O renascimento de Scolari no regresso ao Brasil

Felipão ultrapassou o descrédito pós Mundial 2014 com um desafio de risco num Palmeiras em crise. Chegou em agosto com a equipa no sexto lugar e agora é líder do Brasileirão e está nas meias-finais da Taça Libertadores
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Uma das maiores desilusões da história do futebol brasileiro ficou conhecida como Mineiraço e teve como figura central Luiz Felipe Scolari. A seleção canarinha jogava em casa no Mundial 2014 e a conquista do título era mais do que um sonho para o povo - já todos viam o capitão Thiago Silva levantar a taça no Maracanã. Só que, nas meias-finais, deu-se o colapso no Estádio Mineirão, em Belo Horizonte.

A Alemanha destroçou o sonho de milhões de brasileiros com uma goleada de 7-1 que chocou o mundo do futebol. Foi a 8 de julho de 2014, dia em que praticamente foi decretado o fim do até então popular Felipão como treinador.

Scolari falhou e com estrondo. Seguiu-se uma passagem malsucedida pelo Grémio e três anos de exílio na China, no Guangzhou Evergrande, onde foi tricampeão. Em agosto de 2018 foi desafiado para regressar ao Palmeiras (estava em Portugal quando foi contactado e assinou contrato até 2022), clube onde deixou marca em 1999 quando conquistou a Taça Libertadores - ganhou ainda nas suas duas anteriores passagens pelo clube duas taças do Brasil (1998 e 2012) e uma extinta Taça Mercosul, em 1998. Era a oportunidade de, aos 69 anos, exorcizar o fantasma do Mineiraço e recuperar a áurea de vencedor que teve perante o povo brasileiro. Afinal foi ele que levou o Brasil a campeão do mundo em 2002.

Liderança e quebra de jejum

O Verdão, como é conhecido o clube de São Paulo, estava no sexto lugar, a oito pontos do líder Flamengo à 16.ª jornada e o objetivo da conquista do título parecia cada vez mais longínquo. Não melhorou na estreia de Scolari, com o empate a zero com o América Mineiro, em Belo Horizonte, cidade onde viveu o maior pesadelo da sua vida.

Só que a partir desse momento o Palmeiras arrancou para dez jogos em que só não venceu um - empate a 0-0 em Porto Alegre com o Internacional. E na última jornada assumiu a liderança do Brasileirão ao ir ao Morumbi vencer o dérbi com o São Paulo, quebrando um jejum de triunfos em casa do rival que durava há... 17 anos.

E isto numa semana em que venceu os chilenos do Colo-Colo, garantindo o apuramento do Palmeiras para as meias-finais da Taça Libertadores (a Liga dos Campeões da América do Sul), algo que também não acontecia há 17 anos. Aliás, Scolari especializou-se esta época em quebrar séries negativas, vencendo ainda no campo da Chapecoense, e em casa com o Cruzeiro e Corinthians, conquistas que há muito tempo o Verdão não conseguia.

Fim das críticas graças à família Scolari

Com o passar dos jogos, os adeptos deixaram de acusar os jogadores de falharem em alturas de maior pressão, algo que estará relacionado com aquilo que se convencionou chamar de Família Scolari. Aliás, um dos segredos do sucesso de Felipão, tanto na seleção brasileira como na portuguesa, foi esse conceito que tem a ver com a forma como o técnico fomenta a coesão do grupo em torno de uma causa.

Um dos sinais desse bom ambiente é o vídeo publicado nas redes sociais pelo próprio clube, com os festejos da vitória sobre o São Paulo, no balneário do Morumbi, onde o ex-benfiquista Deyverson foi protagonista, ao marcar o segundo golo da equipa.

Uma fortaleza na defesa

Além das nove vitórias em onze jogos, o Palmeiras tem um registo defensivo extraordinário, pois apenas sofreu dois golos no Brasileirão desde a chegada de Luiz Felipe Scolari, que em 68% dos jogos disputados em todas as competições não sofreu qualquer golo, ou seja, só sofreu golos em seis das 19 partidas. A fortaleza defensiva do Verdão no Campeonato Brasileiro ganha ainda mais destaque se tivermos em consideração que antes da chegada de Felipão a equipa tinha sofrido 16 golos em... 17 jogos.

No meio de todo este percurso feliz, há um dado curioso. O Palmeiras está há 13 jogos sem perder no Brasileirão. E a última vez que teve um percurso semelhante foi precisamente no ano em que se sagrou campeão, em 2016, quando a equipa somou 15 desafios sem qualquer derrota.

Numa altura em que faltam dez jornadas para terminar o campeonato, o Palmeiras tem três pontos de vantagem sobre o Internacional de Porto Alegre, mais quatro em relação ao Flamengo e São Paulo e está a cinco do Grémio, as equipas que se perfilam nesta altura como candidatas ao título. Scolari devolveu assim a esperança aos adeptos do clube paulista, que já sonham com o sexto troféu de campeão brasileiro, dois anos depois do último título.

Se este domingo o Palmeiras vencer o Grémio na Arena Palestra Itália, poderá dar um passo de gigante rumo ao título, pois tem possibilidades de ganhar terreno aos concorrentes diretos, pois Internacional e São Paulo defrontam-se e o Flamengo joga o dérbi com o Fluminense.

O sonho da Taça Libertadores

Mas o sonho do Verdão vai ainda mais longe, uma vez que na Taça Libertadores vai disputar nos próximos dias 25 de outubro e 1 de novembro o acesso à final frente, aos argentinos do Boca Juniors, isto depois de, sob o comando do atual treinador, ter deixado pelo caminho o Colo-Colo e os paraguaios do Cerro Porteño.

Alcançar o título de campeão das Américas é um desejo que está a crescer, afinal a única vez que o alcançou foi em 1999, com Felipão ao leme, altura em que nas meias-finais deixou pelo caminho o River Plate, o outro gigante da Argentina. Se festejar a sua terceira Taça Libertadores - ganhou outra ao serviço do Grémio -, Scolari ficará para a histórica como um dos técnicos que mais vezes conquistou este troféu, só suplantado pelo argentino Carlos Bianchi, com quatro.

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