o continente refém de uma geografia vaga

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Charles De Gaulle, o general que foi Presidente de França, achava que estava a ser ambicioso ao defender nos anos 60 uma Europa dos povos "do Atlântico aos Urales". Era a época em que o continente estava ideologicamente dividido ao meio pela Cortina de Ferro e a CEE ainda se limitava aos seus seis membros fundadores, muito longe dos 27 de hoje em dia.

Mas se a actual União Europeia se estende já da Irlanda a Chipre e da Finlândia a Malta, é quase uma anã quando comparada com o Conselho da Europa, que incluiu a imensa Rússia e tem o seu limite oriental em Vladivostoque, uma cidade quase vizinha da Coreia do Norte. Um Conselho da Europa que inclui ainda, desde a sua fundação em 1949, a Turquia, esse país que ocupa as duas margens do Bósforo e cuja europeidade, porém, tanta polémica tem gerado nos últimos anos. E que dizer da UEFA ou do festival da Eurovisão, que tanto no futebol como na música alargam os limites do continente não só à Turquia, mas também a Israel?

A ocidente e norte, ninguém tem dúvidas sobre os limites, mas afirmam os geógrafos que a Europa a Oriente termina no rio Ural e na cordilheira que toma esse nome de empréstimo. É uma fronteira forçada esta com a Ásia, pois o monte mais alto não iguala sequer a serra da Estrela e de um lado e outro existe estepe russa. E a sul, além do Mediterrâneo, o outro limite europeu são as montanhas do Cáucaso, o que põe do lado de fora a Arménia, uma antiquíssima nação que dificilmente alguém deixará de classificar como europeia.

Se a geografia não permite contornos claros, a cultura ajuda a perceber melhor aquilo que é o continente que deve o seu nome ao mito grego sobre uma princesa fenícia raptada por Zeus, que para tal se transformou num touro.

A Europa de hoje é herdeira da Grécia e de Roma, mas também de Jerusalém, o berço asiático do cristianismo. E as línguas da Europa, apesar de serem na sua esmagadora maioria indo-europeias (como o português, o inglês, o russo, mas também, lá muito longe, o persa, o hindi e o bengali), incluem também alguns idiomas de outras famílias, como o húngaro, o finlandês e o estónio, que são fino-ugricas, o maltês, que é tão semítica como o árabe e o hebraico, e ainda esse misterioso basco, sem parentesco conhecido. Já para não falar das línguas dos imigrantes, que buscam o eldorado.

Certo é que a Europa é muito mais que a União Europeia. Não a formam 27 países, mas sim quase o dobro. Mas defini-la com precisão é um exercício quase impossível. O que não surpreende quando um continente vai buscar o seu nome a uma princesa que vem de outro. Europa, afinal, nasceu na Ásia.

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