O cinemae as suas maldições

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? Terry Gilliam é um criador de excessos. Mesmo naquele que me parece o seu melhor filme, As Aventuras do Barão Münchausen (1988), há um delirante gosto visual que tende a sobrepor-se a tudo o resto, limitando a consistência narrativa do seu trabalho. Já aconteceu essa consistência ser posta em causa por verdadeiras conjunturas "kafkianas", a ponto de Gilliam ter abandonado um projecto de adaptação de Dom Quixote, entre outras razões porque os cenários foram destruídos por uma tempestade, ao mesmo tempo que o protagonista, o francês Jean Rochefort, surgia com problemas de artrose que o impediam de... andar a cavalo (a odisseia está registada no documentário Lost in La Mancha, realizado em 2002 por Keith Fulton e Luis Pepe).

O caso de Parnassus - O Homem Que Queria Enganar o Diabo ultrapassa tudo. De facto, não havia maneira "razoável" de compensar a falta de Heath Ledger. Na sequência da sua morte, a decisão de dar um salto em frente, integrando novos actores (incluindo estrelas como Johnny Depp e Jude Law), talvez só pudesse gerar este resultado: um objecto à deriva, incapaz de lidar com as maldições que sobre ele se abateram. É verdade que Parnassus conserva o tema, essencial no universo de Gilliam, das aparências (uma companhia ambulante de teatro) como porta de entrada na vertigem de sonhos e pesadelos. Mas tratava-se de uma missão impossível: ficou a homenagem à memória de Heath Ledger, mas também a prova real de que a arbitrariedade dos factos não faz necessariamente uma narrativa onírica.

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