Frederico Varandas: "Desde pequenino que sofro de uma forma estúpida pelo Sporting"

Aos 4 anos, Frederico Varandas já passeava entre os trampolins da ginástica leonina. Aos 38 pode ser presidente do clube, depois de uma missão no Afeganistão como médico-militar e de ter tratado da saúde aos leões como diretor clínico. Foi o primeiro a avançar e vai a votos no dia 8 de setembro com a Lista D.
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Frederico Varandas marcou encontro com o DN no restaurante O Magriço. Ali, de costas para o Estádio José Alvalade e com o busto do fundador (Francisco Stromp) a olhar de soslaio, o candidato à presidência do Sporting explicou que passou "grande parte da infância" no restaurante que ficou conhecido por ser o local de refeições dos miúdos da formação, que viviam debaixo das bancadas do antigo estádio - Cristiano Ronaldo incluído.

"Não o escolhi por causa do Ronaldo, embora fosse muito bonito que, quando ele decidir acabar a carreira, o fizesse no Sporting, mas sim porque eu e o meu irmão andávamos na ginástica do Sporting e o horário dos treinos dele eram diferentes dos meus. Então, ele ia para a ginástica e eu ficava no Magriço com a minha mãe, fazia aqui os trabalhos de casa e tudo, embora eu quisesse sempre ir ver os treinos da equipa principal. Por vezes escapulia-me para lá... Fui expulso muitas vezes, não podia estar lá", contou entre sorrisos o médico.

O jovem e determinado candidato sabe ao que vai e o caminho que quer seguir para chegar ao cargo de presidente, depois de ter tratado da saúde aos leões nos últimos sete anos.

Entrou no clube pela mão de Godinho Lopes em 2011, mas foi com Bruno de Carvalho que esteve mais tempo. Não foge ao assunto quando confrontado com isso - e os adversários não lhe têm dado descanso nesse aspeto -, mas ele prefere olhar para os acontecimentos de maio (invasão à Academia e agressões a jogadores) como o clique que era preciso para bater com a porta e avançar como alternativa: "Acho que é uma enorme mais-valia para mim e para os sócios. Sou uma pessoa que conhece o Sporting, conheço a estrutura como a minha mão."

A ideia de ser candidato "começou a germinar no final do ano passado", quando decidiu "não continuar como diretor clínico" por já não se identificar com o projeto. "No final da época, foram 15 dias surreais e resolvi assumir responsabilidades pelas pessoas que amam o Sporting como eu. O meu avô, se fosse vivo, estaria numa depressão terrível ao ver o que se passou naqueles dias...", disse ao DN o médico, contando depois que foi o avô que o registou como sócio em 1980, quando tinha menos de um ano. Mais um motivo para "enfrentar esta missão".

Ir a votos foi uma decisão solitária

A decisão de ir a votos foi uma decisão "solitária". E depois de se atirar para a frente da batalha, não fosse ele militar (capitão do Exército, condecorado com a Comenda da Ordem do Infante D. Henrique pela missão no Afeganistão), ainda ouviu alguns conselhos. E não gostou do que ouviu: "Os conselhos eram sempre para não avançar... O meu pai ficou em choque, tal como a minha mãe. Reagiram mal... Tal como reagiram quando fui destacado para uma missão no Afeganistão."

Afinal, a família sabia, sempre soube, de um amor maior: "Tive de pôr os interesses do Sporting à frente dos meus. Eu não consigo separar o Sporting da minha vida. Desde pequenino que sofro de uma forma estúpida. Nos clássicos e nos dérbis em dias de jogo nem comia, com aquela ansiedade do jogo. Sempre vibrei muito, e apesar de ter mais maturidade a parte da paixão mantém-se." Hoje ainda é assim? "Confesso que sim, nos últimos tempos vivia consumido e isso já afetava a minha vida como diretor clínico. Quando perdia um jogo só me apetecia ficar sozinho, fechado em casa, não me apetecia ver ninguém", confessou o candidato da Lista D.

E é pela família que teme se for eleito: "Logo quando assumi, que me demiti e era alternativa a Bruno de Carvalho, foi muito pesado o ambiente. Há pessoas que jogam muito baixo, com ofensas. Tenho pena, porque faz sofrer quem está ao meu lado. A mim não me afeta, não tenho medo dessas ameaças. Preocupa-me é que afetem quem está ao meu lado, mas é inevitável."

