Os problemas da alimentação não estão no Natal
O excesso alimentar não é um problema exclusivo do Natal. A questão de uma alimentação excessiva é, infelizmente, um problema relacionado com o que comemos e bebemos todos os dias. Retirando os dias de Natal, dois dias para a passagem de ano - e mais alguns dias que devem ser comemorados - o problema está nos outros 340-350 dias do ano. Para esses tantos outros dias, sim, sugiro que procure fazer uma alimentação saudável, capaz de fornecer todos os nutrientes, na quantidade e com a qualidade necessária. E, se for necessário obter alguma informação ou orientação, não hesite em consultar um profissional de nutrição.
Não me ocorre, regra geral, pedir às pessoas que "façam dieta" no Natal, ou que alterem receitas tradicionais feitas uma vez por ano. Não faria sentido, tendo em conta a nossa cultura, onde a alimentação vai muito para além da função de nutrir, representando um ato social e familiar muito importante.
Vale a pena recordar que o Cristianismo nasceu na mesa da Última Ceia e que o seu grande símbolo - a Eucaristia - é algo que se faz à volta de uma mesa. Na nossa cultura, no Natal, não estamos propriamente a comemorar o Pai Natal, mas sim algo mais antigo - o nascimento de Jesus. Assim, festejamos esse nascimento em espírito de partilha, à volta da mesa, com amor, ternura e alegria no reencontro familiar.
Se formos menos consumistas e comemorarmos esta época num espírito de partilha, estamos também a vivenciar uma muito antiga tradição humana, já que na história do Homo sapiens sapiens a partilha de alimentos é muito precoce, num ato de comensalidade que revela a função social da alimentação. A palavra comensalidade deriva do Latim, onde "mensa" significa "conviver à mesa", representando sociabilidade e comida partilhada. Desta forma, Natal, partilha e comensalidade são uma trilogia que faz todo o sentido.
Também na versão mediterrânica da Roda dos Alimentos, verificamos que nos é recomendado dedicar algum tempo à confeção dos alimentos e à partilha de refeições com amigos e família. E isto, podemos fazer todo o ano, mas no Natal é quase obrigatório!
Em suma, desejo que o Natal possa ter rabanadas, coscorões, filhoses, bacalhau, peru e outras iguarias tradicionais para cada família, que só vamos voltar a comer no próximo ano. Desejo que tais iguarias sejam comidas com o devido prazer, à mesa com a família e amigos, em verdadeira partilha. Evidentemente, não é preciso exageros, até porque o desperdício não estará muito de acordo com o espírito natalício, mas certamente se há época em que devemos desfrutar do prazer de uma alimentação de festa é no Natal.
Acabo lembrando que o Natal não vai do princípio de outubro ao final de janeiro e que se comemora nos dias 24 e 25 de dezembro.
Uma sugestão final. As sobras devem ser poucas e poderiam ser partilhadas com muitos!
Um Feliz Natal e um Excelente 2022!
Catarina Roquette Durão, nutricionista no Hospital CUF Tejo - Unidade de Medicina de Estilos de Vida da CUF by NOVA Medical School - Professora da NMS|Faculdade de Ciências Médicas, Universidade NOVA de Lisboa