Os nacionalismos e a ameaça à unida espanhola, a fragmentação partidária e o fim do bipartidarismo, a ascensão da extrema-direita, a economia estagnada, a crise migratória para gerir, a incerteza do Brexit e o futuro da Venezuela são alguns deles..Os nacionalismos e a incógnita catalã.Foi a recusa dos independentistas catalães em apoiar o Orçamento de 2019 que obrigou Pedro Sánchez a antecipar eleições, devendo a Catalunha marcar toda a campanha eleitoral. Em paralelo a nova ida às urnas a 28 de abril decorre também no Supremo Tribunal, em Madrid, o processo contra 12 líderes independentistas, que começou nesta semana e deverá durar três meses..Ao anunciar as eleições, o líder socialista defendeu o diálogo com os catalães "sempre dentro da Constituição", enquanto na resposta Pablo Casado, do PP, lembrou que a escolha será entre um governo que negoceie com os independentistas e um que recorra ao artigo 155.º, suspendendo a autonomia catalã. Albert Rivera, do Ciudadanos, diz que o futuro tem de estar do lado dos que "amam Espanha" e não "dos que querem liquidá-la"..Não são as eleições que vão resolver a questão catalã, que será uma pedra no sapato para quem quer que esteja na Moncloa. Os catalães prometem não esquecer o referendo de 1 de outubro de 2017, nem a declaração de independência. "Espanha será ingovernável enquanto não enfrentar o problema catalão", disse a porta-voz da Generalitat, Elsa Artadi, deixando claro que "a situação não pode estar entre um governo ativamente repressivo e um ativamente passivo"..O nacionalismo catalão não é caso único, mas é o que tem atraído mais atenção, depois de anos em que o foco esteve nos bascos e na ETA (já desmantelada). Qualquer cedência aos catalães poderá reavivar as esperanças dos bascos..Fragmentação partidária complica alianças.O cenário eleitoral até dezembro de 2015 era simples: socialistas e populares alternavam no poder, com ou sem maioria, às vezes dependentes dos partidos regionais para governar. Mas o início desta década trouxe os indignados para as ruas, que, juntamente com o rebentar dos escândalos de corrupção nos partidos tradicionais, levou ao aparecimento de novas formações políticas: o Podemos, à esquerda, e o Ciudadanos, à direita..As eleições de 20 de dezembro de 2015 resultaram num Congresso dividido, com os dois novos partidos a conquistar 109 deputados (em 350) e os tradicionais a perder 84 deputados. Apesar da vitória, o PP não foi capaz de negociar uma maioria para governar. O socialista Pedro Sánchez arriscou, chegou a acordo com o Ciudadanos, mas não conseguiu conquistar o Podemos, que recusou uma aliança com o outro recém-chegado..O resultado foi a necessidade de os espanhóis voltarem às urnas em junho de 2016. Rajoy voltou a vencer sem maioria, melhorando ligeiramente o resultado de 2015. Depois de falhar à primeira, o PP conseguiu formar governo a 29 de outubro com o apoio do Ciudadanos e a abstenção do PSOE. Mas 20 meses depois acabaria por cair numa moção de censura de Sánchez - a primeira de sempre a ser bem-sucedida em Espanha. Nas próximas eleições, as contas e as alianças prometem complicar-se ainda mais, com a entrada em cena de outro partido: a extrema-direita do Vox..Extrema-direita com um pé no Congresso.Se a eleição de 12 deputados do Vox para o Parlamento da Andaluzia apanhou a sociedade espanhola de surpresa, já não será surpresa para ninguém quando o partido de extrema-direita fizer a sua estreia no Congresso em Madrid. Há sondagens que chegam a dar 12% ao partido de Santiago Abascal e cerca de 30 deputados - a distribuição dos deputados é feita por áreas e é preciso que esses votos estejam concentrados em alguns locais para garantir a eleição dos representantes ao Congresso..A extrema-direita defende, nas suas propostas, a revogação da lei da violência de género, quotas para a imigração ou o fim do estado autonómico. A ameaça que o Vox representa para a sociedade espanhola será um dos argumentos eleitorais da esquerda. Uma sondagem feita no início do ano, publicada pelo jornal digital El Español, revelava que quase metade dos espanhóis (47,3%) acreditam que o Vox representa uma ameaça à democracia constitucional em Espanha. Uma percentagem mais elevada do que a daqueles que consideram que o Podemos também representa essa ameaça (43,9%)..Dependendo do número de deputados que o Vox conquistar (e a quem roubar votos), poderá ter a chave para a formação de um governo de direita - como aconteceu na Andaluzia, onde garantiu o seu apoio à aliança entre PP e Ciudadanos para afastar pela primeira vez os socialistas. "A 28 de abril, Espanha