A verdade é que foi sendo empurrado para a ideia de ser presidente: "Não lhe vou mentir. Nos últimos três anos como médico, várias pessoas me diziam que devia ser mais do que médico. O Leonardo Jardim e o Jorge Jesus, por exemplo, diziam-me: 'O futuro do Sporting passa por si. Não pode ser só médico, tem competência, liderança, é respeitado e percebe o jogo e o futebol, alguém com coragem e elevação'."

Ele foi ouvindo, mas não era um desejo pessoal ser presidente. Só quando viu "que o clube estava a caminhar para um beco sem saída, na lama como nunca esteve", decidiu fazer algo para isso mudar. E foi então que se propôs como alternativa. Apanhou muitos sócios e adeptos, mas também amigos e gente conhecida de surpresa. Afinal, o que motivaria um médico a querer abandonar a medicina para ser presidente? Ele respondeu assim: "Estou cansado deste discurso de ganhar três campeonatos em 40 anos, não gosto deste conformismo que já se apoderou de nós sportinguistas... O discurso de 'O Sporting é assim...' Não, não é! O Sporting é um clube com mais de três milhões de adeptos, 170 mil sócios. Se nós não temos capacidade para ganhar, quem tem?"

"Vou ter saudades de ser médico"

Enquanto esteve em Alvalade como médico sofreu a cada golpe suturado e cada lesão muscular sofrida por um jogador. Isso vai deixar saudades: "São 11 anos a viver na relva, o treino, o jogo... vou ter saudades, assim como tive saudades de coisas de quando era militar. A vida é um processo dinâmico, de crescimento. A saudade faz parte da vida. Adorei o que fiz, foram sete anos espetaculares como médico do clube."

Frederico Varandas hesita mas não treme quando questionado se já se perdeu um médico. "Sei que era um diretor clínico competente, mas sei que vou ser mais útil ao Sporting como presidente. E já tenho fechado um diretor clínico espetacular, até melhor do que eu. Até aí o Sporting fica a ganhar."

A grande ideia, o sonho e Peseiro...

Agora espera ter "a oportunidade de pôr em prática todo o conhecimento de futebol" e dessa forma potenciar a marca Sporting. "Não podemos ter um clube com três milhões de adeptos muito leais e fiéis ao Sporting e faturar apenas 3,9 milhões de euros em merchandising. O FC Porto 5,4 e o Benfica perto de 10... Não podemos ter modalidades que nem patrocínio na camisola têm, é ridículo. Temos de crescer, aumentar as receitas..." Também por isso defende que "ser presidente do clube e da SAD é a maneira mais segura de defender os interesses do clube na SAD e não perder a maioria do capital".

O seu projeto de sonho "é conseguir resultados desportivos": "Temos de ser sérios e frios na análise, se a bola bate na trave não há finanças que resistam. Temos de ser mais competentes no futebol. Não podemos meter a cabeça na areia. Três campeonatos em 40 anos é pouco para um clube com a dimensão do Sporting. É aí que eu me vou debruçar. Não quero que mais uma geração fique 17 anos sem vencer como eu. O meu grande projeto e revolucionário é um Sporting que ganha regularmente, que lute sempre pelos títulos. Eu e a minha equipa sabemos como o conseguir e que, com todo o respeito, os outros não têm."

Já disse que quer o Sporting a ganhar e com Peseiro até final da época. Isso agora pode até "parecer muito sensato", já que a equipa está em 1.º lugar do campeonato, mas ele garante que sempre pensou assim: "Quando Peseiro foi apresentado não gerou uma onda de entusiasmo entre os sportinguistas, mas quando me perguntaram o que achava da escolha, disse que era um bom treinador, uma boa escolha de Sousa Cintra."

Para Frederico Varandas, "um filho de uma família que já vai na terceira geração de sportinguistas", o facto de haver seis candidatos "não significa um clube dividido", mas se há algo de que tem a certeza é que quer "um Sporting sem croquetes ou sportingados", "apenas um Sporting de sportinguistas, ponto final."

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