de regras nas famílias

Ausência de diálogo e de afecto compensada com a satisfação dos caprichos

A realidade é esta: cada vez são mais visíveis os casos em que os filhos, desde tenra idade até à adolescência, agridem os seus pais. Um fenómeno que na sociedade é transversal e que pode prenunciar "um cocktail explosivo". Este foi um dos temas debatidos no 3.º Encontro Técnico da CrescerSer, no Porto, desta vez subordinado à máxima, "Eu falo contigo. Fala comigo".

É, pois, a falta de comunicação entre pais e filhos que preocupa os especialistas, para quem os progenitores se demitem das suas funções de educadores, imputando à escola essa responsabilidade. Acresce que, em casa, a autoridade marca ausência, ou revela-se pouco consistente, ou seja, incongruente. Inclusive, nas relações disfuncionais os papéis dos pais e dos filhos chegam a inverter-se.

João Belchior, um dos participantes no encontro, serviu-se das funções que exerce como director do Colégio do Barão de Nova Sintra, da Santa Casa da Misericórdia do Porto, para afirmar que "falamos muito e comunicamos pouco". Ao DN, disse ser preciso haver duas realidades que desembocam no mesmo desfecho: filhos mal amados (por excesso ou defeito) e ausência de regras. Assim, "estamos a criar ditadores que, quando novos, toda a gente acha graça", conotando os maus tratos com a forte personalidade da criança.

Depois, em jeito de compensação pela inexistência de diálogo, os pais cedem aos caprichos dos filhos. É o consumismo, a rápida satisfação dos pedidos. Ora, este imediatismo "vai minando o processo educativo. Hoje, nada dá trabalho. Nem é preciso uma alavanca para abrir e fechar os vidros do carro", ilustrou João Belchior.

No entender deste técnico, proliferam os bodes expiatórios. Por exemplo, a falta de tempo. Porém, o mesmo não sucede na altura dos adultos acompanharem jogos de futebol, tão-pouco quando invadem os centros comerciais.

Neste sentido, acentuou o director do colégio de crianças carenciadas, "o facilitismo reflecte-se nas emoções". Na era da comunicação, disse, "nunca estivemos tão sós. Fala--se com o vizinho através da Net". Urge, assim, "criar um equilíbrio, resgatar o bom-senso". Daí os participantes neste encontro defenderem uma lógica de permuta de mais-valias e de conhecimentos entre instituições. Ou seja, uma colaboração mais orgânica em que a família esteja presente, mesmo na escola.

As contradições são muitas. Em um colégio de crianças carenciadas, "os jovens usam telemóveis topo de gama, superiores ao do director".

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