O Mediterrâneo que nos une

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O Mediterrâneo sempre foi um mar de encontro de civilizações, uma reunião de culturas onde se integram também diferentes religiões. Foi assim na Antiguidade, Idade Média, Modernidade, até aos dias de hoje. Do ponto de vista europeu, sobretudo a Sul, tudo o que se passa no conjunto da bacia mediterrânica afeta a sua estabilidade.

Com exceção do momento após a derrota de Cartago, circunstância em que o mar Mediterrâneo se transformou num "lago romano", observam-se disputas permanentes. Território de sucessivas cruzadas, fricções com o Império Otomano, pirataria berbere, investidas pela supremacia do mar nos grandes conflitos do Séc. XX, citando algumas das dinâmicas para obtenção ou preservação de poder, podemos afirmar que a volubilidade nessa área é "idiossincrática". Senão vejamos, os focos de pressão atuais sem resolução aparente - a divisão do Chipre; o conflito israelo-palestiniano; Síria, Líbia, a recente tensão entre Argélia e Marrocos, e, tão presente nas nossas vidas, a crise migratória às portas da Europa num desfiar de tragédias humanas.

Contudo, no reverso, a região mediterrânica é igualmente lugar de encontros. Berço de civilizações, afinidades culturais, geográficas, climáticas e paisagísticas, e obviamente de convivências religiosas.

Podemos falar de clima, de dieta mediterrânica, de um Deus comum, apesar das diferentes designações e aparentes antagonismos segundo cada uma das três religiões monoteístas que coabitam nesta linha de costa e no que se expande além dela.

Importa afastar a ideia de margens separadas por mar, de "costas voltadas", e fomentar a perspetiva de "casa comum". Não será fácil considerando a inconstância permanente, latente ou visível, que nos leva correntemente ao prisma redutor de divisão.

No caminho desta construção, releva o papel da sociedade civil, e organizações não governamentais capazes de pugnar por relações de confiança e abolição de preconceitos. Hábeis para convergir na resolução de problemas comuns, tão prementes, nomeadamente, efeitos decorrentes das alterações climáticas ou regulamentação de políticas de migração que permitam fluxos equilibrados para quem necessita acolhimento e para quem acolhe.

Acresce o papel das instituições parlamentares, como representantes institucionais da sociedade no respeito pela diversidade e interesses dos Povos. Nesse sentido, saliento as organizações interparlamentares.

Destaco a APM - Assembleia Parlamentar do Mediterrâneo, que reúne os Parlamentos nacionais em torno da bacia mediterrânica, permitindo diálogos profícuos e simplificados entre povos, gerando resultados difíceis de obter, bastas vezes, a nível governamental, palco onde se podem promover relações de força politicamente mais intransigentes.

Todos beneficiaríamos com o desenvolvimento desta vertente parlamentar e da sua diplomacia informal na resolução de problemas. Ao invés de se ver nessa prática rivalidades. Como é exemplo, assinalar duas datas para celebrar o Dia do Mediterrâneo. O dia 21 de março, definido formalmente desde 2008, pela APM, e, ignorado, recentemente, pela UpM - União para o Mediterrâneo, ao definir outro dia para o mesmo efeito.

Erguer uma "casa comum" implica união de esforços e diálogo.

Presidente emérito da APM
Deputado à Assembleia da República

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