O DIA EM QUE MARTE ATACOU

Publicado a
Atualizado a

Ficção. Há precisamente 70 anos uma emissão de rádio gerou o terror nos Estados Unidos. Orson Welles e uma equipa de actores e técnicos encenavam uma adaptação radiofónica do romance de H.G. Wells 'A Guerra dos Mundos'. O carácter realista da recriação do texto na rádio levou muitos a pensar que o que escutavam era a reportagem, em directo, de uma invasão marciana. E rapidamente estalou o pânico

Emissão de rádio que assustou a América faz hoje 70 anos

30 de Outubro de 1938. Aos microfones de uma estação de rádio com projecção nacional, Orson Welles e uma equipa de actores e técnicos de sonoplastia apresentavam uma adaptação radiofónica do romance de H.G. Wells A Guerra dos Mundos, que relata uma inesperada e violenta invasão da Terra pelos marcianos. Era apenas uma emissão de teatro radiofónico, integrada no programa Mercury Theatre On The Air. Mas acabou por lançar o terror entre muitos dos ouvintes. Houve quem fugisse da área onde se julgava estar a acontecer a "invasão" marciana. Chegaram relatos de pessoas que sentiam o cheiro de gases venenosos ou avistavam luzes nos céus. Histórias de pânico que, no dia seguinte, surgiram nas páginas dos jornais.

O programa, com perto de uma hora de duração, começava com uma apresentação do romance de H.G. Wells. Explicava-se que a acção seria projectada em 1939. E então a emissão continuava com um boletim meteorológico e música pela orquestra da CBS. A ficção entra em cena quando surge um primeiro noticiário, que encena uma interrupção da emissão, e dá conta de estranhas explosões observadas em Marte. Orson Welles, veste então a pele de um astrónomo. E chegam mais notícias. Alarmantes desta vez, anunciando a queda de um meteorito no estado de Nova Jérsia. Um repórter, em directo, descreve a cena. E é ele quem, pouco depois, dá conta do primeiro ataque marciano.

No livro de H.G. Wells, originalmente publicado em 1898 (ver texto nestas páginas), a "invasão" marciana tem lugar em bucólico cenário britânico, e decorre algures, nos finais do século XIX. A adaptação apresentada na rádio, na qual colaborou o próprio Orson Welles, propunha contudo uma mudança de tempo e de local da acção, encenando o primeiro ataque perto de uma pequena cidade no estado de Nova Jérsia, nos Estados Unidos... Ou seja, bem mais "perto" dos ouvintes.

A adaptação emitida pela rádio fugia aos cânones habituais do chamado teatro radiofónico. Foi pensada num modelo próximo do que hoje o cinema por vezes propõe como "mockumentary", ou seja, usando linguagens do jornalismo para apresentar uma ficção. A Guerra dos Mundos, nesse dia de 1938, chegou aos aparelhos de rádio dos ouvintes que acompanhavam a emissão sob a forma de noticiários de ficção e simulações de reportagens em directo. Na verdade tudo acontecia num estúdio em Nova Iorque. Mas a capacidade em criar a ilusão pelo som fez o resto.

Naturalmente o clima de ansiedade e medo surgiu apenas junto dos que não acompanharam o programa desde os primeiros minutos. Programa sem interrupção para publicidade, o Mercury Theatre On The Air criou junto de muitos a ilusão de se estar perante o acompanhamento de um acontecimento em curso.

Correm várias versões sobre os factos daquele dia. Há histórias de geólogos que terão partido em busca do "meteorito" caído em Nova Jérsia, assim como relatos da chegada de populares à pequena cidade onde a invasão teria começado. Conta-se mesmo que alguém terá disparado contra um reservatório de água de um agricultor, tomando-o por uma "nave" marciana.

No final da emissão, aos ouvintes foi lembrado que tinham assistido a uma obra de ficção. Mas o pânico entretanto gerado motivou telefonemas (para a CBS e polícia) e, depois, queixas que, acabaram sem castigo. A estação comprometeu-se contudo a não usar mais o anuncio de interrupção de emissão para fins de ficção.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt