Oposição insiste nos salários da função pública, governo não cede
A oposição mantém a insistência, e o governo mantém a recusa. Novamente, o debate na especialidade sobre a proposta de Orçamento do Estado para 2022 centrou discussões sobre a inflação e a perda de poder de compra prevista para este ano, designadamente, entre os trabalhadores da função pública. Mariana Vieira da Silva, com esta pasta, voltou a afastar ir além dos 0,9% de atualização com uma subida intercalar das remunerações.
Em audição com os deputados, a ministra da Presidência admitiu que haverá um "recuo" no objetivo de aumentar o peso dos salários na riqueza gerada no país.
A opção de não avançar agora com uma reposição do poder de compra "terá custos num recuo naquele que é um objetivo que o governo tem", assumiu em resposta ao deputado José Soeiro. Mas, "a crise, a guerra e o choque têm repercussões", afirmou, defendendo que não há contradição na atuação do governo. "O que não parece possível é dizer que quando o governo no dia 1 de maio reafirma o seu objetivo está a entrar em contradição". Segundo a governante, no Orçamento que tem aprovação garantida no final do mês o governo trata de mitigar os principais impactos das subidas de preços. Depois, irá "corrigir a trajetória".
As bancadas da oposição acreditam que haverá ainda margem para mais. O PSD, pelo deputado João Barbosa de Melo, assinalou um valor de 121,5 milhões de euros que o governo inscreve como aumento em despesas com pessoal mas que não se encontra justificado por qualquer medida nos quadros orçamentais. Seria, segundo o PSD, suficiente para suportar uma atualização intercalar de salários em quatro décimas neste ano, para que a subida total ficasse nos 1,3% de inflação média de 2021.
Mas, Mariana Vieira da Silva não confirmou qualquer intenção de o governo rever em alta a atualização de salários da função pública, nem tão-pouco justificou a margem orçamental assinalada pela oposição.
O governo espera para agir "com mais certezas, que certamente teremos em setembro, face à natureza desta inflação", afirmou.
O calendário coincide com a data a partir da qual, anualmente, o governo e os sindicatos realizam negociações sobre matérias com impacto no Orçamento do ano seguinte. Neste aspeto, o governo tem reiterado o objetivo de manter a atualização anual de salários, sem contudo assumir o compromisso de uma atualização com a inflação do ano anterior.
A atualização de 2023 vai ser definida à vista da "avaliação que for feita da natureza dessa inflação nesse momento, do sucesso das medidas que entretanto estamos a tomar para conter os preços e, naturalmente, como sempre da situação do país", segundo o que foi transmitido aos sindicatos nas últimas reuniões negociais.
Entretanto, a partir de junho, após a aprovação do Orçamento, o governo compromete-se a iniciar a negociação de uma série de matérias, incluindo a revisão da Tabela Remuneratória Única e dos salários de entrada de assistentes técnicos e técnicos superiores, a revisão do sistema de avaliação dos funcionários públicos e a simplificação do recrutamento.
Mariana Vieira da Silva referiu que o governo mantém também nos planos para este ano a valorização das remunerações de doutorados que já estão na carreira pública ou nela vão entrar.
Mas, para estas matérias, a oposição diz não ver "calendário e orçamento" na proposta apresentada pelo governo. Mariana Vieira da Silva insistiu que os planos são para "uma legislatura".
Na audição, a ministra foi questionada sobre várias outras matérias, incluindo a revisão do estatuto dos dirigentes da administração pública, objetivo no qual Vieira da Silva garantiu que "nada mudou". Atualmente, indicou, há 116 dirigentes em regime de substituição. Esta condição tende a favorecer a seleção em concurso.
Os deputados pediram também o ponto de situação em relação a pedidos de pré-reforma no Estado. O governo deu conta de "menos de 50 pedidos" até aqui e defendeu que a prioridade está na contratação de novos trabalhadores e não na aposentação dos mais velhos.
A contratação a prazo na função pública foi outro tema abordado, com os deputados do Bloco de Esquerda e do PCP a apelarem a um novo programa de regularização de vínculos precários. Vieira da Silva disse no entanto que a preocupação do governo é a de simplificar e tornar mais rápidos os recrutamentos, e não respondeu à pergunta sobre quantos trabalhadores ainda aguardam a regularização iniciada na última legislatura.