O SXSW 2023 aborda a Inteligência Artificial e os limites do uso da tecnologia

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Desde a última sexta-feira, 10/3, está a acontecer um dos principais eventos da atualidade. O South by Southwest, ou SXSW, que tem lugar anualmente em Austin, cidade estadunidense localizada no Texas. É parecido com o Websummit de Lisboa pelo fato de reunir uma verdadeira legião de fãs desse modelo de evento com gente que desembarca na cidade para viver dias intensos de atualização, descobertas e, quem sabe, conquistar um investimento para sua startup. O que diferencia o SXSW é seu leque maior de abrangência, já que nasceu como festival de música em 1987 e de lá para cá incorporou as conferências de filmes, mídia e interatividade, com workshops, painéis e apresentações musicais.

Como vivemos um momento de transformações radicais impulsionadas pelo avanço da Inteligência Artificial (IA),tendo a evolução da IA generativa, que tem o ChatGPT como grande montra de algo que precisamos entender melhor, fui ouvir o que Greg Brockman, cofundador da OpenAI tinha a dizer sobre essa ferramenta revolucionária. Ao mesmo tempo em que esse avanço possui uma habilidade espantosa, ele oferece riscos que podem potencializar a distribuição de desinformação, por exemplo. Além disso, preocupa a substituição da mão-de-obra humana, ou melhor, a eliminação de postos de trabalho na área de criatividade e geração de notícias.

O executivo tentou explicar que eles trabalham por uma transformação positiva, que facilite e amplifique as atividades humanas, ao contrário de substituí-las. "Isso permitirá liberar essa mão-de-obra para trabalhos realmente importantes, como o gerenciamento de alto nível desses mesmos processos. Assim vamos amplificar aquilo que os humanos podem fazer". Ele falou bastante, mas não convenceu. Essa ferramenta continua uma incógnita que só nos trás uma certeza: sua evolução é um caminho sem volta.

Também estive na palestra de Josh D"Amaro, presidente de parques, experiências e produtos da Disney cuja apresentação parecia ter saído dos parques. No palco, em uma redoma de vidro sobre uma pequena mesa, lá estava a pequena Sininho, a voar com suas asas em movimentos frenéticos, a interagir com o público ao vivo. Sim, ela conversou com as pessoas e foi mais real do que eu conseguiria explicar, num modelo de interação que faz parte de um projeto da Disney de investir pesadamente na narrativa e tecnologia que gere felicidade ao seu público alvo.

E o que se observa em uma palestra da Disney? Que um storytelling bem produzido, apoiado pelo poder tecnológico, recebe o destaque que merece e confirma a eficácia de se fortalecer técnicas para se contar grandes histórias com credibilidade e gerar satisfação para a conversão. Exatamente por isso é que Hugh Forrest, vice-presidente e chefe de programação do SXSW ressaltou na abertura do evento: "Consuma conteúdo que não lhe seja tão familiar", você entra em uma palestra da Disney e sai dela com a confirmação de que contar grandes histórias funciona.

No terceiro dia tive outra agradável surpresa ao dedicar meu tempo à palestra de Esther Perel, psicoterapeuta, autora de livros e podcaster, que falou de que forma as fontes de tecnologia estão a impactar a nossa saúde e equilíbrio mental. Ela sustenta que o intenso envolvimento com a tecnologia, tende a interferir nas expectativas das nossas relações com outros seres humanos, já que a intimidade passa a importar pouco.

"Você passa o dia na frente de um computador. Quando chega a casa, não tem energia para mais nada, apenas para ver tevê. Aproveita e fica a interagir ao mesmo tempo para o smartphone. Para piorar, você olha para quem está ao seu lado e vê que a pessoa está a fazer exatamente a mesma coisa. Claro que a partir disso, não é difícil entender porque as pessoas estão fazendo menos sexo", provoca. E essa falta de interação retrata a incapacidade de se vivenciar uma situação ou um relacionamento que dependa de comunicação linear com uma pessoa próxima, seja do trabalho, de casa, dos estudos, de um relacionamento amoroso. É assim que a conexão via mensagens substitui o diálogo pessoal no que ela chama de "intimidade artificial".

Esse distanciamento do contacto humano está disfarçado por uma super conectividade, que é a solidão moderna. Já está provado que a mega exposição à conexão online interfere de maneira intensa nas habilidades sociais de homens, assim como geram ansiedade e depressão em mulheres.

"O problema é que uma hora podemos precisar do apoio de um amigo, mas ele não poderá atender porque estará a trocar mensagens em algum aplicativo de relacionamento ou a tentar conquistar curtidas em suas postagens nas redes sociais. Nesse momento teremos de recorrer aos contactos virtuais e quando só a tecnologia puder nos consolar, será sinal de que a humanidade adoeceu", conclui Perel.

Paulo Cardoso de Almeida - consultor e designer brasileiro

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