O futuro da saúde está no digital
Esta será a história a escrever na saúde nos próximos anos: a saúde digital irá mover-se desde uma curiosidade, passando por uma ferramenta de investigação, até ser uma corrente imparável e atual, aceite como ferramenta clínica: são tempos entusiasmantes.
Na verdade, existem tecnologias que já estão atualmente disponíveis e a ser utilizadas de forma cada vez mais generalizada - aplicações, dispositivos, ferramentas de autodiagnóstico - e que têm o potencial de reforçar a relação médico-doente e melhorar os outcomes em saúde.
Estes dispositivos médicos são cada vez mais necessários e estão a sofrer uma transformação acelerada: quer sejam óculos, que podem conter componentes de realidade virtual, lentes de contacto, que podem incluir um sensor de glicose ou próteses de anca ou de joelho inteligentes. Esta é aliás a chamada geração de próteses 4.0 e não, não são ideias previstas para o futuro. Esta é a realidade. Constata-se mesmo, num trend que é recente, uma cada vez maior abertura por parte dos médicos para considerarem, na abordagem aos seus doentes, a informação obtida através de dispositivos.
Numa sociedade cada vez mais envelhecida, em que as necessidades em saúde parecem infindáveis e os recursos cada vez mais limitados, é mesmo uma ironia que se esteja a perceber que a via para reduzir o desperdício e melhorar os cuidados de saúde de biliões de pessoas não seja, na verdade, a abordagem tradicional e direta à sua saúde, mas sim uma questão de marketing, de informação para a saúde e de transformação em termos de modelo de cuidados, com recurso à tecnologia.
Por exemplo, daqui a uma década, o registo médico eletrónico será secundário no armazenamento do histórico médico de um paciente. A maioria das informações será mantida de forma segura no telemóvel ou na cloud, com o paciente a desempenhar um papel ativo na recolha, filtragem e partilha dos dados. Antevê-se que grande parte das consultas ocorra à distância, utilizando componentes de realidade virtual. Seja numa clínica em Portugal, ou num hospital nos Estados Unidos, qualquer médico terá, desta forma, acesso ao histórico de um paciente. Reduzem-se os erros, mas também, por exemplo, a duplicação de exames que hoje verificamos pela não interligação dos diferentes sistemas de saúde, mesmo dentro do próprio país.
A forma como se faz Medicina também está a mudar e é preciso preparar os médicos para a mudança. É preciso educar desde cedo, desde a fase pré-
graduada. Isto porque os médicos podem, por vezes, hesitar em abraçar a tecnologia quando esta é imposta. No entanto, quando solicitados a liderar e a moldar o futuro, estarão prontos para abraçar a mudança. É necessário perceber que é a capacidade de adaptação, mais do que a força ou a inteligência, que define a evolução. Não é a espécie mais forte que irá evoluir, nem a mais inteligente, mas sim a que melhor responde à mudança.
Estamos assim num Mundo novo, já é possível utilizar por exemplo um ecógrafo portátil em vez de um estetoscópio para auscultar os sons cardíacos. O paciente pode visualizar em tempo real a sua válvula cardíaca e perceber, com ajuda do médico, a força do músculo cardíaco. Esta nova dinâmica na relação médico-paciente representa uma mudança significativa.
No entanto, importa salientar que por mais tecnológicos que estejam os cuidados de saúde, é necessário continuar a compreender quais as preocupações dos doentes, quais os seus receios, que objetivos pretendem ver atingidos. É necessário desenvolver, ainda mais, as competências sociais dos médicos. A empatia é fundamental quando se lida com doentes. A medicina caminha para a tecnologia, e todos ganhamos com isso, mas é fundamental que a Pessoa seja, sempre, o centro de todas as preocupações.
Professor da NOVA Medical School, regente da Unidade Curricular "Medicina 4.0"