O caminho português representa quase 30% dos peregrinos que chegam a Santiago de Compostela. O que pode fazer Portugal para aumentar esse número e beneficiar da sua passagem pelo país? Bom, em primeiro lugar, o trabalho de promoção. Quanto mais se difunde o caminho, mais conhecido será e mais gente poderá fazê-lo. Depois, o que o governo galego fez: melhorar as infraestruturas. É muito importante que em todos os traçados haja infraestruturas turísticas, que os peregrinos saibam que a cada momento têm um lugar para descansar, para dormir se quiserem ficar. A sinalização também é muito importante. É uma batalha que tivemos na Galiza durante muitos anos. Tem de ser igual em todo o lado. E investimento. A Junta da Galiza destinou 80 milhões de euros neste ano para investir no caminho, de promoção, de manutenção. Mas nos últimos anos Portugal deu-se conta da importância do caminho de Santiago..O que se pode esperar deste Xacobeo [ano santo], que pela primeira vez, por causa da pandemia, não dura só um ano, mas dois, prolongando-se até ao final de 2022? Antes da pandemia, a nossa estimativa, porque foi o que aconteceu no último Xacobeo há 11 anos, era que o PIB da Galiza subisse dois pontos. Logo, esperamos um impulso económico muito grande. Algo também que nos ajude a impulsionar ainda mais a Galiza no mapa mundial. Os peregrinos que vêm são meio milhão e nós recebemos cinco milhões de turistas. Estou certo de que muitos destes são peregrinos que vieram uma vez e depois quiseram voltar a conhecer-nos novamente..Na apresentação do Xacobeo no Porto falou desta cidade como porta de entrada para os peregrinos internacionais. É uma aposta que estão a fazer? Para ser peregrino é preciso percorrer cem quilómetros e tradicionalmente as pessoas começavam na fronteira, em Tui. Mas cada vez mais vemos que as pessoas começam antes e muita gente, especialmente aqueles que vêm de mais longe, das Américas, brasileiros, começam no Porto. É algo que também queremos potenciar. O Xacobeo é uma oportunidade também para Portugal, é um motor turístico. Os peregrinos são interessantes, mas são apenas um exemplo de todos os que podem vir à Galiza. Queremos uma relação estreita com os nossos vizinhos e que o caminho do Porto a Santiago continue a crescer..Durante a pandemia, a fronteira entre Portugal e a Galiza esteve fechada. Qual foi o impacto e a situação já voltou ao normal? Foi um impacto enorme, já não nos lembrávamos do que era haver fronteiras e de um dia para o outro já não se podia passar. Foi um impacto não só no setor do turismo, mas em tudo, nas relações. Pessoas que estavam acostumadas a passar a fronteira, várias vezes ao dia, de um lado para o outro, e de repente já não podiam passar ou tinham de dar uma volta enorme e enfrentar filas para entrar. Teve um impacto tremendo, inclusive do ponto de vista emocional, não só económico. Quando se reabriram as fronteiras, tudo isso começou a recuperar-se, incluindo os caminhos de Santiago. O português é, nestes meses, o que mais está a crescer..Com tantos visitantes que são esperados, que medidas foram tomadas por causa da pandemia? Os albergues ainda não estão a 100% da capacidade, estão a metade e vão passar em breve aos 75%. Porque os albergues são sítios coletivos, onde se junta muita gente, não há quartos individuais. Demos formação ao pessoal dos albergues e estabelecemos um seguro covid, segundo o qual quem chegasse como turista à Galiza e se contagiasse, bastava um telefonema para se tratar de tudo, sem pagar. Se tinha de ficar num hotel ficava, se fosse preciso repatriar, repatriava-se. Isso contribuiu muito para dar uma sensação de segurança. Em 150 mil peregrinos foi preciso ativá-lo em 20 ocasiões. Os números da Galiza, em comparação com a média de Espanha, foram também sempre bons, fomos a segunda comunidade com menos contágios..O PP está à frente do governo da Galiza desde 2009. Como tem sido a relação com o governo da coligação entre PSOE e Unidas Podemos de Pedro Sánchez? Nós dizemos sempre que as relações podiam ser melhores. Sentimos sempre falta de uma maior implicação do governo no Xacobeo. O governo de Espanha tardou em dar-se conta, mas agora parece começar a perceber que os peregrinos que vêm fazer o caminho são turistas que antes entram em Espanha por muitos sítios. O Xacobeo não é só uma coisa da Galiza, é de toda a Espanha..E noutras áreas? Bom, houve problemas também na gestão da covid. Cada comunidade autónoma teve de fazer a gestão por sua conta. As normas que havia na Galiza eram diferentes das de outras regiões. Os peregrinos vinham a andar e quando cruzavam de uma comunidade autónoma para outra as regras mudavam radicalmente, havia coisas que podiam fazer e outras que não. Nós pedimos que o governo nacional gerisse tudo isto, pedimos uma lei de pandemia para aplicá-la em todo o território. E o governo não o quis fazer, decidiu que cada comunidade tinha de lutar as suas próprias guerras. Sentimos falta de uma gestão nacional da pandemia, apesar de acharmos que fizemos o trabalho razoavelmente bem..susana.f.salvador@dn.pt