O colombiano Sergio Díaz-Granados, de 51 anos, esteve pela primeira vez em Portugal em 2011, era então ministro do Comércio, Indústria e Turismo durante o consulado de Juan Manuel Santos. Agora a trabalhar em Washington, no Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), regressou a Lisboa para participar na conferência Colômbia-Portugal, uma organização do Instituto para a Promoção da América Latina e Caraíbas (IPDAL) e da Embaixada da Colômbia em Portugal. Durante a sua alocução, o advogado e antigo deputado destacou o facto de a América Latina ser uma das regiões que menos têm crescido, mas o seu país é uma exceção, com crescimento previsto do PIB de 3% neste ano e uma das taxas de juros mais baixas da sua história..Os protestos na Colômbia explicam-se pelo contágio da crise na Venezuela, pela onda migratória causada, ou é mais profundo do que isso? Cada país tem uma história diferente, embora visto de fora possa parecer um contínuo. Não creio que os protestos recentes na Colômbia sejam uma reação em cadeia, obedecem simplesmente às tensões naturais de uma democracia, na qual uma parte da população quer mudar o país e apresentar as suas propostas. Quanto à onda migratória, esta não está no centro da discussão nem o governo considera ser esse um motivo, nem os manifestantes. O comité que convocou a greve não menciona essa questão. Há, sim, um grande desafio quer do governo central quer dos governos locais em acolher a população migrante. É um desafio orçamental e fiscal e que tem consequências nas infraestruturas sociais, na saúde, na educação e na habitação. Mas as pessoas estão mais focadas em aspirar a uma melhoria dos salários e na educação, que são as razões invocadas para a greve..Não há um denominador comum nos protestos do Equador, Chile, Bolívia e Colômbia? Podemos sempre fazer comparações ou encontrar denominadores comuns. No Chile, há uma classe média importante e que aspira a viver melhor. No Equador, a mesma coisa, embora aqui a causa tenha sido o aumento dos preços dos combustíveis. No caso da Colômbia, há uma população jovem no país com grandes expectativas e quer que o governo invista mais em educação, quando este ano é aquele em que o país mais investiu em educação na sua história, mais do que na defesa. Não creio que os protestos de um país estejam a alimentar o outro, são origens distintas e com níveis de adesão diferentes. No Chile, manifestaram-se mais de um milhão de pessoas, na Colômbia uns 300 mil. Uma sondagem mostra que 80% dos colombianos estão contra a greve..Um problema que não afeta só a Colômbia, mas toda a América Latina, é a violência e o crime organizado. O México perdeu a guerra que declarou ao narcotráfico. Concorda com uma nova abordagem de toda a região? Sim. Segundo um estudo do BID, o crime organizado custa à América Latina 6% do PIB - estamos a falar de quase 750 mil milhões de dólares, é quase o dobro da economia colombiana o que custa o crime na América Latina. E é uma das regiões mais violentas do mundo, as dez cidades mais violentas estão na região. É um grande desafio. Quando se pensa em desenvolvimento, o crime é o problema mais generalizado da América Latina. O BID tem uma divisão que trabalha a segurança para ajudar o governo a melhorar as políticas públicas para prevenir o crime. O crime não só é organizado mas também é transnacional, pela natureza ilícita não tem fronteiras e aproveitam para tirar proveito de todas as deficiências de coordenação entre Estados para fazerem o seu trabalho. É um fenómeno que vem crescendo desde os anos 60. A produção de cocaína está na América Latina, mas o consumo está no norte e na Europa. Só se pode resolver de forma coordenada entre governos e com grande sofisticação..O que pode fazer o Banco Interamericano de Desenvolvimento pelo desenvolvimento e pela estabilidade da Colômbia? O banco é uma instituição com 60 anos que tem o lema "melhorar vidas", é o maior financiador de desenvolvimento da América Latina e da Colômbia. Neste ano vai fazer operações de 1,1 mil milhões de dólares de empréstimos à Colômbia, que vão para áreas das infraestruturas e do social. Na parte social, há três componente essenciais em que quer trabalhar. A primeira é com as mulheres, a iniciativa paridade de género. Uma sociedade como a colombiana, em que 51% da população são mulheres, para poder crescer tem de incorporá-las plenamente no mercado laboral, mas tem de pagar o mesmo que aos homens. A outra componente importante é a das pessoas com deficiência. Na Colômbia, 12% da população tem algum tipo de deficiência, congénita, por acidentes ou pela violência no país. Em relação a este grupo em particular, o banco está a trabalhar com o governo para proporcionar mais oportunidades económicas. Outro grupo importante são os jovens, 26% da população tem menos de 30 anos. É um país com muita gente jovem e que necessita não só de apoios, formação e orientação, mas também acesso ao mercado laboral. Os jovens são o segmento da população mais afetado pelo desemprego. A América Latina em geral tem um problema estrutural de desemprego e aqui entra em ação o BID para empréstimos em investimento em infraestruturas. Estamos a financiar a primeira linha de metro de Bogotá, o contrato foi assinado na semana passada e creio que vai beneficiar todo o país. O banco é muito importante na Colômbia quer pelo apoio social quer pelo apoio económico..Mencionou o desemprego. Qual é o maior problema: o desemprego ou a desigualdade social? Se olharmos a curto prazo, o desemprego é um desafio importante e a médio, longo prazo as reformas têm de ser feitas para reduzir as desigualdades. O desemprego está em níveis de 8% e no último ano subiu por várias razões: contração da economia mundial, quebra nas trocas comerciais e uma onda migratória no país. O objetivo do presidente [Iván] Duque e do seu governo é procurar mais equidade, está no programa do governo..Em que setores podem a Colômbia e Portugal estreitar relações? Os dois países não têm só uma relação de amizade histórica. Podemos ser sócios no desenvolvimento na próxima década. A Colômbia vai aumentar a sua população em dez milhões de habitantes. Nos últimos dois anos, entraram dois milhões de venezuelanos que fazem hoje parte da democracia colombiana e na próxima década vão nascer ou entrar sete milhões. Entre estas pessoas, 82% vão viver em cidades. É um desafio ao desenvolvimento das infraestruturas, de setores como a habitação, energias renováveis, saneamento básico, água canalizada. É um grande desafio que Portugal resolveu nos últimos 20 anos. Os dois países complementam-se muito bem, com a capacidade que a Colômbia tem na transformação. E a Colômbia tem acesso aos mercados financeiros, o problema não é de fluxo [de capitais], o problema é como conseguir recursos para financiar o seu desenvolvimento. A Colômbia é um país que pode crescer mais e que quer ter um rendimento médio/alto como Portugal ou Espanha. Mas para isso é necessário trabalho articulado entre os dois países. É um caminho que começaram a fazer há quase oito anos empresas como a Jerónimo Martins e o Grupo Ete e agora com o concurso público de energias renováveis.