"PSD não está contra a TSU mas contra o aumento do salário mínimo"

Em entrevista ao DN Tiago Barbosa Ribeiro, coordenador do PS para as questões do Trabalho e Segurança Social, rejeita que esta seja uma área problemática nas relações com os partidos à esquerda. Para o BE, o PCP e o PEV só guarda elogios. As críticas ficam para o PSD e a posição que assumiu na questão da TSU. E sobram algumas para Francisco Assis.
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BE e PCP não só se preparam para revogar a descida da TSU como rejeitam qualquer compensação aos patrões pela subida do salário mínimo. Que espaço sobra ao governo para honrar o compromisso com a concertação social?

O governo honrou o compromisso que assumiu com a concertação social, que está no programa do governo e nas posições conjuntas: o aumento do salário mínimo nacional está em vigor. E desenvolveu esforços para encontrar um acordo em sede de concertação. Neste momento, cabe ao Parlamento pronunciar-se. O PSD, aparentemente, irá chumbar a descida da TSU. Creio que não está tanto contra esta medida mas contra o aumento do salário mínimo.

O governo, sabendo a posição de BE e PCP, não devia ter falado com o PSD?

O governo não tem maioria absoluta, sabe disso, e governa com o apoio dos nossos aliados à esquerda...

Tem dias, esse apoio.

Não, o governo tem governado bem com os aliados à esquerda, nunca sentimos nenhuma quebra de lealdade e confiança. Muito pelo contrário, a relação tem sido sólida e estável e será para durar toda a legislatura. Na TSU, aquilo a que assistimos foi a uma completa pirueta, a uma cambalhota do PSD. O governo não pode saber com o que é que conta quando os partidos mudam sistematicamente de posição. O PSD não está a ser coerente, não credibiliza a sua posição e não credibiliza a vida democrática quando decide estar contra uma medida não por princípio político mas para criar, até de forma algo infantil, um problema ao PS. Com isso, o PSD afronta a sua história, vários dirigentes, vários históricos do PSD o têm dito.

"Se o governo não quer ter problemas, terá de ter atenção àquilo que propomos e, já agora, ao que os outros partidos pensam. (...) Ninguém é refém de ninguém." Quem o disse foi Arménio Carlos, líder da CGTP. É um aviso...

Não é um aviso, é a opinião do Arménio Carlos, que não me merece nenhuma discordância de fundo. Ninguém está refém de ninguém e, naturalmente, o trabalho de cada partido é apresentar as suas propostas e fazer-se ouvir.

A questão da TSU já serviu a um socialista - Francisco Assis - para defender eleições antecipadas. As dúvidas sobre o êxito desta solução governativa vêm de dentro do próprio PS...

Essa posição não é novidade vinda do Francisco Assis.

Falar em eleições é uma novidade.

A novidade é o Francisco Assis reconhecer o erro da sua avaliação política de há um ano. Sendo a primeira pessoa no país a pedir eleições antecipadas, estando o PS a liderar o governo, nessa declaração reconhece o mérito e o sucesso do governo ao longo deste ano. É uma declaração que se baseia no mais puro taticismo, eventualmente inebriado por alguns valores de sondagens: o Francisco Assis diz que o governo deve ter eleições para ter uma legitimidade reforçada. Devo dizer que o governo tem toda a legitimidade. Creio que Assis ainda não compreendeu que o governo vai mesmo durar quatro anos, com o apoio dos nossos aliados à esquerda e que o PS não é o centro de lado nenhum. O PS não é equidistante entre a sua esquerda e a sua direita. É um partido socialista e está a fazer uma política social-democrata na verdadeira aceção europeia.

É uma divergência entre a ala esquerda e a ala direita do PS?

Não. O PS é um partido de esquerda, ter uma ala direita é uma designação que eventualmente algumas pessoas farão sobre si próprias, que não acompanho.

Assis, em resposta ao secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, disse que "está mentalmente colonizado pelo BE". É uma acusação muitas vezes feita a uma jovem geração do PS, na qual se integra. O que é que responde a este tipo de críticas?

