O (grande) desafio da política

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O meu nome é Marta Prates e sou Presidente de Câmara de um pequeno concelho do interior, no Alentejo. Fui psicóloga durante 20 anos, e sempre adorei a minha profissão, que agora não exerço por via da eleição. Cheguei à política pela oposição, uma porta muito digna, nem sempre respeitada, sobretudo num concelho como o meu, onde desde as primeiras eleições livres depois do 25 de abril, nunca tinha existido alternância política - há 45 anos que o mesmo partido governava a minha terra, Reguengos de Monsaraz. Não se sabia o que era alternância, um princípio basilar do regime democrático. Começa a perceber-se aqui o tamanho do desafio.

Contudo, isto foi assim só até ao dia 26 de setembro de 2021, últimas autárquicas, em com uma grande equipa de campanha, centenas de apoiantes e milhares de votantes, fizemos história num concelho do Alentejo. História. Sem modéstia. Ganhamos a Câmara Municipal, 45 anos depois. Presidente: uma mulher, que veio da oposição. Foi obra. Sob o lema "Mais pelas Pessoas", a social-democracia conquistou um terreno muito difícil, numa batalha histórica, tida para muitos como impossível, e por alguns como um sonho que nunca podia morrer. Não morreu. 2021 foi o ano. E a vontade, essa, está mais viva do que nunca.

E fazer política todos os dias? É duro. Fazer política séria para as pessoas, todos os dias, é duro. Porque lidamos com as expetativas de quem nos escrutina, e bem, a cada minuto. Porque, na maioria das vezes, as pessoas têm razão, e os problemas não conhecem horas de expediente. A disponibilidade é permanente. Deixei de andar na rua sem estar a ver pedras da calçada para pôr no lugar, folhas para limpar. E o sentimento de um político que trabalha para as pessoas deve ser de responsabilidade. Por todos. Não só pelos que votaram nele, mas por todos. No dia a seguir às eleições passei a ser a Presidente de todos os reguenguenses, porque só um projeto conjunto, onde chamamos todos a participar, pode fazer a nossa terra dar certo.

Agora governo um concelho com menos de 10 000 habitantes, e temos os problemas transversais a todo o país, ainda mais agravados pela fatídica interioridade, este conceito devastador que em Portugal é um rótulo na testa.

Debatemo-nos com a fuga dos jovens para as cidades, com a falta de médicos, com a cultura lá longe, com orçamentos mínimos e despesas máximas. Mas também é verdade que não baixamos os braços.
Costumo dizer, sem nenhum pudor ou sombra de dúvida, que ser político não é para todos. Quem assume um cargo público de decisor, e sente a responsabilidade de trabalhar para fazer melhor pelas pessoas, sofre todos os dias em que não é capaz de avançar, seja porque razão for, e há muitas razões, há muitas entropias. Então na política local, com as contribuições do Estado a encolher, em concelhos onde é difícil ter receitas que compensem despesas, em que as famílias não se fixam, sucumbindo à atração das grandes cidades, então na política local, assumir funções de decisor é um ato de coragem. Não coragem de direita ou de esquerda, só coragem.

Contudo, a política como instrumento ao serviço das pessoas, é muito bonita. É construir e agir. Lutar, a sério. É o tal sonho, que não morre.

Tenho ainda a certeza de que um dos segredos da boa governação, passa pela aproximação dos cidadãos às decisões, que tantas vezes têm a ver diretamente com as suas próprias vidas. Por isso, e por aqui, em Reguengos de Monsaraz, um pequeno concelho do interior alentejano, incentivamos os munícipes a uma cidadania ativa. Onde todos sejamos construtores do mesmo sonho. O nosso.


Presidente da Câmara Municipal de Reguengos de Monsaraz

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