O sonho rock dos Capitão Fausto torna-se realidade

Depois de ter tocado nos maiores festivais nacionais, a banda lisboeta estreia-se em nome próprio no Coliseu dos Recreios
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Apesar da cada vez maior proliferação de concertos e festivais, há dogmas que se mantêm intactos no imaginário do pop rock português, como o momento da estreia, em nome próprio, no Coliseu dos Recreios. É quase como o teste final, que define se um artista pertence ou não à primeira divisão. Não é, no entanto, o caso dos Capitão Fausto, que só neste ano, agora quase findo, já por diversas vezes provaram merecer o lugar que há muito lhes parece destinado no Olimpo da música nacional. A estreia, em nome próprio, na mítica sala, é apenas mais um passo nesse sentido, com a certeza de que o melhor ainda está para vir.

"Atualmente há outros palcos igualmente assustadores e que também impõem um respeito enorme, especialmente o dos grandes festivais, onde estamos sempre numa situação de conquista. Já passámos por quase todos esses festivais e, portanto, este concerto apresenta-se como um desafio diferente, pelo tal peso histórico do Coliseu", reconhece Francisco Ferreira, o teclista da banda, numa conversa a três com o DN, que incluiu também o vocalista Tomás Wallenstein. Para este último, a principal diferença deste espetáculo é que as pessoas vão ao Coliseu de propósito para os ver. "Isso acarreta uma grande responsabilidade, mas também uma grande segurança. Mais do que temor, sentimos uma grande ansiedade e entusiasmo", sublinha.

O convite para se atirarem ao Coliseu surgiu algures depois do verão e apanhou-os de surpresa. "Deixou-nos um pouco apreensivos, mas é difícil dizer não a uma proposta destas", recorda Tomás. "Sempre imaginámos e desejámos chegar um dia ao Coliseu, mas sem pensarmos em quanto tempo demoraria a chegar lá", acrescenta Francisco. O concerto será assim o corolário de um ano de sonho para a banda, que em abril lançou o terceiro disco de originais, Capitão Fausto Têm os Dias Contados, que entrou diretamente para o primeiro lugar da tabela nacional.

Um sucesso também medido pelo airplay na rádio de temas como Amanhã Tou Melhor ou Morro na Praia, que acabou por ser uma surpresa para a banda, como reconhece Francisco: "É difícil pormo-nos de fora e perceber se o disco teve ou não sucesso, no modo como chegou às pessoas." Nada, ainda assim, que tire os pés da terra à banda. "Confesso que não me apercebo assim tanto desse suposto sucesso. Aquilo que me chega é pela quantidade de pessoas presentes nos nossos concertos. E pelo facto de ser uma realidade estarmos agora a fazer um Coliseu em nome próprio. Aí é que se vê que tudo isto está a resultar bem", diz Tomás.

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O músico recorda mesmo que, no início, nem sabiam bem qual o caminho a tomar. "Sabíamos que não queríamos repetir as fórmulas dos discos anteriores, mas não como o fazer. Fomos ensaiando e quando as coisas começaram a sair, percebemos que, se calhar, ficavam ali bem umas flautas e umas trompas. E foi isso que fizemos." E a partir daí foi fácil, como conta Francisco: "Não decidimos de antemão o caminho a tomar, mas como ouvimos e fazemos música sempre juntos, ele acaba por surgir naturalmente. Sem nos darmos conta, estamos sempre sintonizados nesses caminhos musicais que, subconscientemente, pretendemos tomar."

A arena do Coliseu

Além do reconhecimento do público, o álbum mereceu os maiores elogios da crítica, pelo modo com abriu os horizontes musicais da banda, muito para além do rock psicadélico dos dois primeiros registos, com um conjunto de canções pop perfeitas, embaladas por arranjos orquestrais e de instrumentos de sopro, que a banda pretende replicar agora no Coliseu. "Vamos ter convidados, para tornar o concerto mais próximo da sonoridade do disco", desvenda Tomás. "Ou até, talvez, um pouco mais além, porque vamos ter mais músicos a tocar connosco do que no disco." O concerto terá também um disposição diferente do habitual, com a banda a atuar no centro da sala do Coliseu, nesta noite transformada numa espécie de arena, enquanto os convidados vão estar no palco propriamente dito. "Vamos ter contrabaixo, trompa, trompete, clarinete, trompete, clarinete, oboé, duas flautas, percussões e guitarras acústicas. No fundo, vamos levar para palco o que fizemos em estúdio. O resultado do disco teve muito que ver com essa experiência de estar em estúdio, a dirigir outras pessoas a tocar a música tal como nós a entendemos. Foi muito enriquecedor para nós enquanto banda", explica Tomás.

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Já houve quem lhe chamasse maturidade, mas a banda desvaloriza a questão. "Estamos, sim, mais experientes. Entre o disco anterior e este foram mais dois anos de experiência, a tocar, a conhecer pessoas e a lidar com novos desafios", esclarece Francisco.

Longe vão cada vez mais os tempos em que os Capitão Fausto eram reduzidos ao rótulo de "Tame Impala portugueses", numa comparação que os próprios atribuem mais à contemporaneidade de ambas as bandas e não tanto à música. "Na altura do primeiro disco era algo que ouvíamos muito, mas neste momento nem sequer é uma referência. Mas se me estivessem a comparar a alguém de quem não gosto era pior", brinca Tomás.

Há, todavia, algo que não mudou: a amizade que une os cinco membros dos Capitão Fausto, compostos, além de Francisco e Tomás, por Domingos Coimbra (baixo), Salvador Sabra (baterista) e Manuel Palha (guitarra). Conheceram-se no Liceu Maria Amália, em Lisboa, há cerca de dez anos, e tornaram-se amigos por causa da música. Tomás e Francisco atropelam-se agora um ao outro, este sim é um assunto do qual claramente gostam de falar. "Temos uma grande sorte. Além de sermos amigos ainda partilhamos algo muito único e especial, que é a música", atira Francisco. "Somos tão amigos que tivemos de arranjar uma maneira de trabalharmos juntos", realça Tomás. Também por isso, concordam, este primeiro Coliseu tem ainda um sabor mais especial.

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