"O iberismo é um edifício muito grande e não pretendemos construí-lo todo agora"
Paulo Gonçalves tem 47 anos, nenhuma experiência política, e é trabalhador por conta de outrem na Covilhã. Casimiro Sánchez Calderón é 30 anos mais velho, esteve mais de quatro décadas no PSOE que ajudou a fundar, e foi presidente da câmara de Puertollano, em Ciudad Real. A defesa do iberismo une-os há vários anos. Este fim de semana, tornaram oficial essa união com a assinatura da Declaração de Lisboa que marca a aliança entre o português Movimento Partido Ibérico e o espanhol Íber. O objetivo é consciencializar para os benefícios de uma união entre Portugal, Espanha e Andorra.
"O iberismo é um edifício muito grande e não pretendemos construí-lo todo agora. Nós estamos a trabalhar nas bases do edifício, artesanalmente, manualmente, porque as grandes máquinas estão nas mãos dos governos, que são quem pode fazer isto de forma mais rápida. Nós estamos a tentar consciencializar para a importância da união", contou Calderón ao DN. "Para já, em termos gerais, falamos da união dos interesses de Portugal, Espanha e Andorra. Mas queremos ir mais além, queremos também que funcione do ponto de vista dos países de expressão portuguesa e castelhana, queríamos que houvesse uma irmandade", indicou por seu lado Gonçalves.
A ideia de uma união ibérica não é de hoje e, do lado português, um dos seus grandes defensores foi o Nobel da Literatura José Saramago (que morreu em 2010). O que a torna mais urgente agora, segundo Calderón, é a globalização e a noção de que só juntos teremos a força para conseguir fazer ouvir as nossas vozes. "O conceito de nação mudou. Antes era um conjunto de sentimentos, de tradições, de culturas, de idioma. Agora uma nação é uma unidade de sobrevivência coletiva. A globalização mudou o mundo completamente e a tecnologia ainda o vai mudar mais", alertou.
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Mas e qual é o objetivo do Partido Iberista, que por enquanto está apenas legalizado em Espanha? "Rechaçamos a Integração de Portugal em Espanha e defendemos que a construção da Ibéria seja obra de Portugal, Espanha e Andorra; tendo por base os princípios da igualdade, da otimização de recursos e das vantagens mútuas", lê-se na Declaração de Lisboa.
"Em causa não está uma união política entre os dois países, como tem sido defendido, mas uma confederação de países ibéricos", disse Gonçalves. A ideia passa, por exemplo, por uma partilha de ministérios, em que houvesse um ministro espanhol e um português para cada pasta - à exceção da Defesa, Justiça e Interior - para permitir que "tudo seja pensado, planeado, projetado e executado do ponto de vista ibérico". Com benefícios para todos.
"O que está em cima da mesa hoje não é uma Ibéria, mas imaginemos que o movimento chegava ao poder, em Portugal e Espanha, conseguíamos que em termos constitucionais houvesse mudanças para permitir esta tal partilha de ministérios, e em dada altura as pessoas de um lado e do outro diziam que isto não chega. Se as pessoas pedirem mais, podemos subir um passo", acrescenta o português. Estudos feitos na Universidade de Salamanca mostraram, em 2011, revelou que 39,8% dos inquiridos espanhóis e 46,1% dos portugueses eram a favor de uma união entre os dois países.
"As eleições são o que nos preocupa menos. O que nos preocupa é trabalhar entre Portugal e Espanha para ver como podemos unir os serviços públicos, ver como podemos ter uma segurança social mais forte, unir o espaço radioelétrico, criar organismos comuns de regulação do mercado... até coisas tão simples como o horário. Não faz sentido que não tenhamos a mesma hora. Mas passa também por um banco central ibérico", indicou Calderón.
Gonçalves defende que este teria que preparar um estudo sobre os benefícios do euro e a eventualidade de uma moeda ibérica poder ser melhor. Isto sem pôr em causa a União Europeia. "Nós somos europeístas natos, o que queremos é tornar mais forte a Europa com nações cada vez mais equilibradas. A Europa não é possível se as nações que as formam são tão díspares", explicou Calderón. "A força na Europa está a tender para Leste e nós não estamos contra ninguém, mas também merecemos a nossa quota parte", indicou por seu lado o português.
Numa altura em que a Catalunha quer a independência de Espanha e o Reino Unido quer sair da União Europeia, a ideia de uma Ibéria comum parece em contrassenso. "Os tempos da fragmentação e da rutura, tanto do ser humano como das sociedades e das nações, tem que terminar", disse Calderón, explicando que "os separatismos não fazem sentido no mundo global".