Os seis meses mais importantes da vida de António Costa

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Ministros que mentem ao Parlamento e são sucessivamente apanhados a fazê-lo, indemnizações milionárias decididas em grupos de WhatsApp, remodelações que promovem o gabinete de quem se demitiu, governantes que tomam "não saber" como remédio salvífico dos erros - e até das ilegalidades - que ocorrem sob a sua alçada, gente que sacrifica os seus e prossegue como se nada fosse, verdades que afinal eram falsas e falsidades que serão verdadeiras, um primeiro-ministro com a popularidade nos 30 pontos negativos (segundo o barómetro mais recente da Aximage para este jornal).

Tudo isto, para o observador mais ou menos apologista, significa caos absoluto. A maioria absoluta saiu pela culatra e vai, de tiro no pé em tiro no pé, em ricochete diário contra si mesma. Não é bonito, não, e já ultrapassou os limites do nosso precedente em democracia.

A oposição, que persegue casos judiciais e é perseguida por casos judiciais, não apresenta alternativa. O Presidente, que vai apontando a porta a quem nunca deveria ter entrado, procura válvulas de escape num beco para o qual também nos encaminhou - e do qual dificilmente sairemos.

Como já deixei firmado nesta coluna, pior do que o pântano, só o lamaçal.

A questão já não é se o governo leva a legislatura até ao fim, se o secretário-geral do PS descobre finalmente uma sucessão que lhe agrade, se a direita se entende e se encontra, se o regime sobrevive à gravidade (e à morosidade) das respetivas investigações, se Passos volta ou não (e para onde) ou qualquer outra das interrogações nacionais que preencheram os últimos anos. Hoje, a pergunta é muito mais simples, mas não menos relevante: reconquistará António Costa o direito ao benefício da dúvida junto do seu eleitorado?

Revendo as últimas semanas, é pouco crível que assim seja. Só este semestre o dirá, o que faz dos próximos seis meses um tempo definidor da vida política deste primeiro-ministro. Fará justiça à canonização de que foi alvo desde os acordos de 2015, que o levaram ao poder? Ou o desgaste é já irreversível e, pior do que isso, imparável?

A esperança de Costa, e isso nota-se na sua insistência em focar o debate "nos resultados", está na economia. Nada mais. Que corra tudo melhor do que se previa para este ano ou, como ele preferiria, que o Diabo acabe por não vir em 2023.

"Não vai ser um ano brilhante, mas parece muito melhor do que temíamos", admitiu Christine Lagarde em Davos, esta semana.

Se o governo ainda respirar depois da primavera, com uma inflação mais branda e taxas de juro menos severas, terá dobrado um primeiro cabo. Ouvindo a entrevista de Rui Baleiras (coordenador da UTAO) ao jornalista Vítor Costa, também esta semana, o défice de 2022 terá ficado perto de zero (e não dos 1,9% e 1,5% antecipados pelo governo), o que garantiria margem orçamental para resistir até lá.

Se a isso juntarmos as tranches de PRR em falta, o novo quadro comunitário a caminho e uma conjuntura internacional impulsionada pela abertura pós-pandemia da China, somos forçados a colocar o cenário, por mais absurdo que o estado do governo o faça parecer:

Pode a economia salvar António Costa da sua própria governação?

Tudo depende dos próximos seis meses.

Colunista

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