O político para quem tudo é possível
Nicolas Sarkozy é um sobrevivente, um político com rara capacidade para resistir à adversidade, o homem das longas travessias do deserto. Em 1999, no ponto mais baixo da carreira, chegou a pensar em sair da política. Nessa altura, ninguém adivinharia que este filho de um imigrante húngaro, emotivo e ambicioso, chegaria a lutar pela Presidência e com possibilidade de a conquistar.
"Tudo é possível", dizia uma das recentes frases emblemáticas do seu partido, a União para um Movimento Popular (UMP), o mais importante da direita. A frase mostra o líder: resoluto, imparável, poço de energia, conservador até à medula, parecido com a América que tanto admira. E, depois, há o seu lado ambicioso e populista. Para alguns, também de traidor, características sem as quais nunca teria chegado tão alto na impiedosa política francesa.
A meta da presidência está definida desde o primeiro dia em que se apaixonou pelo poder. Segundo a lenda, aprendeu com um seu avô materno. Em 1968, quando os estudantes andavam pelas barricadas da esquerda, Sarkozy já era de direita. Mas só se lançou na política na década de 70, com uma primeira e emblemática traição em 1983, ao disputar a autarquia de Neuilly-sur-Seine a um dos seus mentores, Charles Pasqua. Venceu Sar- kozy, claro.
Traição
A conquista de Neuilly não foi apenas uma vitória política, mas uma escada para a ascensão social. Sarkozy não é propriamente humilde (o seu pai, com quem nunca se deu bem, tem origens aristocráticas), mas o contacto com empresários e jornalistas influentes deu-lhe um empurrão suplementar para sair da classe média.
A partir deste ponto, a sua carreira foi fulgurante. Deputado, depois ministro do governo de Edouard Balladur, mas sobretudo vedeta da direita francesa. O dia do julgamento chegou em 1995. Sarkozy falhou de forma catastrófica uma manobra. Fiel ao seu mentor de então, Balladur, Sarkozy não apoiou Jacques Chirac, líder do seu partido (então denominado RPR), o que lhe valeu insultos e novas acusações de traição. A opção por Balladur foi quase um desastre fatal: Sarkozy queria ser primeiro-ministro, mas Chirac venceu as eleições e nunca lhe perdoou. A travessia do deserto seria muito difícil.
Recuperação
Foi o chefe do RPR, Philippe Séguin, quem em 1997 recuperou o jovem promissor, mas convém sublinhar que Sarkozy nunca reconquistou a confiança da facção chiraquiana, que o detesta e que ele teve de anular, nos últimos anos. Em 1999, a direita estatelou-se nas eleições europeias. Sarkozy ficou com a culpa e foi forçado a demitir-se da chefia do RPR. Era talvez a hora de sair, mas o ambicioso político fez uma escolha diferente esperar a sua vez e juntar-se ao grupo de Chirac logo que viesse uma crise.
A oportunidade não se fez esperar. Em 2002, Sarkozy assumiu o Interior, o que não deixava de ser um presente envenenado, dada a instabilidade social. No entanto, depressa se tornou o mais mediático ministro de sempre, com fama de eficaz e pragmático. Depois, na Economia, pôs as finanças públicas em ordem. Em 2004, tomou de assalto o partido do poder (entretanto renomeado UMP). E ainda saiu incólume do maior fiasco dos anos Chirac: o chumbo do Tratado Constitucional europeu, em Maio de 2005.
Duro
Em Outubro e Novembro desse ano, regressado ao Int erior, Sarkozy enfrentou os motins dos subúrbios, reforçando a sua imagem de duro, apesar de erros que ainda lhe podem custar caro. Sobreviveu a um golpe sujo (o caso Clearstream) e logrou anular o seu rival mais perigoso, o primeiro-ministro Dominique de Vil- lepin, apoiado por Chirac. Até agora, esta foi uma carreira imparável, mas Sarkozy sabe que o grande teste do poder ainda não chegou: a segunda volta das eleições presidenciais é só a 6 de Maio.