O papel da Biotecnologia na alimentação do futuro: Uma revolução sustentável e personalizada

Alimentar uma população mundial em crescimento é um grande desafio, mas a resposta reside numa abordagem já conhecida, agora elevada a um novo patamar, em que a biotecnologia poderá ter um papel fundamental.

A biotecnologia e a alimentação são dois temas historicamente interligados desde os primórdios da civilização moderna, com a produção de pão, vinho, cerveja e laticínios através de processos de fermentação. A fermentação de precisão eleva esta técnica tradicional a um nível totalmente novo, oferecendo benefícios que ultrapassam o que é possível com métodos convencionais de produção alimentar.

A fermentação de precisão recorre ao uso de microrganismos, como bactérias, leveduras e fungos, em processos altamente controlados para produzir ingredientes valiosos, como proteínas, vitaminas, enzimas e sabores. Estes microrganismos podem ser selecionados com base nas suas capacidades naturais e também podem ser otimizados através da sua modificação genética, funcionando como fábricas celulares para a produção biológica, sustentável e escalável de moléculas de interesse, permitindo o acesso a ingredientes que, de outra forma, só se encontrariam em quantidades diminutas na natureza.

A fermentação de precisão oferece diversos benefícios cruciais para o futuro da alimentação, contribuindo para reduzir significativamente a pegada ecológica da produção de ingredientes, exigindo menos recursos hídricos, terra e energia em comparação com ingredientes de origem animal ou obtidos de plantas. Ao permitir a produção de alimentos de forma eficiente, a fermentação de precisão cultiva microrganismos em ambientes controlados, otimizando o seu crescimento e a produção dos ingredientes de interesse. A manipulação genética de microrganismos permite ainda a produção de ingredientes específicos de forma pura, abrindo caminho para a criação de novos produtos com formulações personalizadas.

Apesar de a fermentação de precisão apresentar inúmeras oportunidades e vantagens, também suscita considerações éticas e regulatórias. É importante comunicar de forma clara a segurança deste tipo de abordagens, como a manipulação genética de microrganismos, demonstrando à sociedade que existe hoje um vasto conhecimento científico e que a sua segurança está claramente garantida, tanto para o meio ambiente como para os consumidores.

Portugal conta com empresas altamente inovadoras na vanguarda desta revolução alimentar, explorando novas fronteiras na aplicação da biotecnologia, como a SilicoLife, na produção sustentável de suplementos, a Chrysea Labs, com intervenções nutricionais de precisão para aumento da longevidade, a Carbocode, na produção de esfingolípidos essenciais para o nosso desenvolvimento, a MicroHarvest, focada na produção de proteína por fermentação, ou a A4F no uso de microalgas.

A fermentação de precisão está destinada a desempenhar um papel fundamental no futuro da alimentação. Combinando tradição e inovação, esta abordagem oferece soluções para muitos dos desafios que enfrentamos atualmente na produção alimentar. À medida que a investigação e o desenvolvimento de novos processos avançam, veremos cada vez mais produtos alimentares incorporando ingredientes obtidos por fermentação de precisão, oferecendo não apenas uma alimentação sustentável, mas também de forma natural e escalável.

CEO da empresa de biotecnologia SilicoLife e presidente da P-BIO, Associação Portuguesa de Bioindústria