Os elefantes na Cimeira do G7

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Os líderes dos sete países mais industrializados do mundo estão reunidos neste fim de semana na cidade japonesa de Hiroshima. Sobre este encontro do G7 pairam duas nuvens negras: a guerra na Ucrânia e a alegada "coação económica" da China. Ao contrário dos tempos da velha "guerra fria", a ordem geopolítica e económica internacional já não é uma realidade binária, com dois blocos assumidos, mas sim uma complexa teia de relações e dependências que colocam o mundo sob um cenário de permanente incerteza.

A tensão entre a Rússia e a Ucrânia impôs-se na agenda há nove anos, quando a Rússia invadiu a região ucraniana da Crimeia. Nesta península, concretamente em Sevastopol, estava sedeada a frota Russa do Mar Negro, ao abrigo do Tratado de Paz e Amizade celebrado entre a Federação Russa e a Ucrânia. Contudo, com a destituição do presidente pró-russo Viktor Yanukovich, em 2014, a Rússia invadiu à força o território, com o apoio de separatistas pró-russos, forçou um referendo - considerado ilegal pelas Nações Unidas - e procedeu à respetiva anexação, proclamando a Crimeia como parte integrante da nação russa. O então G8, que reunia o clube das economias avançadas - Alemanha, Canadá, EUA, França, Itália, Japão, Reino Unido e Rússia -, tomou a decisão de expulsar a Rússia, pelo que o grupo passou a designar-se G7.

Este apontamento histórico importa para se perceber que o G7 está vinculado a uma tomada de posição de há nove anos. A invasão da Ucrânia pela Rússia no ano passado, que deu origem à guerra em curso, seguiu em parte um guião similar. A encenação do referendo seguido de anexação voltou a repetir-se, desta vez em Donetsk e Lugansk, na região ucraniana do Donbass, resultando na imediata condenação e declaração de ilegalidade por parte das Nações Unidas.

A diferença é que, desta vez, a Ucrânia resistiu e a tentativa de tomar Kiev por parte dos russos foi um fracasso rotundo. A cara dessa resistência é o presidente Volodymyr Zelensky, que foi justamente convidado para a cimeira do G7 deste fim de semana. O primeiro comunicado oficial da reunião veio já reafirmar o apoio inequívoco destes países à Ucrânia, o que de certa forma representa o posicionamento do mundo ocidental. À margem da cimeira, constatam-se dois movimentos que não são irrelevantes. Por um lado, outros países convidados, aparentemente liderados pelo Brasil, procuram moderar o isolamento da Rússia, sem contudo deixar de condenar a invasão. Estarão preocupados com o futuro das suas relações comerciais e com a nova ordem que poderá emergir do pós-guerra. Por outro lado, o presidente norte-americano Joe Biden já fez saber que deixaria cair as suas reticências sobre o fornecimento de caças F-16 à Ucrânia, naquilo que poderá ser um golpe duro sobre o controlo do espaço aéreo por parte dos Russos.

A segunda nuvem negra é o papel da China na economia e na geopolítica internacional. O posicionamento do colosso asiático relativamente à guerra tem suscitado muitas dúvidas, percebendo-se o seu desconforto em criar condições para que a posição americana e europeia vença em toda a linha. Mas estará em cima da mesa também o tema do controlo de práticas de "coação económica" que a China poderá estar a usar, tirando partido da preponderância que ostenta nas trocas comerciais com parceiros internacionais, como é o caso da própria Alemanha. Os países do G7 dividem-se sobre a existência de controlos à expansão do domínio económico chinês.

Não restam dúvidas de que, sem estarem presentes, a Rússia e a China são os elefantes na casa de loiças do G7.


Professor catedrático

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