Os direitos humanos

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Foi oportuno o movimento de Celebração dos 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, sobretudo ocasião para incitar contra o vasto não cumprimento da promessa do "nunca mais" que representou a fundação da ONU avaliando o desastre mundial da guerra de 1939-1945. Isso não é apenas oportuno nos próprios países ocidentais cuja cultura marcou o texto mas não suficientemente a execução, que teve o obstáculo de o fim da colonização ter sobretudo deixado livres novos países que apenas tinham experiência de serem governados por poderes extrativos, e sobretudo lutarem pela libertação política, e não pela democracia que ignoravam das antigas soberanias. Passados tantos anos, em vários lugares ocidentais a crise democrática ameaça, ainda quando manifestada nos factos sem perder a cobertura normativa dos textos da ONU, nesses casos fictícia, não obstante a violência dos conflitos armados de várias espécies, e as muitas outras violências de poderes que não respeitam as Declarações de Direitos Humanos. É esperançoso todavia verificar que, sobretudo por esse antigo chamado terceiro mundo, já vai crescendo uma literatura específica que renova o pensamento e tradições da sua cultura tradicional, ou, pela ação que muitas vezes inclui o sofrimento, ganha o reconhecimento pela outorga de prémios, como o Nobel, que consagra a intervenção de novos pensadores, que sofrem o risco para darem o exemplo.

Entre nós, na linha do exemplo, e merecendo justiça a vida trabalhosa no sentido de tornar progressiva a adesão ao princípio da "terra morada comum dos homens", recordamos o jubilado Professor Adelino Torres, que teve experiência de investigação e ensino nesse Terceiro Mundo, e que, no seu livro intitulado Vozes do Sul do Mundo Global (África, Médio Oriente, e outros lugares, 2018), sem deixar de sublinhar as ameaças do "islamismo político", salienta sobretudo "a juventude do continente africano e a aparição de autênticos filósofos africanos, que "abrirá caminho a uma nova modernidade". Para isso avalia, e junta ensaios, sobre o "Racismo, Ontem e Hoje", "O Terrorismo", "a Filosofia Africana", afirmando: "As vozes do Sul" a que me refiro são aquelas, ainda minoritárias mas cada vez mais numerosas, de livres pensadores, que em África e no Médio Oriente, bem como noutras regiões do mundo, se batem pela liberdade de pensamento crítico e humanista contra todas as formas de obscurantismos". E não deixa de lembrar o aviso de Amartya Sen sobre "o erro conceitual que vê a democracia essencialmente em termos de voto e de eleição em lugar da perspetiva mais vasta do debate público".

A lembrança desta última contribuição de Adelino Torres foi avivada pela realização, no Centro de Congressos do Estoril, em 14 de Dezembro, a propósito do aniversário da Declaração Universal de Direitos Humanos, de uma celebração tendo por tema dominante "Uma perspetiva da Juventude sobre a atualidade da Declaração nos seus 70 anos". É de sublinhar que foi Presidente da Sessão de Abertura o ilustre Presidente de Cabo Verde, Jorge Carlos Fonseca, também Presidente pro tempore da CPLP, esta com larga representação da juventude dos países dessa Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, e intervenção do Prof. Vital Moreira, Comissário das Comemorações Nacionais dos 70 anos da DUDH, além de representantes de outras nacionalidades e do governo português.

A formação superior dos interventores, que juntam a informação à sabedoria, fortalece o trabalho pioneiro de Adelino Torres, e sobretudo dá esperanças do fortalecimento anunciado do programa da CPLP, já anunciado. Não se trata apenas do fortalecimento de solidariedade dos países de língua portuguesa, em que a juventude coloca o acento tónico no futuro do legado recheado de perplexidades que vai herdar, sem perder a memória, mas fortalecendo a capacidade de reconstruir o futuro de acordo com a celebrada, e tantas vezes esquecida ou violada, Declaração Universal dos Direitos Humanos. Sem esquecer que o património imaterial da humanidade, de que são parte os direitos fundamentais da Declaração, tem alicerces no já secular ensino das Universidades Peninsulares, e missionários, com evidência para as Universidades de Coimbra, de Évora, e de Salamanca.

É evidente que não se trata apenas de tornar efetiva a Declaração de Direitos, que designadamente não conseguiu ainda extinguir a escravatura: trata-se igualmente de não esquecer que a promulgação do texto pelos Estados, não consegue extinguir logo a discriminação social, cuja expressão mais grave são os mitos raciais. A UNESCO fez um excelente trabalho nesta área, mas não apenas o abandono pelos EUA da Organização, também a crise económica que afeta o mercado de trabalho, as migrações descoordenadas que poem em conflito grave a segurança e o dever de socorrer, mais a completa indiferença do atual presumido herdeiro de Jefferson, avultam como graves desafios entre os chamados "choques do futuro", que já é presente.

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