reconquistará o seu futuro", é o compromisso do Vox, que promete fazer história..Economia parada sem novo Orçamento.2019 será mais um ano perdido para Espanha do ponto de vista da redução do défice estrutural. Sem um novo Orçamento do Estado, o país vizinho continuará a viver de acordo com o aprovado no Orçamento do ano passado, quando o primeiro-ministro espanhol ainda era Mariano Rajoy. Antes de ver o Orçamento chumbado no Parlamento, na passada terça-feira, a ministra das Finanças do governo de Sánchez, María Jesús Montero, admitiu que, sem contas novas, o défice público oscilará entre os 2,2% e os 2,4% do PIB. Em novembro, a Comissão Europeia estimou que o défice estrutural de Espanha seria de até 3,1% do PIB em 2019, o mais alto de toda a zona euro. Após o chumbo do Orçamento, María Jesús Montero admitiu: "Agora temos de ver como podemos fazer para evitar que o défice público suba até esse nível." No mesmo estarão a pensar os economistas depois de terem ouvido o primeiro-ministro prometer, na sexta-feira, que as medidas aprovadas por si com recurso à figura do decreto real vão mesmo para a frente. Exemplos disso são o aumento das pensões, o aumento do salário mínimo para os 900 euros e também dos salários da função pública. "Vamos cumprir isto", declarou o líder do PSOE, ao anunciar eleições legislativas antecipadas para 28 de abril. O que significa a dissolução do Parlamento espanhol a 5 de março. Alguns dos novos impostos pensados por Sánchez ficam em standby, como o imposto sobre o património, com o qual queria arrecadar uma receita de 339 milhões de euros..O que fazer com milhares de migrantes?.Quando, em janeiro deste ano, o rei Felipe VI recebeu em Madrid o corpo diplomático acreditado em Espanha, fixou como um dos principais desafios a nível global as migrações. O monarca, garante da unidade espanhola, pediu "um trabalho conjunto" para fazer "uma gestão ordenada e coletiva dos migrantes" como "forma adequada de fazer face a um fenómeno que não é novo". Na sua intervenção, Felipe VI sublinhou a importância do Pacto Mundial sobre as Migrações da ONU, o qual não foi subscrito pelos EUA e por países europeus como Hungria, Polónia, Áustria ou Itália. Este último, a par de Espanha, é um dos principais países recetores de migrantes e refugiados que atravessam o mar Mediterrâneo à procura de uma vida melhor na Europa. Nesta área, sim, poderá haver mudanças fundamentais segundo o resultado das legislativas de 28 de abril. Se o PP, apoiado pelo Ciudadanos e o Vox, chegar ao governo, tal como sucedeu na Andaluzia, a atitude de solidariedade e abertura que tem tido o executivo socialista de Pedro Sánchez deverá acabar. Sánchez aceitou, por exemplo, que os migrantes de embarcações rejeitadas por outros países desembarcassem em Espanha. O caso do Aquarius foi só um deles. Se o PP de Pablo Casado e o Ciudadanos ficarem pendentes do apoio do Vox para governar, o partido de extrema-direita pode recuperar a reivindicação que fez na Andaluzia: a expulsão de 52 mil migrantes que não têm a documentação necessária para permanecer em Espanha..A incerteza do Brexit e o futuro da Venezuela.Não tendo conseguido convencer toda a União Europeia a apoiar um processo de transição liderado por Juan Guaidó na Venezuela, restou a Espanha assumir a dianteira do grupo de países europeus, entre os quais está Portugal, que quer a organização de eleições livres naquele país da América Latina (ainda controlado neste momento por Nicolás Maduro). Ao ficar em gestão, o governo de Pedro Sánchez surge numa posição algo frágil para liderar o processo face à Venezuela. Porém, a posição do PP de Pablo Casado, caso venha a vencer as eleições de 28 de abril, é semelhante à do PSOE: apoiar Guaidó face a Maduro. Mais problemática, no curto prazo, poderá ser a questão do Brexit. Em caso de um Brexit sem acordo a 29 de março, Espanha será apanhada no processo em plena campanha eleitoral e com governo de gestão. Além de ser o país da UE com mais britânicos a viver no seu território, 300 mil, tem a espinhosa questão de Gibraltar em comum com o Reino Unido. Um Brexit sem acordo poderia obrigar a medidas de emergência (apesar da existência de um plano de contingência já preparado). Quando o Congresso espanhol for dissolvido, a 5 de março, e enquanto o país estiver em campanha, o guardião dos assuntos parlamentares é a Diputación Permanente (comissão parlamentar permanente). Segundo a imprensa espanhola, após o chumbo do Orçamento, o PSOE substituiu nesta comissão, com 60 deputados, um dos 20 eleitos que tem aí, José María Barreda. Curiosamente, um crítico de Pedro Sánchez.
