Os discos de 2012: Nuno Galopim
1º Perfume Genius, "Put Your Back N2 It" (Matador Records)
2º Tori Amos, "Gold Dust" (Deutsche Grammophon)
3.º Pet Shop Boys, "Elysium" (Parlophone)
4º Philip Glass, "Rework" (Orange Mountain Music)
5º Max Richter, 'ReComposed - Vivaldi Four Seasons' (Deutsche Grammophon)
6º Frank Ocean, "Channel Orange" (Def Jam)
7º Miguel, "Kaleidoscope Dream" (Epic Records)
8º Lana del Rey, "Born To Die" (Universal)
9º Damon Albarn, "Dr Dee" (EMI Music)
10º John Talabot, "Fin" (Permanent Vacation)
O primeiro disco, editado em 2010 traduzia o desconforto que acarretou todo um processo de procura de uma voz e de estabelecimento de uma janela de comunicação. Exorcizar a dor nunca seria um parto fácil, mas Learning e a sua frágil coleção de canções chamaram atenções e, entre as entrevistas que acompanharam o lançamento do disco e os concertos que se seguiram abriu-se um espaço onde, aos poucos, foi encontrando modos de enfrentar o mundo ao seu redor, num processo que lhe deu segurança suficiente para não ter de fechar os olhos ao que de tão pessoal habitava entre aquelas canções.
Dois anos depois, Put Your Back N2 It dava conta de um seguro novo episódio num percurso de franca evolução na continuidade das ideias com que se apresentara dois anos antes. De resto, ao servir como aperitivo para o álbum um teledisco (para o tema Hood) contando com a colaboração do ator porno Arpad Miklos, ficava claro que outra segurança habitava agora no mesmo Mike Hadreas. Os dois anos que se tinham passado fizeram-lhe bem. E o disco materializa o melhor do que o tempo mudou.
Put Your Back N2 It evidencia desde logo que a sua capacidade de comunicar mudou, mas na essência o disco deixa claro que Mike Hadreas continua a ser o mesmo cantor magoado, assombrado por dúvidas e medos que descobríamos há dois anos. Tecnicamente o disco deixa para trás o patamar lo-fi das canções de Learning, o recurso a outras condições de trabalho (a utilização de outros estúdios e outros instrumentos) tornando as canções mais polidas e feitas de linhas mais firmes. Mas mesmo assim não menos frágeis, igualmente intrigantes, e mais belas que nunca. Curtas, como sempre, o seu saber em reduzir as ideias à sua essência, sem adornos desnecessários, sem refrões ou partes a mais, garantindo-lhes um sentido de verdade que só fala em seu favor.
Ao falarmos, no Meco, Mike dizia-me que tenta hoje em dia fazer a música que gostava de ter ouvido quando era mais novo. Escrever sobre assuntos que não ouviu ainda referidas nesses modos específicos em que os canta. Fala na primeira pessoa. Reflete vivências, a sua identidade, o amor e a dificuldade em conhecer o outro. Usa o piano como primeiro aliado mas a voz como evidente protagonista (não apenas pelas palavras que canta mas pela forma como as molda aos climas em que as encena). Quando era mais novo, e como estas canções tão bem sugerem, Mike Hadreas pensava que não se ajustava, que não pertencia a lado nenhum. Hoje confessa que, por vezes, ainda não se sinte ajustado a cem por cento. Mas como Put Your Back N2 It nos mostra, isso já não o incomoda.