Neste tempo de aproximação ao Natal e a mais um novo ano, é provavelmente bom que consigamos ver o bem que vive à nossa volta, especialmente quando o que é menos bom ou mesmo mau parece sempre tão urgente, tão violento, tão limitador..Uma das coisas objetivamente boas é a amizade. Tenho, felizmente, um conjunto de bons amigos. Uns mais antigos, outros mais recentes - todos eles e elas recortados do quotidiano e apostos, no seu esplendor, na minha memória ou no meu presente. E um deles, provavelmente o mais impressionante, é o Manel..Manel, aliás, nem deveria ser um nome próprio. Deveria ser simplesmente um substantivo comum, algo como ser manel. Ser manel seria, assim, sinónimo de ser generoso, íntegro, inteligente sem ser vaidoso, bem-humorado, atento. E ser tudo isto na sua mais plena e inteira expressão, sem nunca se reivindicar ou abusar das suas qualidades, que ele próprio, sendo como é, deve reconhecer em si, mas que nunca é capaz de exibir como vitórias sobre alguém ou como especiais perfeições à custa das imperfeições de todos nós, os demais. Já que ser manel implica nunca fazer sofrer um outro, nunca aceitar a derrota ou o desespero dos outros e estar sempre pronto a segurar alguém que precise dessa mão, desse abraço ou dessa palavra..Claro que o Manel tem as suas manelices, que normalmente são curiosas, mas consistentes. Uma delas, por exemplo, é a de sempre que convida amigos para jantar em sua casa, uma casa sempre aberta aos amigos e a quem eles queiram levar, gostar de lavar a louça à mão, depois dos repastos sempre perfeitos. Outra das suas manelices é a de, sendo um enorme conhecedor de música, fazer sempre questão em que os seus amigos ponham a música de que gostam a tocar, seja ela boa, sofrível ou simplesmente má. Porque, para o Manel, um sorriso genuíno de um amigo é a única exigência de que não prescinde e pela qual batalhará até ao fim..O Manel tem ainda outras características. Sendo o homem mais culto que conheço, faz questão de nunca abusar dessa circunstância. E não só vive nessa gramática de inteireza discreta, como tudo de bom o que conhece quer partilhar com todos os demais. Oferece livros e filmes, de forma ininterrupta, só pelo gosto de partilhar a beleza ou as promessas de tranquilidade que leu ou viu antes de todos nós. E, depois, o Manel também não sabe fazer mal a ninguém. Tal como não sabe fazer nada mal, seja dar uma opinião jurídica, dar uma aula ou preparar um set como DJ....A única dificuldade que o Manel suscita é a vontade que cria nos seus amigos de nunca se separarem dele. Afinal, parece que quando estamos juntos é sempre Natal.. Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa