O algoritmo do olhar
O conflito entre o ser humano e as máquinas no cinema remonta há quase cem anos. Metropolis (1927), de Fritz Lang, aborda essa temática e é capaz de ser o filme de sci-fi mais influente de sempre. Arrisco a dizer que Metropolis será talvez o ponto de partida para as distopias adivinhatórias, que se materializam primeiro na literatura e no cinema. Será talvez também o ponto de partida para a convenção de um algoritmo social e moral, que ganha relevância em filmes como Blade Runner (1982 e 2017), A.I. (2001), Os Substitutos (2009) e Her (2013).
Estas quase premonições criam a possibilidade de ver o mundo através de um filtro especial, "desconstruindo-o" com uma curiosidade analítica, para que então o voltemos a "construir" baseado em perceções, que se tornam, ou poderão tornar, verdades. A criação destes mundos fictícios influencia novos mundos, também eles fabricados, que são os mundos em que vivemos. Músicos, escritores, realizadores, designers, arquitetos, são os principais responsáveis pela programação do código que alimenta estes algoritmos. Mas isso não é mau. Não! No entanto, leva-nos a pensar se as perseguições de Blade Runner ou as paixões em Her e A.I. podem ou não vir a ser uma realidade. Se alguém concebido sem pai e sem mãe, injetado com as memórias de alguém pode ou não vir a ser um polícia no futuro? Se podemos ou não vir a apaixonar-nos por um cyborg ou uma outra qualquer criatura totalmente tecnológica? Se podemos ou não deixar de discernir o real do fabricado?
Parece que com o avançar dos anos, e da ciência, a ficção científica ganha contornos muito mais interessantes, mas infelizmente sempre conotados com uma dimensão negativa e distópica do mundo. Apesar de as linhas anteriores serem o espelho disso, não quero advogar que chegaremos aos futuros criados por George Orwell ou Aldous Huxley. Nada disso! Aonde quero chegar é que as nossas perceções, a forma como criticamos com o olhar, é também definida por crenças artificiais para além das naturais, divinas ou holísticas.
É caso para dizer que o nosso algoritmo do olhar processa em simultâneo uma redução empírica da realidade real e uma ampliação da realidade fabricada.
E esta fabricação é nada mais nada menos do que a construção de novas linguagens e convicções universais. E isso não é mau. Ou é?
Designer e diretor do IADE - Faculdade de Design, Tecnologia e Comunicação da Universidade
Europeia