O erro histórico do Ajax

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urante muitos anos, a frase de Albert Camus, o futebol é inteligência em movimento, foi a única referência "culta" disponível para aqueles que, como eu, gostavam de futebol e tinham de enfrentar o sorriso complacente dos intelectuais e artistas perante tamanha falha no requinte espiritual. Segue um exercício sobre a questão de Camus.

Onde falha a "inteligência" da equipa do FC Porto? A substituição que Co Adriaanse efectuou no jogo com o Braga mostra um erro de análise. O problema não residia na defesa mas no meio- -campo. A equipa não sabe reorganizar-se e redistribuir as posições dos jogadores de forma a aumentar as opções de passe. A melhor maneira de ver isso é observar, não o jogador que tem a bola, mas as movimentações dos outros, a forma como se colocam em posições adequadas para receberem a bola. Estando a ganhar, continua a jogar com passes de risco, estando sempre iminente a perda da bola. Por isso é que perdeu ou empatou jogos que estavam ganhos. Adriaanse não treina ou treina mal essa mudança de táctica, não prevê ou não decide quando se deve passar a jogar dessa maneira. Não se trata de prescindir do ataque. Nessas circunstâncias, o contra-ataque é frequentemente fatal para os adversários. As equipas de Mourinho e de Pedroto são lições desse tipo de "inteligência em movimento".

Estava a ver o jogo com o meu amigo e compositor radical holandês Jan van de Putte e após o golo do FC Porto disse-lhe "Agora, vai começar a parte difícil. O FC Porto só sabe jogar ao ataque". Ele disse-me: "That's the historical mistake of Ajax". A jogada do golo do Braga começa com duas ou três trocas de bola no meio-campo do FC Porto, um passe atrasado para Pepe e o habitual longo para a frente. Ainda a bola ia no ar e disse-lhe: "You see? Isto é um disparate, porque as probabilidades de perder a bola são grandes". Aconteceu isso, o Braga partiu para o ataque e penalty. Claro que o jogador estava fora-de-jogo, que aconteceram duas jogadas semelhantes na área do Braga e nada foi assinalado. Bruno Paixão igual a si próprio. Mas esse é o problema antiquíssimo do FC Porto. Não lhe basta jogar melhor que os outros. Se jogar tão bem ou tão mal como os outros, não ganha campeonatos. Tem de jogar muito melhor. No primeiro campeonato da era Pedroto jogava dez vezes melhor que o Benfica e ganhou com um ponto de avanço. A equipa não sabe "congelar a bola". Congelar significa a bola é nossa, nós é que jogamos e vocês têm de a conquistar. Agora o FC Porto encarrega-se de a dar rapidamente ao adversário. É frequente ver que os passes não são dirigidos de forma segura, mas para um ponto situado a meio caminho entre o colega e um adversário. O que provoca mais um choque, mais uma disputa, mais uma perda. Ao manter-se em qualquer circunstância uma vontade enlouquecida de atacar, os riscos são grandes como temos visto.

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