O PS e o adversário externo
Quando Christine Lagarde anunciou o décimo aumento consecutivo das taxas de juro de referência, ficando a taxa de depósitos no valor mais elevado de sempre (4%), o líder parlamentar do PS Eurico Brilhante Dias acusou o PPE, que o CDS e o PSD integram, de apoiarem esta política. O disparate é livre, mas não havia necessidade.
O PS nunca lidou bem com a independência das instituições reguladoras e supervisoras. O historial de interferências e nomeações com o cartão como critério é longo, começando pelo Banco de Portugal, de que foi governador Vítor Constâncio entre 1985 a 1986 e 2000 a 2010, apesar de ter sido secretário-geral do partido, e atualmente Mário Centeno, saído diretamente do Ministério das Finanças para o mesmo cargo, sem preocupações relacionadas com questões de isenção e conflitos de interesse.
Não é à toa que assistimos tantas vezes no Banco de Portugal a narrativas justificativas de decisões e resultados de Governos socialistas, que acabaram em desastre, contrastando com posições críticas do desempenho de Governos de Centro-Direita, que devolveram a credibilidade a Portugal. Defender-se maior distanciamento dos responsáveis máximos de órgãos reguladores e supervisores não é anátema. Mandaria o bom senso que, independentemente do direito à vida partidária e de qualificações técnicas e profissionais, que não se discutem, períodos razoáveis de nojo e até a recusa de cargos fossem uma regra irrenunciável nos partidos e nos visados, para salvaguarda da imagem e confiança das instituições.
Recentemente, técnicos e economistas do Banco de Portugal manifestaram incómodo por, num documento oficial, Mário Centeno ter confundido o papel de governador, com o papel de governante, não se inibindo sequer do elogio pretérito pela passagem no Governo. "Nunca se viu nada assim, este é um texto de um político", disseram. Obviamente, reações desta natureza, só são possíveis pelas ligações e circunstâncias políticas das escolhas e têm profundo impacto institucional.
A independência do BCE e dos bancos centrais nacionais é uma imposição do Tratado de Funcionamento da União Europeia, em coerência com regras consolidadas das democracias ocidentais. Dela decorre que estes bancos e os membros dos respetivos órgãos de decisão não podem solicitar ou receber instruções das instituições, órgãos ou organismos da União Europeia, dos governos dos Estados-membros ou de qualquer outra entidade, do mesmo modo que as instituições, órgãos e organismos da União Europeia e governos dos Estados-membros se comprometem a respeitar o princípio. Só o PS é que assim não faz, porque, avaliada a realidade portuguesa, não dava jeito nenhum.
A esta luz se explica o anúncio recente da deslocação encenada e razoavelmente caricata de eurodeputados do PS a Frankfurt, levando na carteira a bala de prata que impediria Christine Lagarde de aumentar as taxas de juro, ou a sobredita declaração de Eurico Brilhante Dias. Instituições independentes do Largo do Rato, é coisa que não compreendem e contrariam quando possível.
Dito isto, seria bom que o PS e o Governo se concentrassem naquilo que depende de si, para ajudarem as famílias portuguesas em dificuldades, por causa do aumento das taxas de juro, aliviando-as de encargos escusados. Há muito que os aumentos dos juros com o crédito à habitação deveriam ser abatidos no IRS e os respetivos escalões atualizados pelo nível da inflação, como o CDS-PP defende. No entanto, há anos que o PS e o Governo não permitem uma coisa, nem outra e se ficam pelas atoardas contra a Oposição, enquanto o Estado amealha milhares de milhões de euros retirados às famílias e às empresas, beneficiando precisamente dessa inflação.
Quando as taxas de juro foram mantidas persistentemente baixas por decisão do BCE, o Governo, desde 2015, não adotou uma política responsável de redução da dívida pública, que hoje teria Portugal muito melhor preparado para enfrentar os aumentos iniciados em 2022. Por causa disso, a dívida pública cresceu 50 000 milhões de euros, o que só por si representa um aumento dramático dos juros pagos pelo Estado, que é como quem diz, pelos contribuintes. Serão mais de 7000 milhões de euros em 2023.
O PS e o Governo encontram outra vez, no elemento externo, as justificações para o seu próprio fracasso. Na Saúde, a culpa era dos privados, na Educação foi dos contratos de associação, na Habitação é do alojamento local e dos proprietários e agora, em relação ao custo de vida, passou a ser do BCE.
Impressiona que alguém ainda vá nesta conversa.
Líder do CDS-PP