Os cogumelos deram-lhe asas

O lisboeta Ruben Gama veio para esta região trabalhar numa exploração agropecuária e acabou por lançar o seu próprio projeto. Cogumelos de Arganil chegam a cada vez mais clientes.
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Atravessamos montes tingidos de branco, graças à flor de esteva, saímos da estrada nacional e subimos pelo caminho de terra batida. Estamos em Arganil, uma região vasta, encaixada entre a imponência da serra do Açor e a frescura do rio Alva com vales ricamente florestados, bem no centro do país. Causam admiração os enormes pavilhões brancos onde Ruben Gama trabalha.

Lisboeta, neto de arganilenses, está há dez anos a trabalhar nesta região. Primeiro, numa exploração agropecuária e, depois, com este negócio próprio: uma plantação biológica de cogumelos. Os seus filhos brincam na estrada de terra batida em redor destes gigantes brancos na companhia da Muxi, a cadela da família. Saem para apanhar flores para oferecer à mãe que estava em casa, em Arganil. A família foi a principal razão da mudança para este local. Depois da licenciatura em produção animal, na cidade de Santarém, esteve alguns anos a viver em Lisboa com Patrícia, a namorada que vinha dos tempos de escola secundária. Queriam constituir uma família mas, sobretudo, queriam ter tempo para ver os filhos crescer.

Depois de um período sem emprego na capital, decidiu rumar a uma região com bastantes ofertas de trabalho na sua área. Este território está, na sua opinião, bem apetrechado com escolas e serviços de saúde, além de ficar próximo de grandes centros urbanos como Coimbra. Por este motivo, consegue garantir qualidade de vida: "Não sinto diferença entre viver aqui ou numa grande cidade. Afinal estamos num país que demora duas horas a atravessar". Claro que nestes dez anos não existiram só momento positivos. Basta recordar os incêndios de outubro 2017.

Nessa altura, o fogo tingiu estas colinas de negro. Além dos 45 mortos e cerca de 70 feridos, perto de uma dezena dos quais graves, centenas de animais morreram encurralados por um mar de chamas que em dois dias varreu a região norte e centro do país. Só em Arganil mais de 145 casas foram destruídas pelos incêndios, sendo 85 de primeira habitação. Mas o impacto também atingiu muitos animais.

O Ministério da Agricultura, num balanço feito no final desse mês, apontava mais de 500 mil animais mortos, sobretudo aves, mas também bovinos, ovinos e suínos. Na exploração agropecuária onde Ruben trabalhava, dezenas de animais perderam a vida, num episódio que o traumatizou. A sua paixão "é trabalhar com a vida" e este foi um golpe muito duro para quem quer "estar perto da natureza, trabalhar a terra e dinamizar um mundo rural tão abandonado".

Foi com entusiamo e curiosidade que Ruben abraçou este projeto do cultivo de cogumelos, baseado na aposta numa "agricultura sustentável, isenta de qualquer tipo de aditivo e respeitando o desenvolvimento natural". Estes grandes pavilhões, construídos de raiz para este efeito e preparados com controle de temperatura e humidade, albergam vários blocos de substratos que permitem o crescimento de cogumelos. Estes fungos são distintos dos tradicionais cogumelos Paris, que estamos habituados a ver nas prateleiras de supermercados.

Os cogumelos Portobello, Shitake, Pleurotus e Pioppino saem daqui frescos ou desidratados e embalados. São muito procurados por um tipo de público que vê neste tipo de alimento uma fonte rica em fibras, proteínas, vitaminas, minerais e com reconhecidas propriedades medicinais. O consumo de cogumelos é cada vez mais importante, como nos explica Ruben: "O cogumelo é pouco estudado e tem muita coisa para dar". Mas se existe uma dádiva maior, foi encontrar aqui "uma paz de espirito" apesar de nos últimos anos muitos dos seus amigos, que viviam nesta região, terem feito a mudança em sentido inverso. Para Ruben, e para a sua família, se mudassem continuaria a ser para o interior do país.

Arganil

Vila pertencente ao distrito de Coimbra, na região da Beira Litoral, com cerca de 4000 habitantes e 332,84 quilómetros quadrados de área. É sede de município, dividido em 14 freguesias.

#UmOutroPaís

Projeto coproduzido com a Escola Superior de Comunicação/IPL

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