O ex-Hospital Militar de Belém (HMB), a Defesa Biológica e o Combate às Pandemias

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É do conhecimento público que o primeiro-ministro, Dr. António Costa, tenha recebido, recentemente, uma carta subscrita por cerca de uma centena de personalidades civis e militares, onde se apelava para que se pudesse diligenciar no sentido da reactivação do ex- HMB, e da plena recuperação das suas capacidades e competências clínicas, no sentido do reforço da saúde pública nacional e do bem-estar dos Portugueses.

O documento terá recolhido o apoio de militares dos três Ramos das Forças Armadas (FA), com destaque para o ex-PR, General Ramalho Eanes e para vários ex-Chefes Militares, bem como para relevantes figuras eclesiásticas, casos do Bispo do Porto e do ex-Bispo das FA, D. Januário Torgal Ferreira, a par de outras personalidades de reconhecido mérito, oriundas de diversas áreas da vida nacional.

Na carta sublinhava-se a singularidade daquela estrutura hospitalar, que tinha uma capacidade de internamento da ordem das 200 camas, distribuídas pelos Serviços de Infecciologia, Pneumologia e Oncologia, a que acresciam os Serviços de Fisiopatologia Respiratória e Cinesiterapia, a par de um Serviço de Reabilitação Cardíaca, detendo as necessárias infra estruturas e capacidades para o diagnóstico, tratamento, reabilitação e acompanhamento clínico daquelas patologias, e destacando-se, ainda, os espaços de pressão negativa e uma Unidade de Cuidados Intensivos, com a adequada capacidade de ventilo terapia.

Referia-se que o ex-HMB, com uma estrutura hospitalar vocacionada para as doenças infecciosas e com instalações dotadas de pressão negativa, área onde foi pioneiro, se tinha evidenciado como uma Unidade de Saúde Militar que, funcionando em apoio complementar de diversos Sistemas de Saúde e na prestação de apoio sanitário aos PALOP, estava preparado para o diagnóstico e tratamento das doenças de etiologia microbiana, viral e parasitária, entre outras.

No citado documento, os seus signatários chamavam a atenção para a presente situação de saúde pública, agravada pelas reconhecidas dificuldades do SNS, que, aliadas à ocorrência mais do que provável de novas pandemias nas áreas da infecciologia e da virologia, aconselharia que aquela ex Unidade Hospitalar pudesse ser objecto de completa reabilitação, com a inerente recuperação das respectivas valências e capacidades, podendo constituir-se, desta forma, como uma reserva estratégica do País, na primeira linha de combate aquelas ameaças, e como prestação suplementar do SNS e de outros Sistemas de Saúde.

Apontavam, igualmente, para a elevada probabilidade do aparecimento de novos agentes infecciosos e da ocorrência de novos surtos epidémicos, bem como para o ressurgimento de doenças consideradas em vias de extinção, a par do aumento da resistência bacteriana e de outros agentes patogénicos, obrigando, para o efeito, a adopção de terapêuticas alternativas e de estratégias adequadas, factores que deveriam constituir-se, no seu entender, como determinantes para a reabilitação de uma unidade hospitalar daquela natureza.

Referiam, ainda, que o actual ambiente estratégico obrigava a que devessem ser, igualmente, equacionadas potenciais ameaças como o terrorismo e, em particular, o bioterrorismo, assumindo, neste contexto, a defesa biológica um particular destaque para o qual o ADN de um HMB reactivado, integrando a estrutura hospitalar do Sistema de Saúde Militar, estaria naturalmente vocacionado, em estreita ligação com os Laboratórios de Defesa Biológica e de Toxicologia do Exército e com o Laboratório Militar de Produtos Químicos e Farmacêuticos.

Entretanto, em Abril do corrente ano, em plena crise de saúde pública derivada da pandemia COVID 19, e sete anos após a extinção do HMB, por iniciativa do XIX governo constitucional, o Ministério da Defesa Nacional (MDN) levou a cabo um conjunto de obras naquela ex-estrutura hospitalar, com vista ao levantamento de um denominado Centro de Apoio para doentes infectados com aquela patologia, não requerendo, no entanto, tratamento hospitalar diferenciado, tendo o governo investido, para o efeito e de acordo com a comunicação social da altura, cerca de 750 000 euros, tendo sido a obra inaugurada pelo Primeiro Ministro no final daquele mês, pese embora, segundo consta, o não preenchimento integral das condições para o seu pleno funcionamento.

Por outro lado, recentemente, o Ministro da Defesa Nacional, em sede de Comissão Parlamentar de Defesa Nacional (CPDN) teria afirmado que, no futuro, as instalações do ex-HMB, muito provavelmente, se destinariam à posse da Santa Casa da Misericórdia, para utilização em parceria com a Câmara Municipal de Lisboa, de acordo com suposto protocolo firmado, anteriormente, com o próprio MDN.

Neste sentido, importaria colocar, então, algumas questões para um esclarecimento, que legitimamente se impõe:

Porque é que, apesar do avultado montante já despendido por conta dos cofres públicos, o designado Centro de Apoio não recebeu, até à data, um único doente e os médicos e enfermeiros destacados para o respectivo enquadramento clínico foram, entretanto, dispensados, ficando as instalações sem qualquer utilidade funcional aparente?

Qual é o protocolo referido pelo Ministro da Defesa na CPDN, e quais as condições e contrapartidas assinaladas no mesmo?

Como se pode justificar o investimento público efectuado, quando as instalações, como tudo parece indicar, se destinarão a ser cedidas a uma entidade privada?

Perante este quadro de interrogações, seria extremamente importante que o Senhor Primeiro Ministro pudesse responder ao apelo feito pelos signatários da Carta que lhe foi endereçada, não somente pelo respeito que lhe deverão merecer as respectivas intenções, mas, também, como uma oportunidade para poder esclarecer, de forma inequívoca, as questões, agora, levantadas.

Tenente General

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