Há um conjunto de pessoas que não compreendem, continuam sem compreender, aquilo que se passou e se está a passar na social-democracia e nos socialistas europeus. A casa está a ruir e eles continuam sentados no sofá. Se para um socialista defender serviços públicos de qualidade, que não haja cortes de pensões a pagamento, defender o aumento do salário mínimo, se isto representa uma visão radical, totalitária ou extremista da sociedade... Isso diz mais da deriva ideológica dessas pessoas do que de quem procura recuperar os valores dos quais muitos socialistas se afastaram ao longo das últimas décadas, apoiando iniciativas liberais, apoiando a reconversão dos seus partidos em pouco mais do que fotocópias dos partidos da direita.

Recusa as acusações de que o PS se aproximou da esquerda dita radical?

Se vejo radicalismo é no atual PSD, aliás em linha com aquilo que foi a sua governação. Nós estamos a fazer um programa estruturalmente social-democrata e que nos fará sair do procedimento por défice excessivo - esse governo radical cumpre metas orçamentais, o que é extraordinário.

BE e PCP elegeram as questões laborais como prioritárias em 2017. São estes temas que vão fazer tremer o acordo à esquerda?

De forma alguma. Acompanho diretamente as áreas associadas às questões do trabalho e estamos a fazer um trabalho sério e leal. Há algumas medidas em que não estamos de acordo...

São várias...

São medidas que não estão nas posições conjuntas nem no programa de governo. Estas matérias têm de ser encaradas no contexto da legislatura. No ano passado recuperámos rendimentos do trabalho, por via direta e de forma indireta, com várias outras medidas. O que queremos agora ao longo de 2017 - e já exprimimos isso aos parceiros - é, em sede de concertação social e tendo por base o Livro Verde, apresentar um conjunto de medidas que possam ser alvo de um acordo o mais amplo possível.

Quando é que será conhecido o relatório da precariedade?

Existem duas dimensões. Há o relatório sobre a precariedade no Estado, que será conhecido no primeiro trimestre. Por outro lado, temos o grupo de trabalho de combate à precariedade, que tem que ver com políticas não associadas à administração pública, que vai produzir um conjunto de medidas... algumas já foram apresentadas, outras continuarão a ser. Não existe um momento em que digamos que temos cumpridas todas as nossa propostas em termos de precariedade.

Vai haver aumento da TSU para os contratos a prazo?

Temos de acabar com a normatividade dos contratos a prazo, que são contratos precários, não são contratos efetivos de trabalho - os trabalhadores estão três anos ou até, face às últimas alterações, seis anos num contrato a prazo, são dispensados com proteção mínima e depois começam um novo calvário contratual. Por outro lado, temos de encarar de forma muito determinada o que se passa no âmbito do trabalho temporário, que se transformou numa área muito crítica. Temos de perceber de que forma é que as empresas de trabalho temporário podem compatibilizar a sua ação, sempre que é necessária a existência de um posto de trabalho temporário, daquelas que recorrem de forma massiva a trabalhadores temporários para necessidades permanentes. O recurso sistemático a empresas de trabalho temporário, a formas de contratação atípicas, precárias, algumas delas subsidiadas, ainda que indiretamente, pelo Estado, não é aceitável. Essas matérias estão a ser alvo de uma análise profunda, ao longo deste ano teremos novidades.

Criando limitações a essas empresas no uso do trabalho temporário?

É uma possibilidade. Não se pode pôr tanto a questão na limitação - existem princípios de liberdade contratual e de exercício de determinadas atividades que não colocamos em causa. É aí que normalmente entra o "lá vêm os radicais de esquerda". Não. Ser trabalhador temporário de forma permanente é uma contradição. Isto não tem nada de radical, tem muito de centro-esquerda. Temos hoje uma geração - já temos mais do que uma, até - que está praticamente à margem do mercado de trabalho formal. A OCDE, que tem uma grande vinculação ideológica liberal, diz que há excessiva segmentação no mercado de trabalho em Portugal. O que é que querem dizer com isso? Que existe uma geração, instalada, que tem direitos inaceitáveis - como férias pagas, assistência na doença, uma reforma. E que há uma geração que está à margem disso e temos é de generalizar ao resto dos trabalhadores essa precarização. Esse não é o caminho, não aceitamos essa "uberização" da economia.

Causou polémica a expressão que usou em relação a Cavaco [chamou gangster ao então PR, depois pediu desculpa]. Tem melhor opinião de Marcelo?

Tem sido um bom Presidente. Tem tido um diálogo institucional irrepreensível, tem defendido os princípios constitucionais que jurou. E tem ajudado a criar um clima de distensão e de normalidade na vida democrática. Faço um balanço muito positivo.

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