Entra no PS pela ala mais à esquerda. Foi autarca, depois Presidente da Repú- blica. Hoje é alto-representante das Nações Unida para a Aliança das Civilizações. O homem que teve a difícil arte de unir a esquerda na Câmara de Lisboa, incentiva agora o diálogo entre povos e culturas. E, como enviado especial do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, trabalha na erradicação da tuberculose..Muitas rebeldias marcam o percurso político de Jorge Sampaio. Rebeldia quando o gesto encerrava uma finalidade concreta e cívica: afronta à ditadura que amortalhava Portugal. Por isso, encontramos o jovem de cabelo ruivo e olhos claros - como peixes verdes, diria o poeta Eugénio de Andrade - à frente da Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa..A primeira prova de fogo do advogado surge na defesa de oposicionistas ao regime envolvidos na Revolta de Beja, ou do caso Capela do Rato. É candidato a deputado pela CDE (1969). Do seu escritório saem os documentos de protesto contra o exílio de Mário Soares..O seu nome, contudo, não aparece no grupo dos fundadores do partido que, no final dos anos oitenta, havia de liderar. O lugar de Sampaio era mais à esquerda. Tanto que, em 1976, o seu voto nas presidências foi para Otelo, um dos homens da Revolução de Abril..Dois anos após (mais) esta rebeldia, torna-se militante do PS. Eleito deputado, envolve-se nas guerras internas dos socialistas, apoia a recandidatura de Eanes; é relegado para a penumbra. No entanto, onze anos depois de ter assinado o cartão de militante, atinge o ponto mais alto no PS - numa altura em que o cavaquismo se cristaliza..Sampaio fez os primeiros estudos numa escola pública norte- -americana, Queen Elizabeth School, e, em Lisboa, nos liceus Pe- dro Nunes e Passos Manuel. Gosta de ouvir opiniões divergentes para tomar decisões. Esse princípio tê- -lo-á praticado quando dissolve o Parlamento e derruba o frágil e crispado Governo de Santana Lopes..Mas quem o julga indeciso engana-se. A candidatura a Belém, com considerável antecedência, apanha de surpresa alguns dirigentes do partido. De igual modo, em 1989, Sampaio surpreende: por "falta de generais socialistas" interessados a disputar a eleição para a Câmara de Lisboa, avança ele, o líder do partido. A direita perde a capital. Tenta a mudança para São Bento, mas o inquilino chama-se Cavaco Silva e permanece no poder. Os dois homens encontram-se, cinco anos mais tarde, na corrida a Belém. Sampaio ganha. Nessa campanha das presidenciais, o candidato apoiado pelo PS fez uma promessa. Hoje, 15 anos mais tarde, poderá ser lida como a sua divisa: "Vamos fazer da tolerância uma qualificação e da democracia uma exigência.".E não escondia, nesse tampo, uma grande ambição. Desejava ser o primeiro chefe do Estado eleito pelo povo português a deslocar-se a Timor-Leste. Tudo fez, no País e a nível internacional, para tornar realidade essa ambição, emotivamente apoiada pelos portugueses. A última deslocação oficial de Jorge Sampaio, refira-se, enquanto Presi- dente da República, é precisamente a Timor..O legado à democracia portuguesa de Jorge Sampaio - que pretendeu ser com o movimento Intervenção Socialista "o grilo da consciência do PS" - é significativo. Aqui ou noutra parte qualquer do mundo continua a fazer da "tolerância uma qualificação".