Obama visita Cuba em março mas sem conseguir pôr fim a embargo
A última vez - e na verdade a única - que um presidente americano esteve em visita oficial a Cuba, Calvin Coolidge fez de tudo para recusar um daiquiri sem ofender o então homólogo cubano, Gerardo Machado. Estávamos em 1928, nos EUA vigorava a lei seca e a Grande Depressão do ano seguinte ainda não passava de uma miragem. Passados 88 anos, Barack Obama já não terá com certeza problemas em degustar um mojito quando a 21 e 22 de março visitar a ilha. A menos de um ano do fim do mandato, o chefe do Estado americano dá mais um passo na aproximação ao velho inimigo da Guerra Fria, mesmo se acabar com o embargo - dependente de um Congresso de maioria republicana - parece impossível para já.
Catorze meses depois de ter anunciado a normalização das relações entre EUA e Cuba, Obama confirmou no Twitter uma visita histórica. "No próximo mês vou viajar até Cuba para promover o progresso e os esforços que podem melhorar a vida do povo cubano", escreveu o presidente da sua conta @potus. Na agenda de Obama - que viajará com a mulher, Michelle, estarão encontros com o homólogo cubano, Raúl Castro, com empreendedores e com "cubanos de diferentes setores" da sociedade civil.
Do lado de Havana, o Ministério dos Negócios Estrangeiros foi o primeiro a reagir, também no Twitter. "O mandatário norte-americano será bem-vindo pelo governo de #Cuba e pelo seu povo, com a hospitalidade que o caracteriza", escreveu naquela rede social Josefina Vidal, que chefiou a equipa que negociou com os americanos. Mais tarde, em conferência de imprensa, a diretora-geral para os Estados Unidos do Ministério dos Negócios Estrangeiros cubanos explicou que a visita de Obama será "uma oportunidade para apreciar a realidade cubana e aprofundar o diálogo e a cooperação bilaterais".
Vidal lembrou ainda que a "normalização das relações entre Cuba e EUA passa pelo levantamento do embargo e pela devolução do território ocupado pela base naval americana de Guantánamo". Arrendada pelos EUA a Cuba desde 1903 - apesar de desde a revolução de 1959 Havana não levantar o dinheiro -, Guantánamo ganhou fama em 2002 quando a administração Bush passou a usar a prisão da base naval para suspeitos de terrorismo. Chegaram a ser 780 detidos, mas hoje só restam 91. Encerrá-la foi a primeira promessa de Obama na Casa Branca, mas continua por cumprir.
Nos últimos meses, Cuba e Estados Unidos reabriram as embaixadas em Washington e Havana, procederam a uma troca de prisioneiros, os americanos facilitaram as viagens e as remessas de dinheiro para a ilha e anunciaram, nesta quarta-feira, o retomar dos voos regulares - 110 por dia. O embargo, esse, continua em vigor, mais de seis décadas depois. E assim continuará até ao fim do mandato de Obama. Isto porque o bloqueio comercial só pode ser levantado pelo Congresso e este é dominado pelos republicanos tanto na Câmara dos Representantes como no Senado.
Obama já havia garantido que apenas visitaria Cuba se tivesse oportunidade de se reunir com dissidentes políticos. Ontem, no Twitter, o presidente admitia: "Ainda temos divergências com o governo cubano que irei abordar diretamente. A América irá sempre defender os direitos humanos no mundo."
Condenação
Mal se soube da ida de Obama a Cuba, o senador da Florida, Marco Rubio, filho de imigrantes cubanos, apressou-se a condenar a visita. À CNN, o candidato à nomeação republicana para as presidenciais de novembro nos EUA lamentou que não se trate de uma Cuba "livre" aquela que Obama vai visitar. Também filho de um cubano, Ted Cruz garantiu que nunca irá a Cuba "enquanto os Castros estiverem no poder". O senador do Texas é outro dos candidatos republicanos à Casa Branca. "O que Obama mostrou aos nossos inimigos foi fraqueza", disse Cruz, antes de acrescentar: "É um erro. Em vez de fazer pressão para uma Cuba livre, está a agir como um apologista [do regime]."
As organizações de cubanos no exílio também criticaram a viagem de Obama. Em declarações ao Nuevo Herald, Silvia G. Iriondo, presidente da Mães e Mulheres contra a Repressão, de Miami, afirmou: "Lamentavelmente, não vai a Cuba celebrar a liberdade do povo cubano, mas validar a ditadura militar dos Castros." Raúl sucedeu no poder ao irmão Fidel em 2008. Este governava a ilha desde a revolução de 1959, que derrubou Fulgencio Batista.
Com as primárias da Florida (onde vive uma grande comunidade cubana) a 15 de março, dias apenas antes de Obama chegar a Havana, parece certo que a deslocação do presidente vai marcar a campanha nos próximos tempos.