O Orçamento do Estado e Equidade Territorial na Saúde
A proposta do Orçamento do Estado é um momento único para se determinar, pela via da democracia representativa, as grandes opções em matéria financeira e orçamental, desde logo para definir quais as prioridades estratégicas para o país no próximo ano. A discussão gerada entre o Governo e a Assembleia da República com enorme repercussão no espaço público reflete essas tendências, bem como o custo de oportunidade social de umas escolhas em detrimento de outras. Trata-se frequentemente de uma tentativa de quadratura do círculo, dada a escassez relativa de recursos face a necessidades crescentes, reais ou apenas percebidas.
A saúde é o setor onde mais se faz notar estas carências. E por vários motivos. Primeiro, porque não é possível corresponder a todas as necessidades da população, das mais importantes às menos fundamentais. Segundo, a mediatização de alguns focos de descontentamento no Serviço Nacional de Saúde gera a perceção, errada por vezes, de que existem carências generalizadas da população a nível do acesso e qualidade da saúde. Finalmente, porque a discussão em bloco, na Assembleia da República, compara bens que, aos olhos da maioria da população, não são comparáveis. A saúde é sempre mais valorizada do que a construção de novas estradas ou os apoios concedidos à banca, por exemplo.
Existem linhas gerais na proposta do Orçamento do Estado para a saúde que merecem um amplo consenso. Por exemplo, uma aposta clara na prevenção e promoção da saúde que, não produzindo benefícios no imediato, tem o potencial de melhorar profundamente a qualidade de vida das pessoas, sobretudo das mais idosas.
Mas o que se exige também na discussão pública em torno do Orçamento do Estado para 2019 é que este seja justo e equitativo. Por exemplo em termos territoriais. E, no plano do investimento, dificilmente se entende que as cinco novas unidades hospitalares previstas para 2019 sejam todas no Sul do País (Évora, Lisboa Oriental, Seixal e Sintra) e na Região Autónoma da Madeira. Apesar da necessidade de modernizar o parque hospitalar nestas zonas do país, e sendo óbvio que hoje a verdadeira distinção territorial não é norte-sul mas sim interior-litoral, pode perguntar-se se não existem zonas carenciadas em infraestruturas hospitalares nas regiões centro e norte do país. Pelo que seria importante uma justificação adequada para estas opções de modo a que se percebesse se a coesão territorial é, ou não, uma simples miragem.
Professor Catedrático da Universidade do Porto