O pós-fascista italiano que luta pela sua sobrevivência política
A imprensa italiana foi quase unânime: o confronto que Gian-franco Fini e Silvio Berlusconi protagonizaram no dia 22, em plena reunião da coligação de centro-direita Povo da Liberdade, não tem precedentes e deixa adivinhar que, mais cedo ou mais tarde, os italianos estarão de volta às urnas.
Fini, presidente da câmara dos Deputados, e Berlusconi, primeiro-ministro de Itália, tiveram uma dura e nervosa troca verbal perante os delegados da formação política que lidera o país em conjunto com o partido de extrema-direita Liga Norte. "Queres ser livre nas tuas posições políticas, então não tens outra coisa a fazer a não ser abandonar a presidência da câmara dos Deputados", lançou Berlusconi a Fini, que rejeitou de imediato a hipótese. "Vai-te embora se quiseres", disse o chefe do Governo, gitando as mãos. "O que é que dizes? Queres expulsar-me?", perguntou-lhe, da tribuna, o companheiro de partido.
Ex-líder da formação pós-fascista Aliança Nacional, ex-vice-primeiro-ministro, ex-ministro dos Ne- gócios Estrangeiros, entre 2001 e 2006, Fini tornou-se amigo de Berlusconi quando concorreu à presidência da câmara de Roma em 1993. Foi derrotado por Francesco Rutelli, mas, no ano seguinte, Berlusconi disse sobre ele: "Votaria Fini caso votasse em Roma."
Fini, de 58 anos, é oriundo de uma família de direita e o seu primeiro nome foi-lhe dado em homenagem a um primo que fora morto pelos partisans, combatentes anti-fascismo, após a libertação do Norte de Itália a 25 de Abril de 1945. Aos 16 anos, já andava em confrontos com activistas comunistas por causa da projecção do filme Boinas Ver- des, de John Wayne, tendo sido nessa altura que ingressou o Mo- vimento Social Italiano (MSI). Foi na organização juvenil desse partido neofascista que iniciou a sua vida política.
Formado em Pedagogia pela Universidade de La Sapienza, de Roma, Fini conheceu a primeira mulher, Daniela Di Sotto, em 1980, quando ela ainda estava casada com Sergio Mariani, um amigo e companheiro de partido. Teve uma filha com ela e, em 2007, apenas cinco meses depois do divórcio, a sua relação com Elisabetta Tulliani, uma advogada muito mais nova do que ele, veio a público. No final desse ano teve uma segunda filha com a nova companheira.
Eleito deputado pela primeira vez, em 1983, chegou a secretário--geral do MSI quatro anos mais tarde, depois de suceder no cargo a Giorgio Almirante. No final dos anos 90, Fini começou a afastar o movimento da ideologia neofascista e criou depois a Aliança Nacional, com alguns elementos da democracia cristã. E recentemente chegou a demarcar-se do elogio que um dia fez ao ditador fascista, Benito Mussolini: "Foi o maior estadista italiano do século XX. O fascismo tem uma tradição de honestidade, rectidão e boa governação." O seu partido foi membro da coligação de centro-direita de Berlusconi, Casa das Liberdades, em 1994 e em 2001. Há dois anos, Il Cavaliere decretou o fim da Força Itália e o nascimento do Povo da Liberdade, coligação à qual acabaria por juntar-se a formação de Fini.
A vitória nas eleições antecipadas após a demissão do Governo de Romano Prodi, em 2008, levou Fini à presidência da câmara dos Deputados italianos. Mas com a subida da Liga Norte, de Umberto Bossi, nas recentes eleições regionais, Berlusconi está muito mais nas mãos dos parceiros de coligação secessionistas e xenófobos do que nas de Fini. Este não tem gostado de ficar para segundo plano e tem procurado afirmar-se dentro da coligação, escolhendo, para isso, a via da denúncia de uma falsa unidade à volta do líder, que existe dentro da mesma.