Os nacionalismos e a ameaça à unida espanhola, a fragmentação partidária e o fim do bipartidarismo, a ascensão da extrema-direita, a economia estagnada, a crise migratória para gerir, a incerteza do Brexit e o futuro da Venezuela são alguns deles..Os nacionalismos e a incógnita catalã.Foi a recusa dos independentistas catalães em apoiar o Orçamento de 2019 que obrigou Pedro Sánchez a antecipar eleições, devendo a Catalunha marcar toda a campanha eleitoral. Em paralelo a nova ida às urnas a 28 de abril decorre também no Supremo Tribunal, em Madrid, o processo contra 12 líderes independentistas, que começou nesta semana e deverá durar três meses..Ao anunciar as eleições, o líder socialista defendeu o diálogo com os catalães "sempre dentro da Constituição", enquanto na resposta Pablo Casado, do PP, lembrou que a escolha será entre um governo que negoceie com os independentistas e um que recorra ao artigo 155.º, suspendendo a autonomia catalã. Albert Rivera, do Ciudadanos, diz que o futuro tem de estar do lado dos que "amam Espanha" e não "dos que querem liquidá-la"..Não são as eleições que vão resolver a questão catalã, que será uma pedra no sapato para quem quer que esteja na Moncloa. Os catalães prometem não esquecer o referendo de 1 de outubro de 2017, nem a declaração de independência. "Espanha será ingovernável enquanto não enfrentar o problema catalão", disse a porta-voz da Generalitat, Elsa Artadi, deixando claro que "a situação não pode estar entre um governo ativamente repressivo e um ativamente passivo"..O nacionalismo catalão não é caso único, mas é o que tem atraído mais atenção, depois de anos em que o foco esteve nos bascos e na ETA (já desmantelada). Qualquer cedência aos catalães poderá reavivar as esperanças dos bascos..Fragmentação partidária complica alianças.O cenário eleitoral até dezembro de 2015 era simples: socialistas e populares alternavam no poder, com ou sem maioria, às vezes dependentes dos partidos regionais para governar. Mas o início desta década trouxe os indignados para as ruas, que, juntamente com o rebentar dos escândalos de corrupção nos partidos tradicionais, levou ao aparecimento de novas formações políticas: o Podemos, à esquerda, e o Ciudadanos, à direita..As eleições de 20 de dezembro de 2015 resultaram num Congresso dividido, com os dois novos partidos a conquistar 109 deputados (em 350) e os tradicionais a perder 84 deputados. Apesar da vitória, o PP não foi capaz de negociar uma maioria para governar. O socialista Pedro Sánchez arriscou, chegou a acordo com o Ciudadanos, mas não conseguiu conquistar o Podemos, que recusou uma aliança com o outro recém-chegado..O resultado foi a necessidade de os espanhóis voltarem às urnas em junho de 2016. Rajoy voltou a vencer sem maioria, melhorando ligeiramente o resultado de 2015. Depois de falhar à primeira, o PP conseguiu formar governo a 29 de outubro com o apoio do Ciudadanos e a abstenção do PSOE. Mas 20 meses depois acabaria por cair numa moção de censura de Sánchez - a primeira de sempre a ser bem-sucedida em Espanha. Nas próximas eleições, as contas e as alianças prometem complicar-se ainda mais, com a entrada em cena de outro partido: a extrema-direita do Vox..Extrema-direita com um pé no Congresso.Se a eleição de 12 deputados do Vox para o Parlamento da Andaluzia apanhou a sociedade espanhola de surpresa, já não será surpresa para ninguém quando o partido de extrema-direita fizer a sua estreia no Congresso em Madrid. Há sondagens que chegam a dar 12% ao partido de Santiago Abascal e cerca de 30 deputados - a distribuição dos deputados é feita por áreas e é preciso que esses votos estejam concentrados em alguns locais para garantir a eleição dos representantes ao Congresso..A extrema-direita defende, nas suas propostas, a revogação da lei da violência de género, quotas para a imigração ou o fim do estado autonómico. A ameaça que o Vox representa para a sociedade espanhola será um dos argumentos eleitorais da esquerda. Uma sondagem feita no início do ano, publicada pelo jornal digital El Español, revelava que quase metade dos espanhóis (47,3%) acreditam que o Vox representa uma ameaça à democracia constitucional em Espanha. Uma percentagem mais elevada do que a daqueles que consideram que o Podemos também representa essa ameaça (43,9%)..Dependendo do número de deputados que o Vox conquistar (e a quem roubar votos), poderá ter a chave para a formação de um governo de direita - como aconteceu na Andaluzia, onde garantiu o seu apoio à aliança entre PP e Ciudadanos para afastar pela primeira vez os socialistas. "A 28 de abril, Espanha