Pagou seis mil euros de dívidas do clube para "não deixar os miúdos na rua".O convite para treinar uma equipa de Paços de Ferreira, há pouco tempo, não foi aceite. "A minha mulher matava-me", justifica Paulo Bragança. Dirigir equipas nunca foi o objectivo do presidente da Associação Desportiva Cultural Recreativa Os Fatigados, um clube do bairro de S. Tomé, na zona do Amial, no Porto. .Há pouco tempo, Paulo terminou o curso de treinador de nível II. "Não é que queira ser treinador, mas quero estar actualizado e poder falar com os miúdos e ajudar na sua formação", explica. O curso ajudou-o a perceber muitas coisas, inclusive a reagir melhor às arbitragens. "Enervava-me muito com os árbitros, mas no curso aprendemos algo sobre psicologia e recebemos formação de árbitros também, o que nos leva a percebê-los melhor", conta. Como treinador dos Fatigados era exigente, mas festejava as vitórias como mais ninguém. A alegria de viver é uma característica, "talvez a tenha trazido de Angola, porque Portugal, quando cá cheguei em 1974, era um país muito triste, fechado e sisudo", recorda..Esse foi o maior choque da família Bragança, após 13 anos de ausência do País. O regresso de Luanda não foi traumático, mas a memória da despedida do país que continua a ver como seu foi difícil. "Ainda este ano fui a Luanda para tentar montar um negócio mas é muito difícil: caro e burocrático", garante o dirigente..Há dois anos, quando Paulo Bragança decidiu pegar nos Fatigados, a situação do clube já não era famosa, as dívidas ultrapassavam os 6000 euros, um pormenor que começava a anunciar o destino que tantos clubes amadores já tiveram. Paulo Bragança não quis que o mesmo acontecesse aos Fatigados, a agremiação fundada pelo irmão quando, em 1974, tiveram de regressar de Luanda. Sendo assim, pagou as dívidas e prometeu a si mesmo não abandonar a única associação de um dos bairros sociais mais degradados do Porto, onde droga e desemprego já não são vistos como flagelo mas como o statu quo. "É preciso alguém aqui a tentar tirar os miúdos da droga ou evitar que eles entrem nessa vida sem sentido", explica. .Os dias de Paulo Bragança estão completamente preenchidos: "Trabalho muito, com muita alegria e isso facilita tudo, desde a relação com aos empregados, aos clientes, até mesmo com a família". O segredo dos seus negócios, diz, "é sermos sempre nós a tratarmos das nossas coisas", por isso é ele quem coordena e compra tudo que é preciso para as cerca de 1200 refeições por dia no Instituto Superior de Engenharia do Porto (ISEP), por exemplo, e mais umas quantas no Instituto Superior de Contabilidade e Administração do Porto (ISCAP), onde também explora a cantina. Além disso, tem com a esposa uma empresa de limpezas..O tempo, esse, chega e sobra para as coisas que tem de fazer. "O importante é não complicar", diz. E pensa assim também em relação ao clube que dirige - o dinheiro que coloca no clube tira-o do seu bolso e espera agora pela ajuda da Junta de Freguesia de Paranhos, que já prometeu uma sede nova no bairro. "Não tenho muito orgulho na sede que temos agora, não tem grande ambiente, mas o importante é que estamos a ajudar a população jovem do bairro. Temos dois jogadores a participar na selecção nacional, no ano passado um dos nossos miúdos foi para uma equipa da 1.ª Divisão nacional, o Alpendurada, outro para a Fundação Jorge Antunes e estamos a negociar um outro miúdo para o Boavista. O nosso papel também é criar oportunidades para os miúdos e o meu trabalho é contribuir para abrir o caminho deles", afirma.