O erotismo e a magia do Crazy Horse estão pela primeira vez em Portugal
De certa forma, Becky Pimlico despiu-se da sua identidade. Isso faz parte do encanto da dança de cabaret, explica, usar antes esta personagem de femme fatale em vez da sua. A nudez é algo que não a perturba, nem a do corpo, nem a do nome.Cada actuação a solo é feita para a dançarina e esse é o único traço que fica da pessoa de quem não saberemos o nome verdadeiro: Becky é londrina, estudou ballet, tem nariz aquilino e sorriso deslumbrante. Está há três anos com a companhia Crazy Horse, actuou em Paris e Las Vegas.
Agora, em Lisboa (cidade onde se come frango com piri-piri), a bailarina inglesa faz parte de um grupo de 12 artistas do Crazy Horse de Paris que estará a partir de terça-feira e todas as noites (menos segundas) no Casino de Lisboa, numa representação difícil de classificar. Não é exactamente cabaret, mas também não é teatro. Becky, aliás, consegue a melhor definição dos 70 minutos de sensualidade, nudez, música e luz: "É um espectáculo sobre a beleza feminina", diz, com simplicidade, revelando os esplendorosos olhos.
O ensaio geral decorre no auditório do Casino de Lisboa, para o olhar atento da Imprensa. Três números curtos, todos com repetição, para que os fotógrafos possam tirar imagens de vários ângulos. O tema constante do erotismo é encenado em diversas formas, com a única constante dos corpos perfeitos.
A perfeição não é apenas ilusão teatral. Para conseguirem manter a beleza dos corpos é preciso ter cuidado com a dieta, não ter defeitos de nascença ou cicatrizes cirúrgicas. Em Crazy Horse não existe manipulação, aumentos de seios. "É difícil para o nosso corpo", admite Becky, que come peixe e evita carne.
O corpo idealizado tem um único preço: a carreira das dançarinas é geralmente curta. Algumas, só podem ficar na companhia dois ou três anos; em certos casos, mantêm-se sete ou oito. Mas a beleza é fugaz.
Como é efémera a beleza do número Adagio, que a companhia representará nos espectáculos de Lisboa. No palco, onde deslizam as bailarinas, enquanto se ouve uma música suave, os corpos despidos são banhados por luz e parecem vestir-se de mil formas, numa voluptuosa coreografia conseguida pela pura ilusão.
Os corpos são distintos, apesar das mulheres serem todas mais ou menos da mesma altura e compleição. Mesmo com nomes artísticos, percebe-se que as bailarinas têm a sua própria personalidade. Becky explica que faz um solo, um tango, e que o interpreta de maneira "flirty" (palavra difícil de traduzir, que é algo atrevida, mas sem excesso). No fundo, Crazy Horse é flirty, brinca com o imaginário masculino, tem um lado de classe e erotismo meigo. Do que vimos, bastante bom gosto.
A produtora UAU, que trouxe este espectáculo a Lisboa, diz que tentou garantir a mesma qualidade de Paris. E o responsável da Estoril-Sol, Assis Ferreira, explica que o Crazy Horse foi programado no Casino de Lisboa "sem complexos". Trata-se de "erotismo controlado", explica, "tratado de uma forma única e vanguardista". Como diria Becky Pimlico, a beleza no feminino, e no seu esplendor.