Na literatura latina, utiliza-se o termo homo faber, quando nos queremos referir à capacidade do ser humano para controlar o seu quotidiano e o que o rodeia defendendo que "todo o homem é o artífice do seu próprio destino"..Homo faber significa assim "homem que faz" e, de acordo com Henri Bergson, representa a ideia de que a criatividade é o atributo humano inerente que nos leva a construir os objetos artificiais que utilizamos para controlar o nosso ambiente..Vilém Flusser faz crescer esta ideia de homo faber, defendendo que na evolução da fabricação do ser humano, este vem dotado com componentes diferentes..Estes componentes, digo eu, assemelham-se por exemplo à evolução de qualquer objeto mundano como o automóvel ou o telefone..As fábricas de seres humanos são assim locais onde estão sempre a ser produzidos todos os novos tipos de modelos. O primeiro de que há registo é o homem-mão, o modelo mais arcaico e menos desenvolvido. Este é na verdade uma espécie de modelo beta do homo faber que teve a sua primeira aparição há cerca de trezentos mil anos. A sua grande preocupação era sobreviver. Depois o modelo evoluiu e nasce o homem-ferramenta. Este modelo já conseguia avaliar os contextos e construir pequenos objetos que potenciavam o seu quotidiano. A ideia de sobrevivência começa assim a ser posta de lado, dando lugar a outro tipo de preocupações..O homem-máquina é o modelo que atravessa todo o século XX e é lançado no período em que o homem percebeu que a mecanização do mundo ia resultar numa melhoria exponencial dos estilos de vida. No entanto é este modelo o maior responsável pela forma como mundo se encontra reforçando de forma galopante a ideia de os recursos são finitos. O modelo mais recente é o homem-robot. Este é o modelo mais paradigmático pois é o mais evoluído, mas em simultâneo é também o menos interessante. Apresenta um bug ao nível do pensamento crítico, e deixou de produzir os seus artefactos, pedindo ajuda a seres tecnológicos que pensam por si para os conceber..Paradoxalmente, este modelo terá a capacidade de se substituir a si próprio. Terá componentes tão avançadas que, no futuro, já não será o homem a fabricar modelos humanos. Esta capacidade de criação que o ser humano desenvolveu ao longo dos.seus estágios de fabricação, superou-se a si próprio. É, metaforicamente assumir que o conta quilómetros deu a volta, mas o motor continua a trabalhar..O homo faber está assim, diria eu, no seu último estágio. Para não dizer que é o fim, diria que estamos no momento de nos repensarmos. De nos recriarmos..Se somos nós os artífices do nosso próprio destino, há que, uns diriam reacender outros abrandar a nossa capacidade criadora e evitar a falência desta fábrica de seres humanos, de modo a não colocar em causa a nossa própria existência. O que, repare-se!, sob o ponto de vista fenomenológico seria um antagonismo. Em português corrente é como dizer que seríamos nós os criadores da nossa própria obsolescência..Penso que a ideia de sobrevivência está novamente em cima da mesa de forma muito visível, mas acredito que perante a adversidade o reacender do instinto de sobrevivência do ser humano ajudará a encontrar forma de pensar um novo estágio..Ou melhor ainda, e quiçá, talvez um destes homens-robots encontre o erro no sistema e possa fazer reset nas máquinas e salvar assim toda a humanidade..Designer e Diretor do IADE - Faculdade de Design, Tecnologia e Comunicação da Universidade Europeia