reconquistará o seu futuro", é o compromisso do Vox, que promete fazer história..Economia parada sem novo Orçamento.2019 será mais um ano perdido para Espanha do ponto de vista da redução do défice estrutural. Sem um novo Orçamento do Estado, o país vizinho continuará a viver de acordo com o aprovado no Orçamento do ano passado, quando o primeiro-ministro espanhol ainda era Mariano Rajoy. Antes de ver o Orçamento chumbado no Parlamento, na passada terça-feira, a ministra das Finanças do governo de Sánchez, María Jesús Montero, admitiu que, sem contas novas, o défice público oscilará entre os 2,2% e os 2,4% do PIB. Em novembro, a Comissão Europeia estimou que o défice estrutural de Espanha seria de até 3,1% do PIB em 2019, o mais alto de toda a zona euro. Após o chumbo do Orçamento, María Jesús Montero admitiu: "Agora temos de ver como podemos fazer para evitar que o défice público suba até esse nível." No mesmo estarão a pensar os economistas depois de terem ouvido o primeiro-ministro prometer, na sexta-feira, que as medidas aprovadas por si com recurso à figura do decreto real vão mesmo para a frente. Exemplos disso são o aumento das pensões, o aumento do salário mínimo para os 900 euros e também dos salários da função pública. "Vamos cumprir isto", declarou o líder do PSOE, ao anunciar eleições legislativas antecipadas para 28 de abril. O que significa a dissolução do Parlamento espanhol a 5 de março. Alguns dos novos impostos pensados por Sánchez ficam em standby, como o imposto sobre o património, com o qual queria arrecadar uma receita de 339 milhões de euros..O que fazer com milhares de migrantes?.Quando, em janeiro deste ano, o rei Felipe VI recebeu em Madrid o corpo diplomático acreditado em Espanha, fixou como um dos principais desafios a nível global as migrações. O monarca, garante da unidade espanhola, pediu "um trabalho conjunto" para fazer "uma gestão ordenada e coletiva dos migrantes" como "forma adequada de fazer face a um fenómeno que não é novo". Na sua intervenção, Felipe VI sublinhou a importância do Pacto Mundial sobre as Migrações da ONU, o qual não foi subscrito pelos EUA e por países europeus como Hungria, Polónia, Áustria ou Itália. Este último, a par de Espanha, é um dos principais países recetores de migrantes e refugiados que atravessam o mar Mediterrâneo à procura de uma vida melhor na Europa. Nesta área, sim, poderá haver mudanças fundamentais segundo o resultado das legislativas de 28 de abril. Se o PP, apoiado pelo Ciudadanos e o Vox, chegar ao governo, tal como sucedeu na Andaluzia, a atitude de solidariedade e abertura que tem tido o executivo socialista de Pedro Sánchez deverá acabar. Sánchez aceitou, por exemplo, que os migrantes de embarcações rejeitadas por outros países desembarcassem em Espanha. O caso do Aquarius foi só um deles. Se o PP de Pablo Casado e o Ciudadanos ficarem pendentes do apoio do Vox para governar, o partido de extrema-direita pode recuperar a reivindicação que fez na Andaluzia: a expulsão de 52 mil migrantes que não têm a documentação necessária para permanecer em Espanha..A incerteza do Brexit e o futuro da Venezuela.Não tendo conseguido convencer toda a União Europeia a apoiar um processo de transição liderado por Juan Guaidó na Venezuela, restou a Espanha assumir a dianteira do grupo de países europeus, entre os quais está Portugal, que quer a organização de eleições livres naquele país da América Latina (ainda controlado neste momento por Nicolás Maduro). Ao ficar em gestão, o governo de Pedro Sánchez surge numa posição algo frágil para liderar o processo face à Venezuela. Porém, a posição do PP de Pablo Casado, caso venha a vencer as eleições de 28 de abril, é semelhante à do PSOE: apoiar Guaidó face a Maduro. Mais problemática, no curto prazo, poderá ser a questão do Brexit. Em caso de um Brexit sem acordo a 29 de março, Espanha será apanhada no processo em plena campanha eleitoral e com governo de gestão. Além de ser o país da UE com mais britânicos a viver no seu território, 300 mil, tem a espinhosa questão de Gibraltar em comum com o Reino Unido. Um Brexit sem acordo poderia obrigar a medidas de emergência (apesar da existência de um plano de contingência já preparado). Quando o Congresso espanhol for dissolvido, a 5 de março, e enquanto o país estiver em campanha, o guardião dos assuntos parlamentares é a Diputación Permanente (comissão parlamentar permanente). Segundo a imprensa espanhola, após o chumbo do Orçamento, o PSOE substituiu nesta comissão, com 60 deputados, um dos 20 eleitos que tem aí, José María Barreda. Curiosamente, um crítico de Pedro Sánchez.