"O que eu mais amo fazer na vida é ser palhaça"
Tânia Safaneta é palhaça de profissão. Tendencialmente pensa-se em homens mas a profissão tem muitas fãs femininas, incluindo em Portugal. A União de Palhaças de Portugal está a juntá-las e a criar uma rede de apoio para estas mulheres.
"Sempre que me perguntavam o que é que eu queria ser quando fosse grande, eu dizia palhaça", conta Tânia Safaneta. Este era o seu maior desejo, e com o qual foi sonhando até conseguir atingi-lo. Uma das suas maiores inspirações é Teresa Ricou, ou Teté, a mulher palhaça, e foi ao vê-la na televisão que percebeu que realmente queria seguir essa profissão.
Tânia sempre foi tímida e "talvez até aos meus 15 anos não falava ao pé de adultos", mas o dia em que começou a contar piadas e os colegas de escola riam com ela, foi quando se soltou e deixou alguma da timidez para trás. "Eu brincava, as pessoas ficavam felizes, e quanto mais brincava mais se riam e mais feliz eu estava". Dentro de si sempre soube que queria ser palhaça e desejou mais que tudo que pudesse acontecer.
Fez um curso de animação sociocultural na Escola Técnica Psicossocial de Lisboa, mas no fundo sempre soube que não era bem isso que queria fazer, queria seguir a parte artística. "De repente, por magia, um colega diz-me que tem um amigo palhaço que vai fazer um espetáculo no Brasil e que precisa de alguém para o substituir evento, se eu queria ir. Eu disse logo que sim", conta Tânia em entrevista ao DN. Outros convites começaram a surgir e o sonho de criança começou a tomar forma. Durante cerca de cinco anos esteve numa companhia de teatro de rua onde ganhou vários conhecimentos. Quando se tornou mãe teve de decidir se queria ser uma mãe presente ou não. "Eu já trabalhava um pouco enquanto palhaça e ser mãe fez com que eu me dedicasse 100% à parte da minha mulher palhaça. Fui fazendo eventos, dando aulas de expressão dramática a crianças e jovens, a fazer espetáculos, e assim passaram 22 anos desde a minha primeira atuação".
Reflete sobre a ideia de que se calhar nem toda a gente na sua vida compreendia a sua decisão de ser palhaça, mas quando começou a publicar vídeos nas redes sociais ou a aparecer na televisão, à sua volta começaram a perceber que o que fazia era realmente o seu trabalho e que lhe permitia sustentar-se.
Descreve a sua palhaça como tendo uma energia muito andrógena, uma figura que não é bem masculina nem feminina, mas cuja energia se reconhece que está ali. Trabalha muito com a espontaneidade e com o improviso. "A minha palhaça é uma mescla entre a energia do clown, do excêntrico e do bufão, e às vezes sai mais um do que outro, depende de como me sinto naquele dia". É esta mistura que faz com que os seus espetáculos sejam sempre diferentes, um conjunto de momentos absurdos como Tânia gosta de definir. Diz que a sua palhaça está a entrar numa fase adulta, pois ela cresce consigo.
"O palhaço, como costumo dizer, é um terapeuta da alma, e tem de ser uma pessoa muito inteligente para conseguir falar de coisas sérias com um toque de magia, despertar a gargalhada, sem que a pessoa perceba que é uma coisa séria", explica. Para Tânia, o palhaço não representa, pois tem de se ser verdadeiro consigo mesmo.
Em maio, Tânia viveu um dos seus maiores sonhos: atuar no Chapitô. O peso da responsabilidade deixou-a com os nervos á flor da pele, ainda mais com o seu maior ídolo no público. "Estares a fazer um espetáculo e saberes que a Teresa Ricou está ali e está a ver o teu espetáculo é mágico, não há palavras", recorda emocionada. A felicidade de ter o seu trabalho reconhecido pelos pares também não tem preço.
Tânia Safaneta pertence à União de Palhaças de Portugal (UPP), criada em 2020, altura em que foi feito um questionário para saber quantas mulheres palhaças existem em Portugal. Atualmente existem mais de 50 mulheres palhaças inscritas nesta união que quer dar voz e um espaço de afirmação a estas mulheres. A UPP prepara reuniões, workshops, palestras, formações e espetáculos para ajudar a manter viva a arte do palhaço, ainda mais no feminino.
Ser mulher palhaça é a oportunidade de falar de coisas do quotidiano da sociedade que encontram no seu íntimo e que saem para o mundo na linguagem universal que é o riso. "Falar de menstruação, de sexualidade, sobre ser mãe, do amor, dos nossos problemas na sociedade, o que nos aflige", enumera Tânia.
Estas mulheres não querem tomar o lugar de ninguém, querem ter o espaço para falar para mulheres mas também para os homens, mostrar que também estão ali e que têm tanto a oferecer. "Nós temos a nossa energia, somos mulheres, somos inteligentes, estamos aqui, queremos direitos iguais e que nos olhem da mesma maneira e sem preconceito".
Uma mulher que move a sua vida pelo sonho e cujo próximo grande objetivo é representar Portugal no circo Montecarlo como mulher palhaça.
sara.a.santos@dn.pt