ONU diz que está na altura de ativar a justiça internacional
"Está na altura de dar lugar à justiça, nós sugerimos o Tribunal Penal Internacional", disse Del Ponte numa conferência de imprensa em Genebra, acrescentando que a comissão não tem poder para isso mas pode fazer pressão.
"Somos capazes de identificar os responsáveis por estes crimes, os que decidem, organizam e planeiam", prosseguiu Carla Del Ponte, referindo-se a uma lista de responsáveis que "é secreta porque cabe aos tribunais abrir inquéritos formais e redigir acusações".
No final do mandato da comissão, em março, essa lista vai ser entregue à Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos, Navanethem Pillay.
O relatório, o segundo da comissão, aponta para uma escalada da violência na Síria e um aumento dos crimes de guerra cometidos tanto pelas forças do regime como pela oposição.
"A profundidade da tragédia síria reflete-se de maneira aguda no número das suas vítimas. As experiências atrozes relatadas pelos sobreviventes dão conta de graves violações dos direitos humanos, crimes de guerra e crimes contra a humanidade", lê-se no relatório, de 131 páginas.
"A dinâmica destruidora da guerra civil não tem apenas efeitos na população civil, como também reduz a nada toda a complexa estrutura social do país, põe em risco as gerações futuras e ameaça a paz e a segurança em toda a região", acrescenta o documento.
A comissão, criada em 2011 pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU, nunca foi autorizada a visitar a Síria, onde o regime do presidente Bashar al-Assad trava desde março de 2011 uma guerra civil com forças opositoras, conflito que, segundo a ONU, já fez mais de 70.000 mortos.
Num primeiro relatório, publicado em agosto de 2012, os peritos entrevistaram mais de 1.000 pessoas, entre autores e vítimas, tendo acusado as duas partes em conflito de crimes de guerra.
Neste novo relatório, baseado em quase 450 entrevistas, a comissão indica que a situação se agravou, numa espiral de violência, com ambos os lados a cometerem crimes de guerra, precisando contudo que as forças do regime cometeram mais crimes.
"A situação de direitos humanos na Síria continuou a deteriorar-se", "o conflito tornou-se mais sectário e a condução das operações mais radical e militarizada", afirma o relatório.
A maioria dos rebeldes que combatem o regime são muçulmanos sunitas, enquanto os detentores do poder e seus apoiantes são membros da comunidade alauita, uma ramificação do Islão xiita.
O documento responsabiliza as forças do regime e milícias suas aliadas por "crimes contra a humanidade, assassínios, torturas, violações (...) desaparecimentos forçados e outros atos desumanos".
Os grupos armados da oposição, lê-se no documento, "cometeram crimes de guerra, incluindo assassínios, atos de tortura, sequestros e ataques a bens protegidos", embora sem "a intensidade nem a escala das cometidas pelas forças governamentais".
"É imperativo encontrar os responsáveis das duas partes por todos os crimes", afirma o relatório.
A comissão constatou, por outro lado, que a oposição armada conseguiu nos últimos meses "substanciais avanços militares" no norte e centro do país.
Apesar de continuar dividida, a oposição "amadureceu e tornou-se uma força capaz de pôr em questão o controlo do Governo sobre o país e de atacar objetivos estratégicos, como explorações petrolíferas e aeroportos".