OE 2017. Ninguém vê uma crise política no horizonte
Foi a visão sobre a situação económica que ontem separou esquerda e direita - nas sete audiências que o Presidente da República manteve em Belém, a seu pedido, com os sete partidos parlamentares. Já sobre a perspetiva de uma crise política no médio prazo, revelou-se um certo consenso: ninguém a vê no horizonte, mesmo o PSD ou o CDS.
"Não vemos nenhum cenário de crise política no horizonte", disse Sofia Galvão - a vice-presidente do PSD que chefiou a delegação do partido (segundo um assessor de imprensa, Passos Coelho está doente). "Eu não vou estar a comentar um cenário que não está em cima da mesa", afirmou também a presidente do CDS, acrescentando: "Não depende de nós a manutenção ou não da atual solução e portanto não nos ocupamos do que não depende de nós."
À esquerda, as palavras foram também de empenhamento nas "posições conjuntas" que unem PS, BE, PCP e PEV - mas porventura com uma posição mais retraída por parte dos comunistas.
Pelo PS, a secretária-geral adjunta, Ana Catarina Mendes, que chefiou a delegação do seu partido - António Costa só se relaciona com o PR enquanto primeiro-ministro - afirmou que "não há à vista nenhuma questão de instabilidade política, nenhuma crise política" e "os acordos estão firmes e estão para durar".
Já Catarina Martins, coordenadora do Bloco de Esquerda, sublinhou que "o Presidente não tem nenhum motivo para intranquilidade", sendo que o BE "nunca lhe deu motivos para isso".
Segundo acrescentou, o acordo com o PS "tem estado a ser cumprido" e "existem condições em Portugal para se continuar a fazer este caminho". "Esperamos continuar o percurso que tem vindo a ser feito no próximo Orçamento do Estado", acrescentou - sem no entanto estabelecer uma posição final do seu partido quanto à hipótese, por exemplo, de o governo insistir mesmo na ideia de manter congeladas em 2017 as carreiras na Função Pública. Nesse dossiê, a líder e deputada bloquista sacudiu a pressão: "As negociações fazem-se à mesa e o BE negociará o Orçamento do Estado com o governo e com o PS" e o que é preciso é "determinação e cabeça fria", sendo o "cimento" do acordo com PS a política de reposição dos rendimentos (nos salários e nas pensões) cortados pela governação PSD/CDS, entre 2011 e 2015.
Até lá, acrescentou ainda Catarina Martins, o governo terá no BE "um aliado" em tudo o que implique combater a "chantagem" que a UE está a fazer sobre o país com a ameaça de sanções. Aliás, segundo sublinhou, a execução orçamental ontem revelada (ver pág. 14) até dá mais argumentos a António Costa para as "combater" em Bruxelas.
Jerónimo de Sousa foi, como é hábito, um pouco mais recuado. Disse que a "Posição Comum" que o PCP assinou com o PS tem sido "no essencial concretizada". Ou seja, "a nova situação política" encontrada à esquerda "permitiu avanços significativos na reposição de direitos, rendimentos" e "defesa dos serviços públicos", o que "tem um grande significado num quadro tão difícil no plano económico e social". Só que esses avanços têm por ora uma dimensão "insuficiente e limitada".
Portanto, em "tudo o que seja este caminho de prosseguir essa reposição e conquista de direitos, o PCP estará presente". Mas se houver "qualquer inversão deste caminho, reversão, voltar para trás, como o PSD atualmente defende e propõe, naturalmente não estaremos de acordo". Neste aspeto - e ao contrário do que fez Catarina Martins - Jerónimo salientou com clareza a posição do PCP sobre a possibilidade de não haver um aumento real de vencimentos na Função Pública: "Seria um mau caminho voltar a cortar salários ou congelá-los."
O tom de Jerónimo contrastou até com o do deputado José Luís Ferreira, que representou o PEV, partido coligado com os comunistas na CDU. ""Os Verdes" consideram que esta sessão legislativa foi muito produtiva, muito útil para os portugueses, porque representou o início da recuperação de rendimentos das famílias e a devolução de direitos perdidos com o anterior governo PSD/CDS", afirmou o deputado, para quem os acordos com o PS representam "uma segunda Constituição", havendo do PEV disponibilidade para "continuar esta caminhada" de "devolução de rendimentos e recuperação de direitos".
Entre a esquerda e a direita - inclusivamente na configuração do hemiciclo parlamentar - André Silva, do PAN, também sublinhou as virtualidades da estabilidade, pedindo "responsabilidade" a todos, tanto os da atual "solução governativa" como os da oposição.
À direita também houve sintonia - mas nas críticas à ação governativa. Tanto Sofia Galvão (PSD) como Assunção Cristas (CDS) falaram nos problemas da banca. E ambas salientaram uma visão pessimista sobre o investimento e o crescimento da economia. No caso do PSD, foi reforçado que nunca o PS poderá contar com ajuda se tiver dificuldades em fazer passar o OE 2017: "O PSD não é parte da solução em termos do próximo Orçamento do Estado."
Hoje o Presidente prosseguirá a sua ronda de contactos ouvindo parceiros sociais.