Perfil: Gerhard Schroeder .Alemanha. O antigo chanceler social-democrata é hoje um dos grandes executivos do petróleo e do gás russos. Lidera o consórcio que vai construir o gasoduto do mar Báltico e será administrador da 'joint-venture' da BP na Sibéria .Nos sete anos em que dirigiu a Alemanha, conseguiu várias vezes surpreender os seus adversários políticos com recuperações de última hora e regressos inesperados. Depois de derrotado por Angela Merkel, em 2005, Gerhard Schroeder conseguiu espantar ainda mais os observadores, reinventando-se como executivo empresarial ligado aos interesses energéticos russos. O antigo chanceler dirige o consórcio russo-alemão que deverá construir o Nord Stream, o gasoduto da Gazprom que passa através do Báltico e que promete mudar a geopolítica europeia..Esta semana, Schroeder surgiu de novo nas notícias. Ele será um dos administradores de um consórcio criado entre a TNK e a British Petroleum para explorar as vastas reservas de gás natural da Sibéria. A BP teve graves problemas com o Kremlin e foi forçada a juntar-se à TNK, empresa que agrega vários oligarcas russos do sector de energia, incluindo Mikhail Fridman e German Khan..A entrada de Schroeder no negócio deixou muita gente surpreendida, mas o caso foi explicado: o novo administrador do consórcio tem "influência" sobre o primeiro-ministro russo, Vladimir Putin, maneira moderna de dizer que alguém tem o ouvido do czar. .A nova carreira de Schroeder mereceu-lhe muitas críticas na Alemanha, pois a Gazprom está ligada ao Kremlin. O antigo presidente Vladimir Putin, agora primeiro-ministro, colocou na empresa o seu fiel sucessor Dmitri Medvedev, agora Presidente da Rússia. A energia está no coração do novo regime, visto pelos dirigentes (e por muitos russos) como o fim da humilhação do país..Na ligação de Schroeder ao Kremlin existe uma razão histórica. A Alemanha sempre teve um olhar atento na direcção da Rússia, por causa das matérias primas de que necessitava para o seu desenvolvimento. A obsessão foi de tal ordem para alguns dirigentes (Adolf Hitler, por exemplo) que este se transformou num frequente motivo de conflito. Nesta segunda carreira, existe uma ironia que talvez não seja mera coincidência: o ex-chanceler nasceu órfão, filho de um soldado alemão morto na Roménia por tropas soviéticas, durante a Segunda Guerra Mundial..As relações russas de Schroeder são ainda mais extensas. Durante a crise georgiana, no ano passado, foi um dos principais defensores da intervenção militar de Moscovo, numa altura em que se ouviam na Alemanha sobretudo as críticas. Em 2004, o então chanceler adoptara uma criança russa. Berlim apostava em relações fortes com o presidente Putin e o chefe do governo quis dar o exemplo. Que melhor gesto do que criar uma filha?.Sorriso fácil, charme quase irresistível, sobretudo a língua de prata dada à oratória, Gerhard Schroeder foi sempre um político complexo. Nascido em 1944, viveu uma infância difícil, criado pela mãe, viúva de guerra. A ascensão política foi relativamente rápida, para os padrões alemães, até chegar a presidente da Baixa Saxónia, em 1990..A vitória do seu partido (SPD, social-democratas) em 1998 foi quase impossível. Contra todas as expectativas, apostando no centrismo, Schroeder bateu dois rivais internos e, nas eleições gerais, afastou o veterano conservador Helmut Kohl, que estivera no poder 16 anos e parecia invencível..Em 2002, o chanceler parecia batido, mas recuperou nas últimas semanas de campanha. Nos dois anos seguintes, lançou um plano de reformas, a Agenda 2010, que teve grande impacto na recuperação de empregos e da economia. Mas estas mudanças dividiram ainda mais o SPD e, por uma unha negra, Schroeder perdeu para a CDU de Angela Merkel, situação que forçou a criação de uma grande coligação entre os dois maiores partidos..O SPD nunca mais se reencontrou, mas Schroeder terminara a carreira política. Reinventou-se no sector da energia, que a Alemanha sempre viu como o seu calcanhar de Aquiles..Há quem não lhe perdoe. Para os polacos, por exemplo, o Nord Stream é uma ameaça, pois evitará a passagem do gás natural russo pelo seu território. Quando o gasoduto estiver concluído, a Ucrânia terá grandes dificuldades em negociar com a Rússia as eventuais futuras guerras do gás. Como a BP também compreendeu, esta é a brutal lógica da política energética contemporânea e por isso é que são necessárias pessoas como Gerhard Schroeder, cuja língua de prata tem o ouvido do czar.