Os melhores filmes de 2022 - O cinema como fruta da época
O primeiro pensamento que me ocorre para classificar 2022 é a abundância de bons filmes estreados em sala que passaram ao lado do público, semana após semana. Não apenas a maior parte dos que integram a minha lista dos melhores do ano, mas outras obras premiadas como Alcarràs, de Carla Simón (Urso de Ouro no Festival de Berlim), ou O Acontecimento, de Audrey Diwan (Leão de Ouro em Veneza), esta última adaptada do livro homónimo de Annie Ernaux, a mais recente Nobel da Literatura. Filmes, estes e outros, que podem agora ser revisitados na sala Fernando Lopes, em Lisboa (até 4 de janeiro), num ciclo cujo título faz um belo trocadilho com o derradeiro Kubrick: "De Olhos Bem Abertos - Grandes Filmes que Possas Ter Perdido". É uma frase certeira, porque efetivamente foi um ano muito saudável em termos de produção cinematográfica, mas tristonho na frequência das salas. Mais deprimente ainda é pensar que o filme português mais visto se chama Curral de Moinas - Os Banqueiros do Povo. Deprimente é a palavra.
Vale a pena determo-nos um pouco no capítulo depressivo. Este foi também o ano da bofetada de Will Smith, que não se apagará facilmente da memória dos Óscares. E se recupero esse lamentável episódio é apenas para sublinhar a "tragédia" de uma edição francamente falhada, que não premiou cinema, mas sim um programa de boas intenções. Será que ainda alguém se lembra do filme vencedor? Depois de ter ido consultar o título, dou uma ajudinha: CODA - No Ritmo do Coração. Isto para dizer que só houve um grande vencedor nessa noite, e foi na categoria de filme internacional. Drive My Car, do japonês Ryûsuke Hamaguchi, pôs a comunidade do cinema atenta a uma das maiores revelações dos últimos anos. Até Almodóvar, no pós-evento, escreveu que se recusava a aceitar que a deplorável atitude de Smith ficasse com o protagonismo da cerimónia onde venceu o seu filme "favorito do ano"... Drive My Car.
Revelação é, neste contexto, outra palavra importante. 2022 trouxe algumas descobertas esperançosas ao meu horizonte cinematográfico. Refiro-me em particular ao iraniano Saeed Roustaee, realizador do magnífico Os Irmãos de Leila, ainda em cartaz, de quem se estreou também A Lei de Teerão. Dois filmes num ano só, que deram a conhecer uma das jovens e refrescantes promessas do Irão, esse país que tem sido notícia pelo sentimento de revolta que o domina - precisamente, a atriz principal de Os Irmãos de Leila, Taraneh Alidoosti, foi presa esta semana por declarar o seu apoio aos protestos a decorrer.
Em termos de descobertas, deixo uma palavra também para o suíço Andreas Fontana, com uma primeira obra, Azor, que parece trabalho de veterano (fica a curiosidade pelo que se irá seguir), e para a indiana Payal Kapadia, cujo fabuloso Noite Incerta, meio documentário, meio crónica onírica, venceu a penúltima edição do LEFFEST. De resto, esperemos que Os Fabelmans, a carta de amor de Spielberg ao cinema, tenha a capacidade de provocar um abanão emocional nos espectadores. É uma espécie de desejo natalício.
1. DRIVE MY CAR, Ryûsuke Hamaguchi
2. O PROFESSOR BACHMANN E A SUA TURMA, Maria Speth
3. OS IRMÃOS DE LEILA, Saeed Roustaee
4. OS FABELMANS, Steven Spielberg
5. THE SOUVENIR: PART II, Joanna Hogg
6. PERANTE O TEU ROSTO, Hong Sang-soo
7. AZOR - NEM UMA PALAVRA, Andreas Fontana
8. NOITE INCERTA, Payal Kapadia
9. NOPE, Jordan Peele
10. UMA BELA MANHÃ, Mia Hansen-Løve