OE2022. Negociações do Governo com partidos à esquerda prestes a recomeçar
A muito curto prazo - pode até ser uma questão de horas ou dias, ainda esta semana - o Governo do PS e os partidos à sua esquerda iniciarão conversas substantivas sobre o OE2022. A disponibilidade de todos existe e, pelo lado do Governo, o "pivot" das negociações é o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Duarte Cordeiro. Cordeiro já disse que as negociações serão retomadas no final deste mês ou no início do próximo.
Aos poucos, PCP e BE vão apresentando o seu cargo de encargos e o que lhes é mais prioritário. E o Governo também vai desfiando a sua agenda, estando o jogo a ficar mais claro. Ninguém dá nada por adquirido, exceto a vontade de negociar. Mas as agendas que comunistas e bloquistas põem em cima da mesa parecem indicar distâncias diferentes de ambos os partidos em relação à possibilidade de um acordo. O BE parece estar mais longe; e o PCP mais próximo.
No caso dos bloquistas, a insistência continua a parecer centrada em dois pontos: mais pessoal para o SNS; e revogação de normas introduzidas no Código do Trabalho durante o período da troika (as que embarateceram os despedimentos, por exemplo).
Domingo, no final do congresso do PS, em Portimão, Jorge Costa, deputado e dirigente nacional do BE, considerou as medidas anunciadas por António Costa como "importantes" - dizendo também esperar que se reflitam na proposta de Orçamento do Estado para o próximo ano.
Contudo, o dirigente bloquista não deixou também de sublinhar a ausência no discurso do primeiro-ministro de alguns tópicos essenciais" para o BE. Nesse contexto, recordou que a legislação laboral é uma matéria da qual o BE não prescinde e "onde o PS insiste em recusar a alteração das medidas que a `troika´, o Governo de Passos Coelho, introduziu em 2012". "Quando o primeiro-ministro fala da dignidade do trabalho e da necessidade de fazer crescer o salário médio, isso só pode conseguir-se alterando a condição do trabalho na sociedade, alterando a condição dos trabalhadores neste contexto", completou.
Nas mesmas declarações, Jorge Costa também fez notar a "falta de um compromisso" do PS no que toca a mais investimentos no SNS.
Quanto ao Código do Trabalho, há muito que Costa e o Governo se mostram intransigentes na decisão de não revogar medidas introduzidas durante a troika. E sobre o SNS, o primeiro-ministro tem insistido na ideia de que tem de facto existido um reforço dos investimentos, nomeadamente na contratação de pessoal médico, pelo que as exigências do BE são, na visão dos socialistas, meramente retóricas.
Apesar destes aparentes bloqueios - aparentes porque as negociações do OE2022 são sempre um jogo de sombras até ao momento das votações -, o BE, que votou contra o Orçamento no ano passado, tem insistido na sua disponibilidade para negociações.
"Sempre tivemos essa vontade, mas claro, não podemos desistir daquilo que é fundamental no nosso país que é respeitar quem trabalha, quem trabalhou toda uma vida, quem está mais vulnerável e garantir que o dinheiro público é utilizado onde verdadeiramente é importante para todos e para todas", afirmou há dias Catarina Martins, insistindo também numa outra medida, "a questão do acesso à reforma das pessoas com mais de 55 anos com deficiência, incapacidade, acima dos 60 por cento e com mais de 20 anos de carreira contributiva."
Quanto ao PCP, o cenário parece mostrar maiores possibilidades de entendimento, embora com os comunistas sempre num tom reivindicativo e não querendo dar-se já por satisfeitos.
Os comunistas têm insistido em exigir "respostas do ponto de vista do aumento dos salários" e, indiretamente, António Costa encaminhou-se nesse sentido, há duas semanas, numa entrevista ao Expresso onde prometeu para o OE2022 mexidas nos escalões do IRS (diminuindo a carga fiscal da classe média), maiores deduções familiares também no IRS e um novo impulso ao abono de família. Já no congresso do PS, este fim de semana, prometeu um reforço substancial da oferta estatal no que toca a creches - e isso é uma forma tanto de diminuir a despesa das famílias com os seus filhos, aumentando-lhes indiretamente o rendimento disponível, como de tentar incentivar à natalidade.
Jerónimo de Sousa, entretanto, voltou a pôr em cima da mesa um aumento do salário mínimo para 850 euros em 2022 (atualmente é de 665 euros) mas, na verdade, o salário mínimo é uma questão à margem do Orçamento do Estado.