O vegetal da época: sofisticada endívia

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A existência da endívia, tal como a conhecemos e dela desfrutamos, saborosa, tenra e refrescante, é um dos casos em que me apoio para não fazer coro com os saudosistas, para quem só os sabores do passado satisfazem. Lembremos o percurso desta filha do Norte da Europa, suficientemente próximo para o conhecermos com exactidão.

Pertencendo à família das Compostas, usa o mesmo nome botânico da chicória, de cuja raiz, depois de torrada, se faz um sucedâneo do café: Chichorium intybus. Como muitas das grandes invenções, a história da endívia começou por ser «obra do acaso». Em 1843, um camponês belga reparou que das raízes da chicória selvagem, deixadas na terra e ao abrigo da luz, despontavam uns rebentos compridos, brancos, adocicados e de textura muito agradável. Deu-lhes o nome de witloof, que em flamengo significa «folha branca». Deve-se, porém, a Brézier, botânico belga, não só a sua melhoria como a normalização da sua cultura. Hoje, na Europa, o saboroso vegetal cultiva-se sobretudo no Norte da França e na Bélgica, onde lhe dão o petit nom de chicon e é de tal modo apreciado que o consideram, sem sombra de contestação, o legume nacional e traço de união entre flamengos e valões.

Falo-lhes hoje das endívias porque estamos na época do ano em que são melhores: de Novembro a Abril. São caras? Concordo, mas tem atenuantes. Primeiro: não têm desperdício, tudo se aproveita; são de preparação tão simples que nem é preciso lavá-las - uma passagem com um pano húmido é suficiente. E depois, que voltas leva a sua cultura? Semear por volta de Abril em terreno muito fértil, regar muito, desbastar e, em Novembro, quando as plantas apresentam a raiz tão espessa como uma cenoura e as folhas bem verdes, cortam-se estas deixando-as apenas a 5 centímetros, e transplantam-se os rebentos para um composto húmido, dentro de caixas altas que se mantêm em local escuro e a uma temperatura elevada. Quatro semanas depois estão prontas e magníficas. Isto é: as endívias estão bem brancas, estaladiças e sem sombra de cor em toda a sua extensão.

Depois de sabermos como se apresenta uma boa endívia, não é difícil encontrá-la num bom supermercado português.

É em salada que mais gosto delas: deixo as folhas inteiras - assim não amolecem - junto-lhes meias nozes, fatias de maçã (que rego com limão), cubos de queijo gruyère, do autêntico, rego tudo com uma vinagreta de três partes de um azeite virgem suave, uma parte de vinagre de vinho tinto, uns grãos de pimenta verde e outros tantos de flor de sal algarvia. Hum!

Uma sugestão cozinhada? Abrir as endívias ao meio na perpendicular sem separar as folhas, retirar parte do talo, que pode amargar; colocar as endívias num tacho, juntar um pouco de manteiga, uma pitada de açúcar, outra de sal e um pouco de água. Tapar e cozer com o lume forte. Envolver cada meia endívia numa fatia fina de fiambre, colocar lado a lado num tabuleiro, cobrir com molho bechamel e queijo gruyère ralado e levar a forno bem quente a gratinar. Isto que dá pelo nome de «Endívias à flamenga» é como os belgas mais as apreciam. E em matéria de saber comer, não temos muito para lhes ensinar...

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